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Caldeirão da Bolsa

Correcções extremas: uma perspectiva histórica

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

por nnfranco » 16/10/2008 19:53

Olá meus caros, não têm nada que agradecer.

Limitei-me a fazer copy de uma newsletter que recebo, como cliente do Bank 7. Não tenho qualquer mérito na sua elaboração.

Confesso-vos que achei o texto interessante e que merecia ser partilhado.

Todos os dias leio uma teoria nova sobre o que está a acontecer, e a desinformação actual não me parece ser um auxilio para quem, como no meu caso, não possui grande experiencia em investir em bolsa.

Desde visões apocalipticas a visões paradisiacas, penso que há para todos os gostos.

De tudo que li até agora, este texto foi o que me pareceu mais coerente e com melhor enquadramento.

Bons negócios a todos.
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por Sulla » 16/10/2008 11:34

Excelente, nnfranco. Bela compilação de dados.
Obrigado
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Market Crashes - Historical View

por C.N. » 16/10/2008 11:02

Ola nnfranco,

Excelente trabalho! Obrigado por partilhares. Pena que os media nao comuniquem como tu o fazes :P

Os media estao mais interessados em falar da Grande Depressao, sem saberem do que falam, pois o governo Americano na altura deixou passar 3 anos ate tomar as primeiras accoes de suporte ao sistema bancario, quando as falencias de bancos ja eram diarias - havia 30.000 bancos mais ou menos e metade foram a falencia. Isto nao e o que se passa em 2008, bem pelo contrario :roll:

Mais uma vez obrigado, e em jeito de contribuicao, deixo aqui ficar a newsletter da minha companhia.

Abraco

CN
Anexos
Fear Might Have Gone Too Far - 14 October 08.pdf
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Correcções extremas: uma perspectiva histórica

por nnfranco » 15/10/2008 19:09

::: Continuamos a viver tempos históricos nos mercados financeiros internacionais.

Na passada semana, os mercados accionistas registaram a maior desvalorização semanal (cerca de 19%) desde a Grande Depressão dos anos 30. Cerca de 4,6 triliões de euros (valor equivalente a 30 anos de produção económica em Portugal) foram suprimidos da capitalização bolsista mundial.

Um sinal claro de que a correcção foi exacerbada pela venda forçada ou em pânico de muitos investidores, sem grande justificação fundamental, foi o facto das desvalorizações registadas terem sido praticamente idênticas em todas as regiões geográficas e sectores de actividade, mesmo os mais defensivos (como o dos bens de consumo corrente), tendo aliás sido alargadas aos mercados de matérias-primas e de obrigações de empresas. A única preocupação parece ter sido reduzir a exposição aos activos com maior nível de risco.

Já no início desta semana, o sentimento dos investidores inverteu, na sequência das medidas de apoio ao sistema financeiro anunciadas durante o fim-de-semana. Os mercados globais registaram no dia 13 de Outubro a maior valorização diária de sempre, cerca de 10%, ainda que tal evolução tenha permitido recuperar menos de metade das perdas sofridas na semana anterior.

Num contexto marcado por muita ansiedade e alguma irracionalidade, entendemos oportuno revisitar os acontecimentos mais marcantes dos últimos dias, bem como apresentar uma perspectiva histórica de correcções extremas ocorridas no mercado accionista.

Acontecimentos recentes

A crise financeira iniciada no Verão de 2007 ganhou uma expressão dramática a partir do dia 15 de Setembro de 2008, data da falência do banco de investimento Lehman Brothers, a qual despoletou uma reacção em cadeia no sistema financeiro global, com anúncios sucessivos de dificuldades por parte de algumas das principais instituições, à medida que foi desaparecendo a confiança no sistema. A crise chegou ao ponto dos empréstimos entre bancos quase terem bloqueado na passada semana.

Depois de várias intervenções de Governos e de Bancos Centrais recebidas com cepticismo por parte dos investidores (incluindo o mega-plano de compra de activos de alto risco nos EUA e o corte concertado de taxas de juro em 0,50% no dia 8 de Outubro), as medidas divulgadas no passado fim-de-semana, segundo as quais os Governos europeus passam a garantir formalmente os empréstimos interbancários, além de se comprometerem a recapitalizar qualquer banco que represente riscos sistémicos (medida entretanto alargada aos EUA), tiveram finalmente um impacto visível, não só nos mercados accionistas, como principalmente nas taxas do mercado interbancário, que começaram finalmente a normalizar, ainda que de forma gradual. A evolução foi particularmente notória na taxa Euribor a 1 semana, que desceu de 5,02% para 4,10% entre os dias 8 e 15 de Outubro.

A gradual recuperação da confiança no sistema financeiro é o primeiro (e indispensável) passo para que seja possível evitar uma significativa recessão económica a nível mundial.


Fonte: Reuters; Banco de Portugal
Uma perspectiva histórica de correcções extremas

A nossa análise irá debruçar-se em primeiro lugar sobre o mercado norte-americano, para o qual existem registos superiores a 100 anos, e em seguida sobre 36 mercados internacionais, para os quais os dados existentes se concentram principalmente nos últimos 50 anos.

a) EUA

No quadro seguinte estão representadas todas as correcções superiores a 40% do índice Dow Jones Industrial Average, criado em Maio de 1896, e que contém actualmente 30 (inicialmente 12) das maiores e mais amplamente detidas acções norte-americanas.

Desde logo, podemos retirar 2 conclusões:

• Todas as correcções foram inferiores a 50%, com excepção dos 86% registados no início da Grande Depressão dos anos 30;

• A correcção de 42% registada até ao dia 10 de Outubro de 2008 é apenas a segunda no período subsequente à 2ª Guerra Mundial (tendo a primeira sido associada ao Choque Petrolífero de 1973-74).

Data Variação Nº dias Início Fim
17 Jun 1901 9 Nov 1903 -46% 875
19 Jan 1906 15 Nov 1907 -49% 665
19 Nov 1909 24 Dez 1914 -47% 1861
21 Nov 1916 19 Dez 1917 -40% 393
3 Nov 1919 24 Ago 1921 -47% 660
3 Set 1929 13 Nov 1929 -48% 71
17 Abr 1930 8 Jul 1932 -86% 813
10 Mar 1937 31 Mar 1938 -49% 386
9 Nov 1938 28 Abr 1942 -41% 1266
11 Jan 1973 6 Dez 1974 -45% 694
9 Out 2007 10 Out 2008* -42% 367
* Ponto mínimo do actual ciclo, até à data
Fonte: Seeking Alpha

A escassa frequência de correcções significativas no pós-Guerra (em absoluto contraste com o comportamento anterior) é notável e pode eventualmente ser explicada pela estabilidade decorrente:
• da emergência do moderno sistema financeiro internacional em 1944 (com os acordos de Bretton Woods e a criação do Fundo Monetário Internacional e do precursor do Banco Mundial);

• do melhor entendimento e execução de medidas de política económica e monetária (aquela que é considerada a mais marcante obra de economia do Século XX, «Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda», de John M. Keynes, apenas foi publicada em 1936).

Não surpreende que Jean Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu, tenha vindo hoje apelar ao regresso à “disciplina” associada ao acordo de Bretton Woods.

Ainda que as razões subjacentes à significativa correcção de 1973-74 sejam totalmente diferentes da conjuntura actual, é interessante analisar o comportamento do índice S&P 500 nos 12 meses anteriores e subsequentes à data em que foi atingido o valor mínimo (3 de Outubro de 1974).

O paralelismo com o mais recente período de 12 meses é, até ao presente momento, evidente. Então, como agora, o mercado corrigiu mais de 40% no espaço de 1 ano. Então, como agora, registou-se uma rápida recuperação de 10% depois de atingido o mínimo (ao longo de 5 dias em 1974 e em apenas 1 dia em 2008).

Se a história se repetir (e é um importante “se”), o mercado poderá continuar volátil durante algumas semanas, até se iniciar uma recuperação mais sustentada nos meses seguintes (que, no período de 1974-75, chegou a perto de 50%).


Fonte: Yahoo Finance
Caso se interrogue por que razão deixámos de fora o período entre Março de 2000 e Outubro de 2002, a verdade é que as principais desvalorizações foram sofridas por empresas tecnológicas e similares, incluídas no índice Nasdaq, que perdeu 78% neste período. A correcção sofrida pelo índice Dow Jones Industrial Average (mais representativo das principais empresas norte-americanas) foi inferior a 40%.

b) Outros mercados

Se alargarmos a análise a 36 outros mercados internacionais, encontramos registo de correcções anuais ainda mais expressivas. No quadro seguinte estão representadas todas as observações de desvalorizações superiores a 60% no período de apenas 1 ano.
Mercado Desvalorização Período anual Variação ano seguinte

Taiwan -74,9% Out 1989 – Out 1990 +85,1%
Jamaica -73,8% Jan 1993 – Jan 1994 +69,6%
Suécia -63,6% Ago 1976 – Ago 1977 +96,6%
Reino Unido -63,3% Nov 1973 – Nov 1974 +72,7%
Tailândia -62,8% Ago 1997 – Ago 1998 +71,9%
África do Sul -62,1% Jul 1985 – Jul 1986 +48,9%
Filipinas -61,9% Out 1973 – Out 1974 -14,1%
Coreia do Sul -61,9% Jun 1997 – Jun 1998 +167,0%
Média -65,5% +74,7%

Fonte: Robert J. Shiller*

Entre as 8 ocorrências, apenas numa o mercado continuou a cair no ano subsequente. Em média, a recuperação no ano seguinte foi de 74,7%, o que parece indicar que depois de uma correcção extrema se tende a seguir um período de algum “alívio” por parte dos investidores.

Note-se que uma recuperação de 74,7% está longe de anular uma perda de 65,5%. Com efeito, se investirmos 1.000 euros no momento inicial, teremos 345 euros decorrido um ano. Uma recuperação de 74,7% apenas valoriza o nosso investimento para 602,71 euros, o que ainda está cerca de 40% abaixo do valor inicialmente investido.

Uma prova dos momentos históricos que vivemos é que, no dia 10 de Outubro de 2008, os registos de correcções anuais superiores a 60% foram alargados em nada menos do que 5, identificados na tabela seguinte.
Mercado Desvalorização 12 meses
até 10 Outubro 2008

Irlanda -69,1%
Áustria -62,4%
China -60,6%
Rússia -60,5%
Bélgica -60,4%
Fonte: SGAM, MSCI

Já esta semana, após a reabertura do mercado accionista da Islândia, que esteve encerrado durante a maior parte da semana passada, foi batido o recorde de desvalorização anual, com uma quebra de 88% nos últimos 12 meses.
Acções mais baratas desde 1989

O indicador mais utilizado para avaliar a valorização de uma acção (PER: Price Earnings Ratio) compara a sua cotação com os resultados por acção. Se a cotação é inequívoca, já a melhor medida para os resultados pode ser alvo de discussão. O mais habitual é utilizarmos os resultados do último ano ou uma estimativa para os resultados do próximo ano. No entanto, se os resultados forem avaliados num bom momento do ciclo económico (como 2007), podemos correr o risco de que os resultados nos anos subsequentes sejam sistematicamente inferiores.

Neste sentido, o Professor Robert Shiller propõe a utilização dos resultados médios dos últimos 10 anos, ajustados pela inflação (seguindo um argumento de Benjamin Graham originalmente apresentado nos anos 30). Desta forma, são eliminadas, ou pelo menos suavizadas, eventuais distorções cíclicas.

Utilizando este indicador, também designado PER “normalizado”, o índice S&P 500 atingiu no passado dia 10 de Outubro o valor de 15x, o mais baixo desde Janeiro de 1989, e pela primeira vez em quase duas décadas abaixo da média histórica desde 1881 (16.3x).

Quer isto dizer que o mercado “bateu no fundo”? Não necessariamente. No Verão de 1982 o mesmo indicador situava-se em 6.6x, metade do valor actual. Mas outros indicadores dão a entender que a desvalorização do mercado pode ter sido excessiva.

Por exemplo, perto de 10% das empresas cotadas nos EUA têm actualmente um valor de mercado inferior ao valor de depósitos e outros activos líquidos que possuem no balanço. Esta proporção é superior à registada em 1932, em plena Grande Depressão.

Noutros mercados, a situação é análoga: na Europa, o PER actual é o mais baixo desde 1982. No Japão, o valor de mercado das empresas é, em média, igual ao seu valor contabilístico (como se as empresas não tivessem qualquer perspectiva de crescimento futuro).

Em conclusão ...

A actual crise financeira não tem precedentes no sistema económico mundial do pós-Guerra. Neste momento, as principais organizações económicas internacionais continuam a rever em baixa as taxas de crescimento económico para 2008 e 2009, numa altura em que ainda não são conhecidos na totalidade os impactos da actual crise financeira na chamada “economia real”, ou seja, na saúde financeira dos particulares e das empresas. A menor utilização de crédito irá, certamente, condicionar as taxas de crescimento económico nos próximos anos.

A actuação das autoridades internacionais tem sido decidida e parece começar a dar frutos no mercado de crédito interbancário. À medida que vão moderando as pressões inflacionistas, será provável a continuação da descida (concertada ou não) das taxas de juro.

A correcção nos mercados accionistas globais no último ano parece incorporar já estimativas extremamente pessimistas (e sem precedentes históricos) no que diz respeito à evolução dos resultados das empresas no futuro próximo.

Note-se que a recuperação dos mercados accionistas tende a anteceder em 6 a 9 meses a recuperação da economia pelo que, em condições normais, e no pressuposto que a recuperação económica possa ter início durante o 2º semestre de 2009 (como indica o FMI), será expectável que o ponto de inflexão dos mercados esteja próximo, na ausência de novos desenvolvimentos na frente geo-política.

Todas as correcções extremas, independentemente da sua natureza e extensão, acabam da mesma forma: quando o pessimismo está no seu nível máximo e quando os pequenos investidores “abandonam o barco”.

* Robert J. Shiller - «Irrational Exuberance, Second Edition» (2005), Princeton University Press
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