Caldeirão da Bolsa

Uma oportunidade para reformular os mercados de capitais eur

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

por marafado » 24/1/2005 16:20

Reagan

Jorge A. Vasconcellos e Sá


A revolução conservadora em curso nos E.U.A. (presidente, maioria da Câmara dos Representantes, Senado e Governadores) começou há 25 anos com Reagan, (com Clinton os americanos votaram num Presidente centrista mas mantiveram o Congresso e Estados nas mãos dos Republicanos).

De facto, a influência de Reagan prevalece ainda hoje, quer através das ideias, quer do estilo. O actual Presidente Bush, cita como ídolo, mais Reagan que o seu próprio pai.

Esta influência é especialmente notável dado que se baseou em uns poucos e simples, princípios de gestão e características pessoais. Salientemos quatro.

Reagan era um grande apóstolo da descentralização, comportando-se mais como um Presidente do Conselho de Administração do que um CEO.

Escolhia pessoas de qualidade (”quero aquelas que não querem deixar os seus empregos”) e descentralizava. Nunca interferia e não queria saber de pormenores. Se algum erro houve, foi a ausência de controlo, o que permitiu escandâlos como o da venda de armas ao Irão.

Este estilo de gestão era completado com unicidade de objectivos: enfoque em uns poucos objectivos e secundarização de tudo o resto. Primeiro objectivo: “O Governo é parte do problema, não da solução”; logo diminuir impostos; reduzir o número de funcionários públicos (embora mais tarde viesse a aumentar ambos); liberalizar e desregulamentar; combater o poder dos sindicatos (despediu 10 mil controladores de tráfego apesar do seu sindicato ter sido um dos poucos que o apoiou nas eleições).

Em termos de política externa, novamente uma única ideia simples: a URSS era o “império do mal” e o melhor meio de a conter era com 1) rearmamento (guerra das estrelas), 2) intervenção (Afeganistão, Granada, Nicarágua, etc.) e 3) retórica: “Sr. Gorbachev, destrua o muro de Berlim”.

Entre os qualidades pessoais salientavam-se duas. O calor humano fazendo dele o Presidente Teflon (não havia acusação que “pegasse”). Acompanhado pelo seu proverbial humor e boa disposição: no hospital após a tentativa de assassínio disse a uma enfermeira que o acarinhava: “a minha mulher sabe sobre nós?”; para a sua mulher quando chegou: “querida, desculpa, não consegui baixar-me a tempo”. A ideia de um liberal para combater o crime é “dar penas mais longas... suspensas”. Aos estudantes que se manifestavam na rua: “portam-se como Tarzans, parecem a Jane e cheiram como a Cheetah”.

Tinha depois, a capacidade de simplificar o complicado e assim estabelecer um elo de ligação com o eleitorado: “há respostas simples, não são é fáceis”; “ao votarem em mim não abandonam o partido democrático, este é que vos abandonou”. Durante a sua 1ª campanha para Presidente: “estão melhor que há 4 anos?”.

Em síntese, foram estes (entre outros) princípios de gestão (dois) e qualidades pessoais (duas), que explicam que um homem dotado de um intelecto de 2ª, tivesse um temperamento de 1ª e fosse assim o fundador da grande revolução conservadora, actualmente em curso nos E.U.A.
 
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por marafado » 24/1/2005 16:18

Ter “vergonha” de ganhar dinheiro

José Alberto Allen Lima*


Competir é inerente ao ser humano: gostamos de pertencer à equipa vencedora, de ser o mais destacado no meio da multidão, ou simplesmente de pensar que encontrámos a razão acima de todas.


No entanto, há actividades da economia em ausência de concorrência, o que ajuda a encobrir ineficiência, induz limitações na capacidade de tomar iniciativas e cria burocracia desnecessária.

É disso exemplo o Estado-produtor de bens públicos. Encarado como empresa, trata-se de uma espécie de mútua, em que os clientes pagam impostos, com o papel de preço regulado. São simultaneamente proprietários, mas os direitos de propriedade são muito reduzidos, pois correspondem ao simples usufruto e ausência de direito de venda. O lucro ou prejuízo anual traduz-se por uma redução ou aumento de impostos subsequente.

É benéfico instituir concorrência. Ou pela segmentação de papéis (financiador; controller; prestador; serviço) e respectiva autonomização da função de prestação, como se tem vindo a fazer para os monopólios naturais (redes públicas de transporte de energia, etc.) e se procura aprofundar noutras áreas, como é exemplo a da saúde. Ou criando concorrência artificial: compete-se para fazer melhor do que as tarifas fixadas pela regulação ou outro formato contratual; luta-se para reduzir desvios desfavoráveis resultantes do benchmarking com as melhores práticas internacionais e luta-se para não perder uma posição favorável. Como é sabido que o Estado é mau gestor, não há que recear a entrega a privados das prestações que melhor recaem na esfera empresarial, introduzindo concorrência por benchmarking, realizado de forma séria e pública, na parte restante.

Alguns dirão que tudo isto está errado, tal como é típico dos sindicatos que ainda vivem num passado distante, com complexos relativamente ao papel do dinheiro e à vergonha do lucro naquelas prestações. Também algumas elites intelectuais não estarão longe disso, ou por desconhecimento de bases elementares de economia e gestão, ou por meras razões ideológicas. Este complexo transmite-se até às organizações de âmbito social que se declaram sem fins lucrativos, ajudando a confundir o mérito de um diferencial positivo, entre proveitos (que podem ser constituídos por doações caritativas) e custos, com o destino a dar-lhe!
De facto, ganhar dinheiro, de forma limpa e dentro das regras, não passa de um indicador de boa gestão: aumentar o dinheiro que entra, diminuir o dinheiro que sai e o que fica retido na própria actividade. O conceito é simples, não sendo tão fácil torná-lo um sucesso. Portanto, no jogo da concorrência directa ou indirecta, a entidade que diz que não quer ganhar dinheiro equivale à equipa de futebol que entra em jogo e diz que não quer ganhá-lo! Infelizmente há muitas entidades no País que nem querem entrar em jogo. Também acontece ao nível pessoal, convindo estabelecer as diferenças subtis entre os que: definitivamente têm I de ganhar dinheiro, os que têm mas querem, os que acham isso natural e ainda os desavergonhados que procuram ganhá-lo fora das regras de jogo.

A transformação do Serviço Nacional de Saúde tem suscitado grande polémica, a começar nos próprios médicos, elite entre as elites, que vêm na palavra gestão uma ameaça. Mas gestão significa, em primeiro de tudo, inteligência e bom senso. Não há que ter receio de a aplicar e em ter a humildade de ir buscar conhecimentos a outros sectores onde, por força da necessidade de inovar constantemente quer em termos técnicos, quer nos processos de gestão, se atingem níveis notáveis de eficiência. Dirão que não existe qualquer semelhança entre intervenções cirúrgicas num hospital e trabalho em série numa fábrica de automóveis. Mas há, e compete aos médicos descobri-la, com a ajuda provocadora de alguns gestores...

Essas resistências não são novidade e já ocorreram noutros sectores, como se registou há uns quinze anos atrás no início da preparação para a mudança de empresas estatais do ramo das telecomunicações e da electricidade. E não aconteceu nenhum dos malefícios previstos pelos que tinham vergonha de ganhar dinheiro e até os assinantes e consumidores passaram a usufruir da qualificação de clientes. Mas cliente, segundo Peter Drucker, é a pessoa que pode dizer “NÃO” e conseguir esse direito na saúde, e para outros bens públicos, obriga a um salto estrutural e qualitativo tão importante como o ocorrido nas telecomunicações e electricidade.

A riqueza resulta dos efeitos multiplicativos que a invenção produtiva eficiente de bens origina. Dizer que não se quer ganhar o jogo é abdicar da riqueza que o próprio jogo cria. E sem criar riqueza não há dinheiro para distribuir...

*Docente
 
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Uma oportunidade para reformular os mercados de capitais eur

por marafado » 24/1/2005 16:16

Uma oportunidade para reformular os mercados de capitais europeus

Don Cruickshank*


Em Setembro de 2000, um conselheiro da Deutsche Börse confrontou-me com a seguinte pergunta: “Será que estes patetas vociferantes não se apercebem que têm diante de si uma oportunidade única?”.

Os “patetas vociferantes” a que se referia são tão-somente os corretores-accionistas da Bolsa de Valores de Londres (LSE). A “oportunidade” resume-se a obter metade do volume de transacções combinadas, a ter uma sede em Londres, um governo de sociedades britânico e uma clara separação entre as operações de ‘trading’ e as de compensação. Isto seria, assim, o equivalente a cerca de 10 libras diárias por acção. Os accionistas da LSE justificaram as suas reticências com razões de ordem “prussofóbica”. Tratou-se, no fundo, de mais um fiasco protagonizado pelos accionistas da LSE, a somar a tantos outros, designadamente à incapacidade de constituir o seu próprio sistema de compensação pós-negociação (’post-trade’) e de adquirir a Liffe, a bolsa de derivados de Londres, por um valor de minimis em finais dos anos 90. É raro ver-se uma empresa ser assim desprezada pelos seus proprietários, para mais quando o seu êxito constitui o garante económico dos mesmos.

Todavia, até pode tratar-se de um aspecto secundário. Afinal os custos da negociação nos sistemas da LSE acabam por ser um elemento trivial no total de custos da negociação e não têm consequências maiores no negócio dos seus membros. Na verdade, as repercussões mais alargadas do ‘takeover’ da LSE são, essas sim, mais importantes, especialmente saber como esse acordo, essa tal “oportunidade”, poderia reduzir os custos globais das empresas da UE no acesso aos mercados de capitais de acções.

Os custos da negociação pagos às bolsas de valores são relativamente baixos, mais baixos na Europa, aliás, do que nos EUA. No entanto, os custos pós-negociação ao nível das compensações são bastante superiores aos custos de negociação propriamente ditos, sendo três ou quatro vezes mais elevados na Europa do que nos EUA. O excedente arrecadado pelos bancos de investimento aos fragmentados mercados europeus é, igualmente, outro aspecto a resolver. Para as empresas do Reino Unido, o imposto de selo pago por acção, que equivale a 300 vezes mais o montante cobrado nos EUA, é, de todos os custos, o que tem maior peso. Ora, tudo isto somado resulta em desvantagens competitivas para as empresas europeias, nomeadamente para as britânicas, cujo grosso do negócio são bens e serviços transaccionáveis. A luta da LSE é, pois, do interesse de todas as empresas europeias e não apenas dos accionistas e intermediários financeiros da instituição.

Assim, existem excelentes argumentos para bloquear um ‘take over’ sobre a LSE por parte de qualquer outra bolsa europeia, apostando, ao invés, numa concorrência transfronteiriça saudável. Dadas as características da rede de plataformas de negociação, podem verificar-se riscos ao nível do monopólio. A SEC, a entidades reguladora dos mercados de capitais dos EUA, empenhou-se fortemente na promoção da concorrência nas negociações das acções de empresas cotadas no Nasdaq e tenciona fazer o mesmo, em breve, com a bolsa de valores de Nova Iorque.

A melhor abordagem será, porém, aproveitar o entusiasmo dos licitadores e levar o vencedor a procurar soluções para os restantes problemas de ineficiência. A Deutsche Börse deveria, pois, desmantelar o seu “silo” de compensações, enviando assim um sinal claro aos mercados europeus. Se a Euronext, a bolsa sedeada em Paris, for o melhor licitante, então, o seu afastamento das compensações traria benefícios que, depois, poderiam compensar os custos adicionais da análise da entidade reguladora sobre uma futura bolsa central. Em nenhum dos casos bastariam, porém, promessas de bom comportamento, daí que a propriedade tenha de mudar de mãos.

Um ‘take over’ justo e correcto também poderia reduzir os custos internos dos intermediários envolvidos nas negociações pan-europeias. Acima de tudo, iria impedir que os bancos líder tirassem mais partido da fragmentação dos mercados, da fraca liquidez, de melhores ‘spreads’ e de um menor fluxo de informação - ou seja, presas fáceis à mercê das suas mesas de negociações.

Para as empresas do Reino Unido, o ‘take over’ da LSE iria, a curto prazo, pôr um ponto final no infame imposto de selo sobre o capital de risco. Por ocasião do fiasco da fusão entre a LSE e a Deutsche Börse, em 2000, muito se conjecturou sobre as tácticas a adoptar para abolir o dito imposto e orquestrar a forma como as medidas orientadas para o mercado poderiam esbater as práticas administrativas, bem como a autoridade legal do imposto de selo.

Para as empresas europeias, e britânicas em particular, seriam importantes conquistas. Cabe, pois, ao conselho da LSE acolher todas as propostas de ‘take over’. Mais, deve primar, antes de mais, pela defesa dos interesses das empresas e escolher o licitador mais empenhado em reduzir os custos totais para todos os grupos europeus. A LSE não parece, contudo, estar apta a fazer tal escolha, na medida em que haverá uma oferta mais avultada sobre a mesa. E é precisamente aqui que as entidades reguladoras europeias devem entrar em cena. O Office of Fair Trading faria bem, por exemplo, em reportar este caso a Bruxelas.

Chegámos a um momento fulcral na criação da estrutura mais acertada para o mercado europeu de capitais de acções, uma ambição que consta da agenda de todos os interessados num melhor desempenho da União Europeia.

* Presidente da LSE entre 2000 e 2003.

Exclusivo DE/Financial Times
Tradução de Ana Pina
 
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