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Caldeirão da Bolsa

Impacto da Liberalização da Venda de MNSRM - 5 anos volvidos

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

por Elias » 5/11/2010 23:30

urukai Escreveu:Ou seja, em 2010 os preços serão superiores a 2005 em, pelo menos, 5%. É uma assumpção minha mas que penso que seja válida!


Tens números de alguma espécie, alguma amostra por pequena que seja, que sustente essa tua percepção?
 
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por urukai » 5/11/2010 23:29

Eu expliquei isso... :mrgreen:

Esse indice é referente aos preços nos estabelecimentos que não são farmácias.

Em 2007 os preços nas farmácias eram superiores em 2.5%.

Ou seja, em 2010 os preços serão superiores a 2005 em, pelo menos, 5%. É uma assumpção minha mas que penso que seja válida!
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por Elias » 5/11/2010 23:26

urukai Escreveu:É que a minha sensibilidade indica-me que em média os MNSRM estarão pelo menos 5% mais caros, se compararmos 2005 com 2010.


Então e o índice nos 102,28 significa o quê? :-s
 
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por urukai » 5/11/2010 23:20

Desculpa Elias mas qual é a taxa de inflação acumulada entre 2005 e 2010?

É que a minha sensibilidade indica-me que em média os MNSRM estarão pelo menos 5% mais caros, se compararmos 2005 com 2010.

Para além de que, terei de confirmar, mas penso que no anterior regime de preço fixo a inflação também não afectava o preço dos MNSRM, pelo que a mesma poderá ser excluída da equação e os preços comparados directamente.

Ainda tenho mais um trunfo na manga mas vou guardá-lo para os argumentos do Mais_um e do Automech que penso que irão neste sentido que estou a antecipar! 8-)
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por Elias » 5/11/2010 23:15

Obrigado urukai, era o que eu calculava.

Sendo assim, se a inflação não é considerada, os medicamentos embarateceram :)
 
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por urukai » 5/11/2010 23:14

Elias Escreveu:urukai, antes de mais obrigado por esta excelente compilação de informação.

Este tema suscita-me várias questões mas quero ler isto com mais atenção antes de as colocar. Para já levanto apenas um ponto: segundo me é dado perceber, o índice não leva em conta a taxa de inflação, que foi em geral superior ao aumento do índice (excepto em 2009). Isto significaria que em termos reais o preço dos medicamentos (medido pelo índice) terá descido. Esta conclusão é correcta?


O índice é este:

Imagem

Ou seja, penso que a taxa de inflação não esteja considerada. É uma comparação directa com o preço que era fixo antes da liberalização.

@ Mais_um

Serias um dos users que eu saberia à partida que viria aqui debater esta questão. Terei todo o gosto em rebater ou concordar com os teus argumentos.
Editado pela última vez por urukai em 5/11/2010 23:16, num total de 1 vez.
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Re: Impacto da Liberalização da Venda de MNSRM - 5 anos volv

por mais_um » 5/11/2010 22:45

Boas!

Antes de mais quero felicitar-te e agradecer pelo trabalho que tiveste a compilar a informação e a forma simples como a colocaste, de forma a ser entendida por quem a lê. Sei por experiencia propria que este tipo de investigação consome imenso tempo.

Não concordo com todas conclusões a que chegaste, mas para já não tenho tempo para argumentar, assim que tiver tempo voltarei.

Cumprimentos,

Alexandre Santos
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por Elias » 5/11/2010 22:16

urukai, antes de mais obrigado por esta excelente compilação de informação.

Este tema suscita-me várias questões mas quero ler isto com mais atenção antes de as colocar. Para já levanto apenas um ponto: segundo me é dado perceber, o índice não leva em conta a taxa de inflação, que foi em geral superior ao aumento do índice (excepto em 2009). Isto significaria que em termos reais o preço dos medicamentos (medido pelo índice) terá descido. Esta conclusão é correcta?
 
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Impacto da Liberalização da Venda de MNSRM - 5 anos volvidos

por urukai » 5/11/2010 21:54

Na sequência de uma discussão com o Automech escrevo este post com o objectivo de analisar o impacto da liberalização da Venda de Medicamentos Não Sujeitos a Receita Médica (MNSRM) em Agosto de 2005 que foi anunciada com pompa e circunstância pelo Primeiro-Ministro, José Sócrates, no discurso de tomada de posse do seu primeiro mandato. Apresento de seguida os dados que suportam a minha opinião.

Como pressupostos, há que saber que o diploma (autoria do ministro da Saúde da altura, Correia de Campos) levou à abertura de estabelecimentos para venda livre de MNSRM e também à eliminação do preço fixo a que estavam sujeitos estes medicamentos passando a haver uma livre concorrência de preços. Relembrando as palavras de Sócrates no célebre discurso:
É tempo de resolver os estrangulamentos que impedem que o interesse geral se imponha aos interesses particulares e corporativos que não servem a maioria dos portugueses. Não recuaremos perante esses obstáculos que tolhem os direitos dos cidadãos, que lesam os consumidores e que, numa palavra, prejudicam o País e o bem comum. (...) não há nenhuma boa razão que impeça que os medicamentos de venda livre, não sujeitos a receita médica, possam ser adquiridos em qualquer estabelecimento, mesmo que não uma farmácia, desde que reuna as condições técnicas exigíveis de qualidade e segurança, nomeadamente o controlo técnico por um farmacêutico. Nada justifica que esta situação se mantenha, a não ser uma legislação obsoleta. Pois bem, isto deve e vai ser alterado. Os termos desta alteração serão, como é natural, discutidos com todos os interessados, mas a nova legislação basear-se-á num critério claro e preciso: o interesse do cidadão e do consumidor na acessibilidade aos medicamentos. Para este Governo, a defesa da concorrência e a defesa do consumidor são para levar a sério.


Ou seja, o objectivo do governo era beneficiar o consumidor e refrear o interesse corporativista. O Correia de Campos desmultiplica-se depois em entrevistas a assegurar que o objectivo era a diminuição do preço dos medicamentos e, quando confrontado com o que acontecera aos combustíveis (que aumentaram depois da liberalização), defendeu-se dizendo que isso eram cartéis a actuar.
Do ponto de vista económico era uma medida populista e de pouco relevo para as necessidades do país mas a ideia subjacente parecia ter algum fundamento se bem que com um risco associado. Liberaliza-se o mercado e a lei da concorrência (acarinhada pela mão invisível) fará com que os preços desçam, desde que não se estabeleçam monopólios ou acções concertadas entre os principais players. Para além disso do ponto de vista de acessibilidade aos medicamentos faria sentido uma pequena lista de MNSRM devidamente analisada do ponto de vista de saúde pública (que não foi o que aconteceu).

A medida foi então implementada em Agosto de 2005 e ao contrário do que seria de esperar para uma medida tão popular e de extrema importância, não foi feita uma monitorização da mesma após a implementação. Os primeiros dados que surgiram para esta medida que tanto orgulhava o governo são de Novembro de 2005. Ou seja, não existem (ou não foram publicados) dados referentes aos primeiros dois meses e mesmo os restantes dados de 2005 só foram publicados em 2006 e nunca de uma forma completa. Por pressões externas (Observatório Português de Sistemas de Saúde) o Infarmed começou a publicar mensalmente um relatório sobre a evolução do mercado dos MNSRM apenas fora das farmácias, ou seja, não temos uma visão verdadeira da evolução do mercado na sua totalidade.
Analisando o relatório de Julho de 2010, vemos a seguinte evolução:

Imagem

Ou seja, como podem ver em 2005, com a entrada das grandes superficies e parafarmácias o índice de preços dos MNSRM desceu 9% (fora das farmácias) contudo em 2006 quase voltou para os valores antes de Agosto de 2005 e, a partir de 2008, os MNSRM ficaram mais caros quando vendidos em estabelecimentos que não farmácias. Em 2010 estão cerca de 2% mais caros que em 2005 e o próprio Continente (que chegou a vender 5% mais barato que o índice base) já vende a um índice de 99. A tudo isto acresce o facto de não termos os dados dos mesmos medicamentos dentro das farmácias que, não tendo as capacidades de aprovisionamento e economia de escala dos grandes grupos (apesar de agora já irem tendo) têm preços superiores como indica um estudo da DECO de 2007 (também mencionado pelo Automech):

Ao contrário do que pretendia o Governo aquando da liberalização dos preços, estes não desceram de forma generalizada. Dos 20 medicamentos analisados pela associação de consumidores, apenas 9 baixaram o preço médio, segundo a edição de Agosto da TESTE SAÚDE.

A maior redução, cerca de 8%, coube ao Ilvico N. Já os aumentos foram menos tímidos, com vários produtos a ultrapassar os 20 por cento. O Antigripine (42%), Aspirina (27%), Thrombocid (25%) e Bisolvon (21%) protagonizaram as subidas mais acentuadas.

Por estabelecimento, as farmácias registaram a maior subida, tendo apresentado preços médios 6,3% mais elevados do que os últimos valores fixados pelo Estado.

Fora das farmácias, o crescimento ficou-se por cerca de 1%, em média. Tal deveu-se, sobretudo, aos valores apresentados pelas cadeias Vale e Dantas (Pingo Doce), Jumbo e Modelo/Continente, 4 e 5% inferiores aos cobrados antes da liberalização. Excluídas estas, o aumento global dos medicamentos fora das farmácias ronda, em média, os 4 por cento.

O domínio das três cadeias nas vendas fora das farmácias e na descida de preço, segundo a TESTE SAÚDE, fragiliza a concorrência. “Se, depois de consolidarem a sua posição no mercado, estes estabelecimentos aumentarem as margens de lucro, desaparecem os poucos benefícios da liberalização”, alerta aquela revista.

As farmácias ainda comercializam 95% dos fármacos não sujeitos a receita médica. A tradição e o prestígio que gozam junto dos consumidores contribuem para este domínio. Mas não só: a maioria das “não farmácias” autorizadas a vender medicamentos está em zonas urbanas.


As farmácias praticavam preços mais elevados que os outros estabelecimentos (talvez socorrendo-se da ideia de um serviço de maior qualidade) e o preço global dos 20 MNSRM mais vendidos estava em 2007, 2.5% mais caro que antes da liberalização.

Na minha opinião, o que aconteceu foi que imediatamente a seguir à liberalização os grandes players entraram no mercado com preços mais baixos (para garantirem quota de mercado) e desde então têm vindo a aumentar os preços. Salienta-se também que a partir de certa altura o Infarmed começou a colocar as estatísticas referentes apenas aos estabelecimentos com preços mais baixos mas existem relatórios de 2008 e 2009 que demonstrava que os preços, em certos locais (ex: Corte Inglês ou Cadeia Cota Pharm), eram 16% a 30% mais caros que antes da liberalização. As farmácias, essas, não estando sujeitas a um preço fixo aumentaram os preços pois tinham algumas factores que mantinham a preferência dos utentes (confiança, atendimento mais qualificado e experiente, e o facto de utente que comprassem MSR aproveitariam para comprar MNSRM). Isto está comprovado pela reduzida quota de mercado que perderam em 5 anos, que foi de apenas 12%. A pergunta é então, em 2010 qual o verdadeiro indice de preços dos MNSRM vendidos fora e nas farmácias. Pelos dados, aponto para um valor acima de 5% mas serão especulações e hipóteses da minha parte pois o infarmed ou o governo nunca apresentaram estes números.

Visto que está que esta medida não teve o efeito desejado em termos económicos (apesar de não poder ser considerada um total fracasso) resta-nos analisar efeitos mais indirectos e complexos e que nunca, repito, nunca foram avaliados pelo governo ou pelos orgãos conselheiros (como a autoridade da concorrência que lhes fez as contas ou o Infarmed). A liberalização fez disparar o consumo de MNSRM.

Imagem

Entre 2007 e 2009 o mercado total de medicamentos cresceu em 4 milhões de embalagems cuja responsabilidade quase total é do aumento do número de MNSRM vendidos fora das farmácias. É pena não termos dados anteriores a 2007 para podermos comparar.
Efectivamente estamos a falar de medicamentos que não podem ser encarados como outros bens (ex: alimentos, combustíveis ou electrodomésticos.). A facilidade de acesso derivada da liberalização poderá ter os seguintes efeitos:
- Uso excessivo intencional (suicido por exemplo);
- Uso excessivo derivado da falta de informação;
- Uso excessivo pela maior oferta e pressão vendedora;
Por sua vez o uso excessivo leva a:
- Maior possibilidade de interacções medicamentosas
- Envenenamento
- Sobredosagem
Que por sua vez levam a problemas de saúde que irão sobrecarregar o sistema nacional de saúde. (ex: internamentos, lavagens gástricas, outros medicamentos, estes comparticipados, etc...)
Infelizmente, estas temáticas não se discutem/estudam como deviam em Portugal mas os USA e o UK têm muitos estudos que se incidem sobre 2 OTC (over-the-counter) ou MNSRM extraordinariamente relevantes nestas questões: O paracetamol e a aspirina.

No caso do paracetamol, um estudo de 2002 (Paracetamol toxicity: Epidemiology, prevention and costs to the health-care system realizado por investigadores ingleses) diz o seguinte:

Paracetamol use in the UK and France was compared between 1974 and 1990 to assess whether restrictions were justified in the availability of the drug. At the time, paracetamol was freely available in England and Wales in unlimited quantities from a pharmacy, and up to 12 g from supermarkets. In France, paracetamol could only be purchased from pharmacies and the contents of each pack was legally limited to 8 g. There was a strong correlation in the UK and France between paracetamol sales and paracetamol overdose. Case fatality rates, however, were four times higher in England and Wales than in France.
They concluded that the greater availability of paracetamol was paralleled by increases in its use with non-fatal and fatal overdose, and suggested that pack size restrictions should be stricter in the UK. In September 1998, the Medicines Control Agency restricted the sale of OTC paracetamol in the UK. Pharmacies can sell packs containing a maximum of 32 tablets (16 g) although up to 100 tablets may be sold at the discretion of the pharmacist. In outlets other than pharmacies, packs with up to 16 tablets (8 g) can be sold.


Ou seja, em 1998, 7 anos antes de Portugal implementar a liberalização, os ingleses já tinham percebido que a sua liberalização não podia ser tão liberalizada.
Quanto aos custos para o Sistema Nacional de Saúde, neste mesmo artigo é indicado que:

In the US, the direct cost of paracetamol overdose has been estimated at $87 million annually, and this is likely to be a conservative estimate. In 1995, it was calculated that the average cost associated with intentional paracetamol poisoning involving adolescents and adults in the US was $2172 per case.

Ou seja, passando rudemente para o caso português temos que anualmente seriam gastos 2,7 milhões com intoxicação por paracetamol. Este valor parece-me exagerado mas o problema essencial é que não há dados e ninguém se preocupou em obtê-los. Se o Governo gasta tanto em Institutos e na saúde temos vários, porque não fez a devida monitorização desta medida e o impacto que teve no país? Que pedisse ajuda a outros parceiros do sector, ordens profissionais, associações, tecido empresarial. Voluntários não faltariam.

O único dado de que disponho é a notificação de reacções adversas a medicamentos (RAM) do sistema de Farmacovigilância que por acaso no site do Infarmed só vai até 2005, de qq maneira arranjei os dados até 2007 que são estes:

Imagem

Ou seja, a questão é que percentagem deste aumento de reacções adversas a medicamentos se devem a MNSRM? Poderá o aumento do consumo ter potenciado estas RAM?
Enfim são questões que ficam sem resposta por incapacidade/desinteresse político de obter essas mesmas respostas.

Conclusão:

Pessoalmente, não era totalmente averso à liberalização dos MNSRM (até porque era algo que se praticava em alguns países há mt tempo) mas td devia ter sido devidamente planeado e monitorizado para que alterações fossem implementadas (por exemplo alterações das listas de MNSRM) ou maiores restrições à abertura (ex: mais pessoal qualificadao))
O que aconteceu foi um aproveitamento político do governo de Sócrates que usou a ideia instalada de que as farmácias são um grande monopólio e na prática dispersou esse monopólio por mais uma mão cheia de empresas. Para além disso, há o risco de o processo ter resultado em encargos adicionais ao SNS que nunca foram nem serão contabilizados.

Vantagens? Sim, aumentou-se a comodidade na aquisição, criaram-se oportunidade de investimento para não farmacêuticos (apesar de mtas pequenos estabelecimentos terem fechado por não conseguirem competir com as grandes superficies) e aumentou-se a acessibilidade a uma grande maioria de medicamentos relativamente inócuos mas, pergunto, é esta uma MEDIDA BANDEIRA que é apresentada como o mote de todo um mandato político para governar Portugal????


ps- desculpem a extensão e alguns erros que o texto possa conter mas fiz isto um bocado à pressa! :D

Referências:
Site do Infarmed
Site da DECO
O artigo cientifico posso enviar por pm.
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