Boa tarde a todos.
Resolvi abrir este tópico, talvez um pouco off-topic em relação ao fórum mas que considero informação relevante e que nunca é demais partilhar.
Em 2018 o governo veio, através do Decreto-Lei n.º 123/2018, definir o modelo de governação para a implementação da faturação eletrónica nos contratos públicos. Entretanto este veio a ser alterado, nomeadamente nos prazos, pelo Decreto-Lei n.º 14-A/2020.
No fundo esta legislação resulta de legislação europeia no sentido de adoptar a troca de facturas entre empresas e estado num formato standard (EDI) com algumas especificidades de país para pais mas baseados num formato já existente (UBL 2.1). Não vou perder tempo com especificações técnicas mas apenas dizer que isto representa um ficheiro em formato XML que contém basicamente a informação que uma factura impressa em papel tem mas em formato electrónico standard e que pode ser interpretado automaticamente por qualquer software (não é a mesma coisa que um PDF).
Com o objectivo de implementar toda esta "marmelada" ficou definido o seguinte:
1 - A Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I. P. (ESPAP, I. P.), é a entidade que coordena a implementação da faturação eletrónica para as entidades referidas nos n.os 1 e 2 e na parte final do n.º 4 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, na redação conferida pelo presente decreto-lei, competindo-lhe a emissão de requisitos técnicos e funcionais que suportam a referida implementação, em concretização do regime definido na portaria a que se refere o n.º 5 do artigo 299.º-B do Código dos Contratos Públicos, assim como desenvolver instrumentos de suporte à gestão da mudança para apoio às mencionadas entidades na implementação da faturação eletrónica.
2 - A ESPAP, I. P., fornece a solução para a receção e o processamento de faturas eletrónicas pelas entidades referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, na redação conferida pelo presente decreto-lei, atendendo às necessidades e especificidades de cada setor, caso existam, e garantindo o relacionamento e colaboração eletrónica com os cocontratantes, nas seguintes condições de adesão:
a) Integram o âmbito de entidades vinculadas à utilização obrigatória do sistema de faturação eletrónica fornecido pela ESPAP, I. P., os serviços da Administração direta do Estado e os institutos públicos;
Até aqui tudo bem. Agora vem o pior.
Este serviço implementado pela espap não é para todos. Ou seja, tirando "os serviços da Administração direta do Estado e os institutos públicos" todas as restantes entidades, tipo autarquias e outras, terão que contratar os serviços de entidades, designadas por "Brokers" que disponibilizarão o serviço mediante um determinado valor (porque ninguém trabalha de "borla").
Neste momento em Portugal já existe uma dúzia de brokers (crescem como os cogumelos), cada um com as suas especificações técnicas, e que já foram contratadas por várias autarquias (cada uma contrata quem quer e como quer) por valores que aparentemente rondam uns largos milhares de euros por ano.
Ora, estes brokers cobram pelo serviço ás entidades que vão receber os documentos e cobram ainda ás empresas que são obrigadas a enviar os documentos para essas entidades (recebem dos dois lados). O valor para as empresas é definido por "pacotes" de documentos (20,50,100,etc). Para dar um exemplo, um dos brokers cobra 19€ por mês para receber até 10 facturas por mês. O que dá um valor "simpático" de 1,9€ por Factura. Já começam a perceber porque surgiram tantos brokers (e ainda vão surgir mais).
Até aqui nada de anormal(?). "Bussiness as usual".
Agora, estes brokers não "conversam" entre si. Ou seja, eu tenho uma empresa e contrato os serviços de um destes brokers para enviar facturas aos meus clientes. Qualquer broker? Não! Tem que ser o broker que o meu cliente, a quem eu emito a factura, contratou para receber essas facturas. Já estão a ver onde isto vai dar? Não? Eu explico. Se os meus clientes resolverem contratar cada um, um broker diferente, a minha empresa também vai ter comprar "pacotes" a cada um desses brokers para poder comunicar as facturas aos clientes. Porque eles não trocam informação (documentos) entre eles! Fantásticos, não?
Mas para que o software possa comunicar com estes brokers as empresas têm que adquirir á empresa que desenvolve o software de facturação uma actualização ou um módulo de comunicação que permita enviar as facturas aos brokers. Mas não há um módulo, tem que haver vários módulos (ou um integrado) que comunique com TODOS os brokers "na praça". Porque os brokers não comunicam entre eles e cada broker tem uma interface de comunicação diferente!
E as empresas de software, que também vão ganhar o deles como é normal, também não têm o serviço facilitado porque vão ter que desenvolver vários módulos de comunicação de acordo com os vários brokers existentes. Porque cada um tem a sua interface!
No meio disto tudo eu já não sei o que é mais grave. Se o facto de o estado obrigar as empresas publicas, autarquias e outras, a gastar fortunas do erário publico quando tem uma solução desenvolvida pela espap que poderia ser usada por todos (entidades publicas) e dessa forma poupar uma "pipa de massa" ao erário publico, ou obrigar as empresas a gastar também elas uma "pipa de massa" que ainda será maior por causa da confusão de brokers que se irão estabelecer.
Sei que isto mostra, mais uma vez, a (des)organização e o desperdício de dinheiro publico que reina em Portugal. Além da confusão total provocada por esta desorganização.
PS: Tentar comunicar com a espap para obter informações é algo digno de um filme de terror.