Re: Obrigações Montepio 2011/2015

[/quote][/quote]Reislb Escreveu:A verdade é que uma amiga minha (que trabalha na área de regulação financeira) uma vez me disse algo que me deixou a pensar. "Quando vais à farmácia pedir algo para a dor de cabeça sabes o que te estão a dar? Mas mesmo assim esperas que te dêem algo para os sintomas apresentados."
Não resisto a comentar esta analogia da regulação/supervisão financeira. Porque a considero errada e ilustrativa do que está mal não só na regulação/supervisão, como também nos investidores e prestadores de serviços financeiros.
1º - O paracetamol para a dor de cabeça na farmácia seria equivalente aos depósitos a prazo nos bancos. E esses toda a gente conhece. Mas as farmácias não vendem só paracetamol. Como os bancos não "vendem" só depósitos.
2º - Se em vez de paracetamol precisarmos de antibiótico que resposta nos dará o farmacêutico? Nem mais, que precisamos da opinião de "um especialista". Chama-se "receita médica". E, na analogia anterior, os gestores de conta dos bancos são "farmacêuticos" ou "médicos"? (Não pretendo menosprezar qualquer profissão, apenas ilustrar a importância de cada função e da formação inerente à mesma). Eu temo que muitos deles não tenha capacidade para passar "receitas financeiras". Não que sejam incompetentes. Antes pelo contrário. A maioria deles são muito competentes, mas só tiveram formação para "farmacêuticos" e não para "médicos". O exemplo descrito pelo zezeze ilustra claramente este ponto. Talvez nos últimos anos os bancos tenham pedido aos seus colaboradores para serem "médicos" à pressão, sem lhes dar a formação necessária. Ou alguns colaboradores decidiram que não valia a pena o esforço adicional.
3º -Se não é preciso saber "o que nos estão a dar", então porque razão insistem os reguladores/supervisores para que os bancos produzam verdadeiras pilhas de documentos sobre cada produto financeiro? E para que insistem que esses documentos sejam disponibilizados aos investidores? E exigem que os investidores os leiam antes de investir? E que confirmem que os entenderam? Por isso a analogia é tão errada, mais ainda vinda de um regulador. Sim, o investidor precisa de entender o que lhe estão a dar. E se não tem formação, tempo ou disposição para se informar, resta-lhe ficar com as alternativas que entende.
4º - Se vamos à farmácia pedir algo para a "dor de cabeça" e nos entregam uma embalagem que diz "anti-inflamatório", vamos tomar sem questionar? Ou vamos perguntar ao farmacêutico se tem a certeza que é o medicamento certo? E na banca? Se pedimos um "depósito a prazo" e não dão um prospecto de 200 páginas de uma "obrigação do banco" que paga juros anuais como se fosse um depósito e nos garantem que é a mesma coisa, que é tudo garantido pelo banco, o que fazemos? Deveríamos perguntar ao gestor se é mesmo o "medicamento" que nós pedimos.
5º - A atitude paternalista que a analogia demonstra - uma confiança cega nos "farmacêuticos" e "bancários" - pode criar o incentivo à des-responsabilização dos clientes. E depois lá virão as frases: "fui enganado! Pensei que era depósito!". Numa decisão de investimento com intervenção do banco tem que existir co-responsabilização do investidor e do banco. E não só do banco.
6º - A literária financeira é um problema. E não só em Portugal. Mas eu fico espantado não seja relevante ensinar nada sobre o sector bancário, como funciona um banco, empréstimos, depósitos, taxas de juro, obrigações, ações, etc... Afinal, o comum dos mortais, mais tarde ou mais cedo vai ter que lidar com uma conta bancária. Com empréstimos ou investimentos. Mas parece que pedir que se formem pessoas para algo que vão utilizar durante a vida futura. A analogia com a farmácia parece indiciar que este aumento da literária financeira é desnecessária. Afinal, parecem pensar os os reguladores, temos os "farmacêuticos" e os "médicos". Mas quem melhor conhece os sintomas? É o "médico" ou o "paciente"?