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MensagemEnviado: 3/1/2012 17:59
por pesconde
Boas tardes
deixo aqui também o meu contributo.
Cumprimentos

A estupidificação da Humanidade

Por José António Saraiva

in Jornal "Sol"


Um destes dias entrei no carro e, maquinalmente, estendi o braço na direcção do rádio para o ligar.
É um gesto que milhares de portugueses fazem diariamente ao início da manhã e ao fim da tarde.

Mas a meio caminho suspendi o movimento. Apetecia-me ouvir o quê: música ou notícias? Subitamente percebi que aquilo que me apetecia mesmo era não ouvir nada. Apetecia-me gozar o silêncio.

E aquele gesto que suspendi, aquele simples gesto de premir um botão, separa dois modos de estar completamente diferentes, para não dizer opostos.

O indivíduo que liga o rádio do carro torna-se, a partir desse momento, um ouvinte – um 'consumidor' de música ou notícias.

Inversamente, o indivíduo que conserva o rádio desligado pode ser um 'produtor', porque o silêncio permite-lhe pensar.

Para bem das estações radiofónicas, a decisão de manter o aparelho de rádio desligado é cada vez menos frequente.

Os indivíduos são cada vez menos produtores e cada vez mais consumidores.

Já quase não sabem fazer mais nada senão consumir.

E não me refiro apenas – note-se – às compras (...)

refiro-me ao consumo 'em geral'.

As pessoas sentam-se ao volante e imediatamente começam a consumir rádio.

Chegam a casa, sentam-se no sofá e começam a consumir televisão.

Depois sentam-se à mesa, naturalmente a consumir… comida.

Depois do jantar ou vêem televisão, ou falam ao telefone ou ao telemóvel, ou põem-se diante do computador a consumir na internet textos ou imagens.

E na manhã seguinte voltam a ligar o rádio.

E a caminho do emprego, depois de estacionarem o carro, põem os auriculares nos ouvidos e ouvem mais música, e no emprego ligam o computador – onde passam uma boa parte do tempo a consumir mais imagens, mensagens, e-mails, informação…

E nos intervalos lêem os SMS que receberam.

Há duas gerações atrás as crianças fabricavam muitos dos seus brinquedos.

Organizavam equipas de botão e de caricas, construíam carros de esferas e trotinetas, improvisavam bolas.

Faziam álbuns para guardar os selos.

Compravam construções de cartolina ou plástico para montar, algumas altamente complexas: palácios, fortalezas, aviões, navios, com centenas de peças que se tinham de recortar e colar com Cola Cisne (no caso da cartolina) ou com cola tudo (no caso das construções de plástico).

E havia outros brinquedos como o Lego, constituído por peças de encaixar (como se fossem tijolos) com as quais se fazia todo o tipo de construções ao sabor da imaginação.

Estas crianças que construíam os seus próprios brinquedos ainda estavam próximas do homo faber, do homem fabricante dos utensílios necessários para sobreviver.

Mas em duas gerações tudo mudou.

As crianças deixaram progressivamente de construir brinquedos e tornaram-se furiosas consumidoras.

Não constroem nada, mas têm os quartos cheios de brinquedos comprados nas lojas.

E nos tempos livres consomem televisão e DVD ou jogam no computador, enquanto comem bolachas, pipocas ou batatas fritas e bebem Coca-Cola.

O problema agrava-se pelo facto de, a esse vazio produtivo, se somar uma demissão de pensar.

Na sua fúria consumidora, os homens desabituaram-se de pensar. Perderam a disponibilidade para pensar.

Não têm tempo para pensar. Têm medo de pensar. Têm preguiça de pensar.

Quando arranjam um bocadinho livre sentem-se mal, agarram-se ao telemóvel a marcar números, a falar, a receber mensagens.


A expressão "opinion makers" é um produto desta sociedade onde as pessoas só consomem e não pensam.

Até porque, se lhes sucede – num momento raro – pensarem um bocadinho e chegarem a uma conclusão diferente da que é partilhada pela maioria, assustam-se e acham que se enganaram.

Sentem-se, pois, mais seguras a consumir as opiniões alheias, as opiniões das pessoas pagas para pensar. As tais opiniões dos opinion makers ou opinion leaders.



(...) Dizer-se que as pessoas hoje têm mais informação é uma ilusão: consomem, de facto, mais informação, funcionam como esponjas, mas depois não usam essa informação porque não produzem quase nada.

(...) Máquinas cada vez mais velozes e sofisticadas multiplicam por milhões produtos pensados por uma pequeníssima minoria de criadores.

E essa legião de consumidores assemelha-se progressivamente a uma legião de escravos – escravos de todos os tipos de consumo, inclusivamente das opiniões de outros.

Durante séculos a Humanidade evoluiu porque os seres humanos eram obrigados a produzir e a pensar.

Hoje vive-se a situação contrária: como os homens estão a desabituar-se de pensar, a Humanidade encontra-se num processo de estupidificação.

MensagemEnviado: 3/1/2012 17:08
por amsfsma
"Ninguém é mais escravo do que aquele que se julga livre sem o ser."

Goethe

Se no passado as pessoas eram submetidas pelo hard power, e tinham consciência da sua situação, atualmente a tecnologia permite a utilização do soft power mantendo as pessoas na ignorância da sua situação e consequentemente incapazes de oferecer resistência! No passado os meios de subjugação eram militares e religiosos, no presente são económicos e tecnológicos!

MensagemEnviado: 3/1/2012 16:11
por morinni
Estas "estratégias e técnicas para a manipulação da opinião pública e da sociedade", de uma maneira ou de outra, sempre existiram desde os primórdios da humanidade e é tudo uma questão de controlo e luta pelo poder.
É claro que cada vez mais são sofisticadas, mas a essência do fim é sempre a mesma e poderá resumir-se ao ditado de que "em terra de cegos quem tem um olho é Rei!"

MensagemEnviado: 3/1/2012 15:47
por EuroVerde
Gostaria de saber a opinião de todos os membros do forum sobre este artigo. Mas creio que poucos conseguem manifestar a sua opinião a um artigo estrangeiro deste calibre.

MensagemEnviado: 2/1/2012 21:18
por BearManBull
Este tópico faz-me pensar em duas coisas Sócrates e Coca-Cola :lol:

OT - Estratégias de manipulação

MensagemEnviado: 2/1/2012 18:36
por pisão
Estratégias e técnicas para a manipulação da opinião pública e da sociedade

por Sylvain Timsit

1- A estratégia da diversão

Elemento primordial do controle social, a estratégia da diversão consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e da mutações decididas pelas elites políticas e económicas, graças a um dilúvio contínuo de distracções e informações insignificantes.

A estratégia da diversão é igualmente indispensável para impedir o público de se interessar pelos conhecimentos essenciais, nos domínios da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética.

"Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por assuntos sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado, sem nenhum tempo para pensar, voltado para a manjedoura com os outros animais" (extraído de "Armas silenciosas para guerras tranquilas" )

2- Criar problemas, depois oferecer soluções

Este método também é denominado "problema-reacção-solução". Primeiro cria-se um problema, uma "situação" destinada a suscitar uma certa reacção do público, a fim de que seja ele próprio a exigir as medidas que se deseja fazê-lo aceitar. Exemplo: deixar desenvolver-se a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público passe a reivindicar leis securitárias em detrimento da liberdade. Ou ainda: criar uma crise económica para fazer como um mal necessário o recuo dos direitos sociais e desmantelamento dos serviços públicos.

3- A estratégia do esbatimento

Para fazer aceitar uma medida inaceitável, basta aplicá-la progressivamente, de forma gradual, ao longo de 10 anos. Foi deste modo que condições sócio-económicas radicalmente novas foram impostas durante os anos 1980 e 1990. Desemprego maciço, precariedade, flexibilidade, deslocalizações, salários que já não asseguram um rendimento decente, tantas mudanças que teriam provocado uma revolução se houvessem sido aplicadas brutalmente.

4- A estratégia do diferimento

Outro modo de fazer aceitar uma decisão impopular é apresentá-la como "dolorosa mas necessária", obtendo o acordo do público no presente para uma aplicação no futuro. É sempre mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrifício imediato. Primeiro porque a dor não será sofrida de repente. A seguir, porque o público tem sempre a tendência de esperar ingenuamente que "tudo irá melhor amanhã" e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Finalmente, porque isto dá tempo ao público para se habituar à ideia da mudança e aceitá-la com resignação quando chegar o momento.

Exemplo recente: a passagem ao Euro e a perda da soberania monetária e económica foram aceites pelos países europeus em 1994-95 para uma aplicação em 2001. Outro exemplo: os acordos multilaterais do FTAA (Free Trade Agreement of the Americas) que os EUA impuseram em 2001 aos países do continente americano ainda reticentes, concedendo uma aplicação diferida para 2005.

5- Dirigir-se ao público como se fossem crianças pequenas

A maior parte das publicidades destinadas ao grande público utilizam um discurso, argumentos, personagens e um tom particularmente infantilizadores, muitas vezes próximos do debilitante, como se o espectador fosse uma criança pequena ou um débil mental. Exemplo típico: a campanha da TV francesa pela passagem ao Euro ("os dias euro"). Quanto mais se procura enganar o espectador, mais se adopta um tom infantilizante. Por que?

"Se se dirige a uma pessoa como ela tivesse 12 anos de idade, então, devido à sugestibilidade, ela terá, com uma certa probabilidade, uma resposta ou uma reacção tão destituída de sentido crítico como aquela de uma pessoa de 12 anos". (cf. "Armas silenciosas para guerra tranquilas" )

6- Apelar antes ao emocional do que à reflexão

Apelar ao emocional é uma técnica clássica para curtocircuitar a análise racional e, portanto, o sentido crítico dos indivíduos. Além disso, a utilização do registo emocional permite abrir a porta de acesso ao inconsciente para ali implantar ideias, desejos, medos, pulsões ou comportamentos...

7- Manter o público na ignorância e no disparate

Actuar de modo a que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para o seu controle e a sua escravidão.

"A qualidade da educação dada às classes inferiores deve ser da espécie mais pobre, de tal modo que o fosso da ignorância que isola as classes inferiores das classes superiores seja e permaneça incompreensível pelas classes inferiores". (cf. "Armas silenciosas para guerra tranquilas" )

8- Encorajar o público a comprazer-se na mediocridade

Encorajar o público a considerar "fixe" o facto de ser idiota, vulgar e inculto...

9- Substituir a revolta pela culpabilidade

Fazer crer ao indivíduo que ele é o único responsável pela sua infelicidade, devido à insuficiência da sua inteligência, das suas capacidades ou dos seus esforços. Assim, ao invés de se revoltar contra o sistema económico, o indivíduo se auto-desvaloriza e auto-culpabiliza, o que engendra um estado depressivo que tem como um dos efeitos a inibição da acção. E sem acção, não há revolução!...

10- Conhecer os indivíduos melhor do que eles se conhecem a si próprios

No decurso dos últimos 50 anos, os progressos fulgurantes da ciência cavaram um fosso crescente entre os conhecimentos do público e aqueles possuídos e utilizados pelas elites dirigentes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o "sistema" chegou a um conhecimento avançado do ser humano, tanto física como psicologicamente. O sistema chegou a conhecer melhor o indivíduo médio do que este se conhece a si próprio. Isto significa que na maioria dos casos o sistema detém um maior controle e um maior poder sobre os indivíduos do que os próprios indivíduos.