'Boys' dominam empresas públicas
por João Cristóvão Baptista,DN
Empresas do Estado servem de abrigo para ex-assessores, antigos chefes de gabinete e operacionais políticos do PS e PSD. Salários variam entre os três mil euros e os 20 mil euros, com direito a várias regalias como carros, telemóveis e ajudas de custo.
Cargo: administrador.
Experiência anterior: membro no governo.
É desta forma que começa a descrição dos currículos de muitos dos gestores de empresas do Estado, usado nas últimas décadas por PS e PSD como plataforma para colocação dos seus homens e mulheres de confiança nestes cargos pagos com o dinheiro dos contribuintes.
Estes boys (como são conhecidos popularmente) são normalmente antigos chefes de gabinete, ex-assessores de ministros e até antigos secretários de Estado que foram parar aos cargos que desempenham nas empresas públicas depois de a sua passagem pelo governo ter terminado.
Os 18 exemplos que o DN apresenta são apenas alguns dos muitos casos que existem actualmente nas empresas detidas pelo Estado - há casos em que o mandato terminou no fim de 2010, mas que se mantêm em funções, pelo menos, até Abril - e cuja informação curricular e situação remuneratória é disponibilizada por estas empresas.
Mesmo sem conhecimentos nas áreas para as quais são nomeados, estes boys e girls ganham muito mais do que recebiam quando percorriam os corredores ministeriais, e muitos têm hoje salários mais elevados que o próprio primeiro-ministro, com remunerações que variam entre os três e os 20 mil euros por mês. Valores a que se juntam privilégios como carros, telemóveis e ajudas de custo.
Entre os casos analisados pelo DN, saltam à vista situações como a de Rodolfo Lavrador, 46 anos, administrador da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Antes de chegar ao do banco do Estado, em 2008, pela mão do presidente Faria de Oliveira, Lavrador passou pelo governo de António Guterres: primeiro como chefe de gabinete de Sousa Franco nas Finanças (de 1995 a 1999) e depois como chefe de gabinete do próprio primeiro-ministro (2001 a 2002). Ainda antes de o governo ter caído, Rodolfo Lavrador chegou mesmo a ser nomeado secretário de Estado do Tesouro e Finanças. Como administrador na CGD, Lavrador ganha 17 457 euros por mês, de acordo com a informação pública do banco.
É também ao lado de Faria de Oliveira que trabalha Norberto Rosa. Este administrador, que tem entre mãos a pasta do BPN, foi secretário de Estado do Orçamento de Cavaco Silva e Durão Barroso - entre 1993 e 1995 e entre 2002 e 2004. Tal como Lavrador, Rosa ganha mensalmente 17 457 euros.
Do tempo em que Durão Barroso esteve no poder há outros casos de passagens do governo para o SEE. Miguel Roquette, antigo adjunto do então ministro das Obras Públicas, António Mexia, e posteriormente chefe de gabinete do secretário de Estado das Obras Públicas do mesmo executivo, é administrador do Metro de Lisboa. Um cargo que lhe rende 6306 euros por mês.
Já Alberto Souto de Miranda, actual vice--presidente da Anacom - regulador do sector das comunicações - recebe 14 198 euros mensais. Com 52 anos, Alberto Miranda foi presidente da Câmara de Aveiro entre 1997 e 2005, eleito pelo PS. Do seu currículo, disponibilizado pelo regulador, a única menção a experiência na área das comunicações diz respeito a um consórcio composto por aquela autarquia e a Portugal Telecom.
Muita experiência... no Governo
Outro caso típico é o de Ana Sofia Tomaz, administradora na Estradas de Portugal (EP). Com apenas 35 anos de idade, do currículo desta engenheira civil destacam-se principalmente os cargos que desempenhou ao serviço de Paulo Campos, secretário de Estado das Obras Públicas. Depois de ter sido assessora deste governante (entre 2007 e 2009) e sua adjunta (2009 a 2010), Ana Sofia Tomaz foi nomeada para a administração da EP, em Julho de 2010, com um salário de 10 800 euros mensais (segundo o relatório e contas de 2009). Além do ordenado, esta administradora da empresa tem ainda direito a carro de serviço e telemóvel. Ainda na EP e com o mesmo salário encontramos Rui Ferreira Dinis, que passou pelo governo de António Guterres, como adjunto dos secretários de Estado da Defesa e da Indústria e Energia e do secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro.
Igualmente abaixo dos 40 anos e com um percurso que mistura política e gestão de empresas públicas está Fernando Rocha Andrade. Entre 2005 e 2007, o administrador não executivo da REN foi subsecretário de Estado da Administração Interna, um cargo sem qualquer relação com negócios de energia com que agora lida. Embora não tenha uma remuneração fixa, Fernando Rocha Andrade recebeu em 2009 perto de 48 mil euros, devido às responsabilidades que tem enquanto membro da Comissão de Auditoria desta empresa pública.
Nos quadros da Empordef - Empresa Portuguesa de Defesa está Fernando Vaz de Medeiros. No seu currículo destaca-se o cargo que ocupou antes de ser nomeado administrador desta empresa: assessor de João Figueiredo, secretário de Estado da Administração Pública, entre 2005 e 2008. Remuneração actual? 4184 euros mensais.
Diz o povo que "em equipa que ganha não se mexe". Um ditado que parece ter sido levado à letra por António Guilhermino Rodrigues, presidente da ANA - Aeroportos de Portugal. Depois de ter sido assessor do então primeiro-ministro António Guterres (1995 e 1996), Guilhermino foi nomeado secretário de Estado dos Transportes, período em que teve como colaboradores Rui Veres - assessor - e Maria de Lurdes Alves (chefe de gabinete).
A equipa está hoje novamente reunida: Rui Veres é administrador na ANA desde 1999 e a ganha um ordenado de 7820 euros mensais. Um valor a que junta 1588 euros por mês pelo posto que ocupa na administração da NAER - Novo Aeroporto, S.A. (sob tutela da ANA). Em 2007 foi a vez de Maria de Lurdes Alves se juntar a António Guilhermino e Rui Veres, depois de ter saído do Ministério das Finanças. É administradora da NAER, onde recebe - segundo o último relatório de contas da ANA - um salário que ascende a 7500 euros por mês.
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