
RiscoCalculado Escreveu:
Quanto a Portugal, andamos a tomar remédio keynesiano quer estejamos ou não doentes, há 35 anos.
Na realidade nos últimos 35 anos em poucas ocasiões se podem realmente classificar as políticas seguidas de keynesianas. Não é pelo facto de determinada política ou determinado orçamento ser menos equilibrado ou mais "gastador" que pode imediatamente ser considerado de keynesiano.
E certamente tb não é pelo facto de um qq político justificar a sua política com argumentos supostamente "keynesianos" que isso corresponde à verdade.
Penso que o Prof. Silva Lopes é relativamente insuspeito :
Quanto aos efeitos de estabilização económica , pode dizer-se que a gestão da procura global nunca foi um objectivo importante da nossa política de finanças públicas . As novas correntes da teoria económica , com grande peso no fim do séc. XX , tendem a atribuir pouco relevo à função estabilizadora dessa política , mas há opiniões muito categorizadas que as contestam . Em Portugal , os orçamentos das despesas e os níveis dos impostos nunca foram fixados na base de considerações keynesianas . Nos dois acordos com o Fundo Monetário Internacional (1977-1979 e 1983-1985 ) , a redução dos défices orçamentais foi programada como um dos meios fundamentais para conter a procura interna , mas nem num nem noutro essa redução atingiu proporções significativas . Se os défices se aprofundaram em período de recessão , como em 1984-1985 e em 1993-1994 , isso sucedeu mais por causa dos estabilizadores automáticos ( variações automáticas das receitas fiscais em sentido positivo e de algumas despesas em sentido negativo ???, por causa da contracção da actividade económica ) do que como resultado de políticas deliberadas para estimular a procura interna . Por outro lado , durante o período de 1995-2000 , quando as receitas ( as dos impostos e as provenientes das privatizações ) cresceram bem e quando cairam a taxas de juro da dívida pública , em vez de se terem aproveitado as circunstâncias favoráveis para reduzir o défice e produzir mesmo situações de excedente orçamental , como recomendava o Pacto de Estabilidade e Crescimento da zona euro , preferiu-se continuar com uma política pró-cíclica , dinamizada pelo crescimento imoderado das despesas . O resultado foi que , depois de excedidos os limites do défice fixados no Pacto de Estabilidade , Portugal se viu sem margem de manobra para adoptar uma política contracíclica que ajudasse a combater os efeitos do afrouxamento da procura privada .
José da Silva Lopes in História Económica de Portugal 1700-2000 ( Pedro Lains e Álvaro da Silva Ferreira )
P.S.: os ??? são meus pois parece-me que tem ali uma gralha (receitas e despesas parecem-me estar trocadas naquela frase).
Sim, concordo que, provavelmente, à excepção destes grandes projectos de investimento anunciados muito recentemente ( e que ainda não passaram do papel), nunca a política económica fiscal, nomeadamente despesa e investimento público, teve como objectivo o estímulo da procura agregada.
O que torna o problema das contas públicas portuguesas ainda mais crónico.
Significa que é um problema estrutural e não conjuntural.
Do meu ponto de vista, significa que Portugal andou a tomar remédio keynesiano (recurso a défices públicos) não para aumentar a procura agregada (doença que os keynesianos dizem curar com os défices públicos), mas simplesmente porque os nossos políticos sempre gastaram mais do que aquilo que tiveram.
O que torna tudo ainda mais grave. Aliás, os keynesianos defendem défices públicos, elevados se forem necessários, mas TEMPORARIAMENTE, e não de forma crónica como no caso português.
cumps