Instituições financeiras correm riscos de falência
Crise da banca anula os efeitos pretendidos com as políticas de austeridade na Irlanda
05.09.2010 - 10:45 Por Sérgio Aníbal
Foi o país que cumpriu todos os conselhos das agências de rating, Comissão Europeia e FMI, mas a verdade é que, agora, passado mais de um ano desde o início das mais duras medidas de austeridade, a Irlanda parece estar cada vez mais longe de resolver a sua grave crise financeira. E já há quem diga que, por este caminho, não vai mesmo conseguir evitar a insolvência.
Para responder aos efeitos da crise financeira internacional e ao rebentamento da bolha imobiliária que se tinha acumulado, o Governo optou, logo em 2008, por se endividar em larga escala para salvar os bancos da falência iminente, ao mesmo tempo que impunha cortes drásticos noutro tipo de despesas, incluindo uma redução dos salários da função pública. Os resultados não são, para já, animadores. Em 2010, o défice público deverá ser superior a 10 por cento, um resultado pior do que o da Grécia, e a economia voltará a contrair-se. E as más notícias continuam a chegar.
Durante a semana passada, o Anglo Irish Bank, um dos bancos nacionalizados, anunciou que vai precisar de mais 25 mil milhões de euros de fundos públicos para evitar a falência. Este novo esforço financeiro, que vários analistas consideram ser apenas uma parte daquilo que irá ser necessário, equivale a 19 por cento do PIB irlandês e a dois terços da receita fiscal de um ano.
"Posto de maneira simples, a Irlanda parece estar insolvente, tendo em conta os cenários mais plausíveis com as actuais políticas", afirmam os economistas Peter Boone e Simon Johnson, os mesmo que no início deste ano irritaram Teixeira dos Santos ao dizer que Portugal era "a nova Grécia".
Num texto publicado no blogue Economix do The New York Times, Boone e Johnson calculam que,
a este ritmo, em 2015, a cada família irlandesa corresponderá uma dívida pública de 200 mil euros, um valor insustentável que, mesmo que regressem as taxas elevadas de crescimento, não será possível pagar. Por isso, dizem, a única solução é assumir a insolvência dos bancos, antes que seja necessário enfrentar a insolvência do Estado. "A Irlanda tinha escolhas mais prudentes. Poderia ter cortado nos défices orçamentais, ao mesmo tempo que reconhecia a insolvência, exigindo que os credores [dos bancos] partilhassem algumas das perdas [com os contribuintes]", explicam.
Do lado do Governo, no entanto, essa hipótese, para já, não se coloca. "Quando se fala sobre deixar um banco entrar em colapso ou falir, impondo perdas aos seus credores, isso também significaria impor perdas aos depositantes e ao Banco Central Europeu. Isso é impensável", afirmou numa entrevista recente Alan Ahearn, um dos principais conselheiros do ministro irlandês das Finanças, Brian Lenihan.
A pressão sobre o Governo irlandês, no entanto, aumenta de dia para dia e o "impensável" pode, como já aconteceu algumas vezes nesta crise, começar a ser pensado. Tanto as agências de rating como os mercados, que inicialmente aplaudiram a política seguida pela Irlanda, começaram a mudar de opinião.
A Standard & Poor"s decidiu no mês passado baixar a classificação de risco atribuída às finanças públicas irlandesas e os spreads dos títulos da dívida pública irlandesa face à Alemanha subiram mais de 100 pontos durante o último mês, superando já Portugal. "A Irlanda tem sido vista como estando a liderar o resto da Europa em termos de medidas de austeridade, mas agora o mercado não está a gostar desta caixa negra que foi aberta pelos bancos", explicou David Schnautz, um analista do Commerzbank em Londres, à agência Bloomberg.
O efeito que os cortes orçamentais rigorosos tiveram sobre a procura interna e sobre a situação dos bancos (o desemprego ultrapassa os 13 por cento) também tem sido motivo de discussão. Paul Krugman, o prémio Nobel que tem sido o maior crítico da utilização, nesta fase, de políticas de austeridade demasiado intensas, não perdeu tempo a usar a Irlanda e as suas recentes dificuldades nos mercados como um exemplo. "Uma vez que os defensores da austeridade têm vindo a dar a aprovação dos mercados obrigacionistas como um exemplo do sucesso das suas políticas, vale agora a pena assinalar que a "bem-comportada" Irlanda parece estar a entrar numa espiral de endividamento, enquanto a "moribunda" Espanha parece consideravelmente melhor", escreveu
http://economia.publico.pt/Noticia/cris ... da_1454401