
Parece que a crise anda por aqui...
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A Crise a Norte
A grave crise em que o Norte de Portugal está mergulhado está a atingir dimensões inimagináveis e potenciadoras de graves crises sociais. Justiça seja feita ao actual Bispo do Porto, a voz mais sensata e audível nesta matéria.
Para evitar confusões, vou começar por alguns esclarecimentos prévios: Não vou, nem pretendo nem esse deve ser o caminho, culpar terceiros; Estamos perante uma situação real e grave, bastante ….
Quando Rui Rio, a propósito das portagens nas SCUTs, avisou publicamente do clima de tensão vivido na região, manifestou um sentimento que é verdadeiro mas que ultrapassa essa matéria pontual. Assiste-se, desde 2000, a um crescendo de revolta social proporcional ao crescimento da crise económica na região. Aliás, as posições públicas de homens do Norte como Rui Moreira e Carlos Abreu Amorim somando, recentemente, o nascimento de movimentos como o Douro Litoral ou potenciais partidos como o Movimento Norte, não são fruto do acaso mas “fruta da época”. Ou seja, parte das elites intelectuais do Norte começam, paulatinamente, a ser a voz pública e publicada desse sentimento de desespero.
Obviamente, quando se fala do Norte não se deve confundir com o “Porto”. A cidade é uma parte do todo e a crise é geral. Hoje, Braga, Vila Real ou mesmo Guimarães, conseguem ser excepções a esta regra de regressão. O problema do Porto é diverso do de Braga. Esta, sendo a capital do respectivo distrito, está bem mais pujante que o restante território e situação idêntica se pode afirmar de Vila Real. A contrário, a cidade do Porto já não é o motor do respectivo distrito (Gaia, Maia e Matosinhos conseguem estar a fazer melhor).
Os valores do desemprego na região começam a ser assustadores, quer se olhe para os oficiais quer se repare nos oficiosos. Pior, foi desta zona do país que mais trabalhadores da construção civil rumaram a Espanha permitindo, durante vários anos, esconder ou adiar os valores reais da crise. Agora, boa parte, está a regressar, com uma mão à frente e outra atrás. A “Sopa dos Pobres” e todas as Instituições de Solidariedade Social sentem o número de utentes a crescer de forma vertiginosa nos últimos dois anos. O ensino privado está a sentir na pele com o aumento de crianças a sair para a escola pública e os encarregados de educação a não cumprirem os prazos de pagamento de propinas. E que dizer, no ensino público, do elevado e crescente número de crianças cujos pais devem vários meses de senhas de refeição? Sim, já estamos a falar de situações graves de fome e oriundas da chamada “classe média”.
Quem anda pelas ruas do Porto e respectivos arredores, quem circula pelo interior norte, depara com uma florestas de placas “Vende-se” coladas nas janelas, penduradas nas varandas ou espetadas nos terrenos. Em praticamente todas as superfícies comerciais da região temos inúmeras lojas tapadas com o famoso e abundante letreiro publicitário: “Abre em breve mais uma loja para o servir”, sendo o “breve” algo de surreal. As principais ruas comerciais metem medo ao susto, parecendo zonas de guerra tal o grau de abandono das mesmas. Nas chamadas “Zonas Industriais” onde a industria é uma miragem e os serviços uma praga, voltamos a encontrar as famosas placas, sejam da ERA ou da REMAX ou outra qualquer imobiliária que promete vender ou arrendar. Depois temos os números oficiais de falências de empresas e já estamos em terrenos de filme de terror.
Basta uma subida, ligeira até, das taxas de juro no crédito à habitação e teremos aqui uma “região de Setúbal” dos anos oitenta em tamanho XXL.
A situação vivida a Norte não é, de todo, idêntica a que ocorre na região Centro (aqui incluindo Lisboa e Vale do Tejo) ou na região Sul ou na Madeira e Açores. Nestas não será boa mas não é trágica. A região Norte só não está numa situação dramática desde 2000 por um simples motivo: as autarquias locais. Foram elas, para o bem e para o mal, que aguentaram a situação, que investiram e que criaram postos de trabalho directos e, sobretudo, indirectos. Pelo menos até 2007. Porém, como seria de esperar, não seria possível continuar neste sistema “económico” indefinidamente e o endividamento autárquico chegou ao limite.
Continua...
Continuação...
Sem indústria, sem comércio, sem as autarquias locais, já mais nada resta. Lembro-me de ler, no início dos anos noventa, um livro chamado “As Regiões Ganhadoras” e a forma como estas necessitavam de autonomia política para vencerem as dificuldades e combaterem o centralismo naturalmente asfixiador. Nós não temos forma de as diferentes regiões concorrerem entre si na obtenção de investimento privado e público. Como pode uma região, que não existe politicamente, competir com outra quando esta é subsidiada por investimento público em detrimento da anterior? Mas vamos ser práticos e utilizar um exemplo que a maioria percebe:
Como pode o Sporting de Braga competir com o Porto, Benfica e Sporting quando não consegue negociar valores próximos dos recebidos por estes seus adversários pela estatal PT/TMN/SAPO? Dirão os mais conhecedores que é uma questão de mercado. Não, não é. Se assim fosse, como me dói escrever isto, o Benfica teria de receber bem mais do dobro do Porto e Sporting pois o seu “mercado” é duplamente (ou mais) superior. Quando não se praticam as regras do mercado este não pode servir de desculpa.
Ora, o futebol é um espelho do país que somos e temos, reflectindo esta realidade “distorcida” e cujo exemplo máximo é o actual QREN e o anterior QCA III (Quadro Comunitário de Apoio). Numa recente tese de mestrado apresentada numa universidade portuense, uma estudiosa da matéria prova, com números e factos concretos, a diferença entre a taxa de execução de candidaturas apresentadas em sede de Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional em contraponto com a taxa de execução de candidaturas apresentadas aos Programas Operacionais não regionais decididos pelo Poder Central.
E essa taxa é bem menor no segundo caso. Não estamos a falar “em teoria” mas na prática corrente e puramente real. Estes desequilíbrios não são ficção nem “mania da perseguição destes gajos labregos do Norte”. Não. E a realidade é bem pior no Interior. A diferença é que a Norte e, em especial, no litoral, a situação social é explosiva fruto de crescentes focos de pobreza onde, como já alguns dizem sem qualquer freio nas palavras, “quando o meu filho começar a passar fome mais não me resta do que roubar”. Quando na “sopa dos pobres” encontramos professores, profissionais liberais e famílias inteiras e se soma o esgotar do leite e do arroz, estamos já a caminhar rente à linha negra do desespero.
Não perceber a realidade e nada fazer para a inverter é brincar com o fogo. É esta realidade que explica a “revolta das SCUTs”. Por vezes, como a história nos ensina, são as coisas menores amplificadas pelas dores maiores que levam à revolta popular.