As três razões da crise portuguesa
Portugal e Espanha atravessam, neste momento, tempos conturbados e difíceis. Já ninguém nega a complexidade da situação económica e orçamental em que estamos mergulhados (temos sempre que relembrar que tanto o governo socialista português como o governo socialista espanhol andaram todo o ano de 2009 a negar que fosse muito grave a situação económica e insultavam quem duvidava da solidez orçamental). Junta-se a tudo isto uma situação política pouco estável, com governos minoritários. Como chegámos tão perto do abismo? Como assegurar que vamos voltar a ter uma economia a crescer e uma forte consolidação orçamental antes de 2013?
Felizmente que basta ler o que dizem os "amigos" do Governo para entender as três razões da crise portuguesa (e espanhola) e como sair dela sem grandes complicações. A razão mais grave, segundo as palavras do ministro do Fomento espanhol e número dois dos socialistas aqui ao lado, é uma poderosa conspiração de interesses internacionais para destruir o euro e castigar as economias que seguem modelos socialistas. Trata-se de um movimento neoliberal sinistro, desde os investidores internacionais aos grandes bancos e empresas, passando pelas agências de "rating". Toda esta gente não quer ganhar dinheiro nem está muito preocupada com os seus investimentos; são uns capitalistas gananciosos das economia de casino mas que afinal não querem ganhar dinheiro, bem pelo contrário. Eles querem, sim, derrotar o socialismo democrático, ajudar os partidos neoliberais e acabar com o euro, que, como moeda única, representa os valores sociais europeus. Na verdade, toda esta gente aposta contra a solidez das economias do sul da Europa para perder dinheiro e desvalorizar os seus investimentos especulativos com o único propósito de derrubar os governos socialistas em Espanha, em Portugal e na Grécia.
A esta poderosa conspiração neoliberal internacional juntam-se os traidores nacionais. Aqueles que dizem mal do País (porque criticar o Governo, o PS e, principalmente, o primeiro-ministro é maldizer Portugal), aqueles que usam as instituições internacionais para difamar a Pátria, aqueles que não medem as suas palavras quando falam da economia portuguesa e das finanças públicas. Infelizmente abundam os traidores e as gentes irresponsáveis. Mas o bom governo português continua a trabalhar activamente para "solucionar" o problema. Temos de calar os traidores, a bem de Portugal.
Finalmente, temos os pessimistas, os derrotistas, os Velhos do Restelo e as Cassandras. Não são traidores porque só dizem mal cá dentro, mas criam desconfiança e incerteza, não ajudam ao desenvolvimento das brilhantes políticas públicas do Governo socialista. Na verdade, a realidade teima em dar razão a estes pessimistas mas isso é porque a realidade não existe, é meramente uma construção social que infelizmente foi tomada de assalto por essa gente. Precisamos urgentemente de ter uma comunicação social dominada por optimistas e afastar os pessimistas de qualquer influência na sociedade portuguesa. Eles são a raiz daninha da nossa economia estagnada.
Conhecidas as três razões da crise portuguesa, evidentemente que é fácil resolver o problema económico e sem grandes custos sociais. Basta calar os traidores e afastar os pessimistas, denunciar a conspiração internacional ou visitar os jornais importantes em Londres, como já fez o governo espanhol, insultar os investidores e os observadores económicos internacionais, como muito bem fizeram o nosso primeiro-ministro e o nosso Presidente da República. Uma vez superadas as três razões indicadas, teremos desenvolvimento e riqueza para todos. Como portugueses, devemos ajudar o Governo, desvalorizando os pessimistas e os derrotistas, ignorando os traidores e criticando a conspiração internacional. Devemos acreditar na política económica e financeira que prossegue o Governo, pois, como nos dizem cada dia, em breve estaremos certamente no pelotão da frente.
Tudo isto é demencial e irresponsável. Mas é a mensagem da propaganda dos governos socialistas em Portugal e em Espanha cada dia, nos jornais e nas televisões. Dizem as sondagens que muitos portugueses acreditam nisto. Ou querem acreditar nisto. Muitos ainda acham que vamos sair assim do abismo em que estamos metidos, culpando uns, insultando outros e negando a realidade. Boa sorte!
Nuno Garoupa
Professor de Direito da University of Illinois
nuno.garoupa@gmail.com
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