Hubble Escreveu:Caros Jesse e Ulisses
Muito obrigado pela vossa esclarecedora troca de opiniões!
Eu (rookie com menos de dois anos de mercados) negoceio em média três títulos e tenho cerca de meia dúzia debaixo de olho. Tenho aprendido imenso com os ATs do fórum (Ulisses, Marco, Elias, Laaz, Rafael, NYK, AC, Rufa e Cem, mais alguns que não consigo referir senão este post iria tornar-se quase num elenco do CB), que me têm protegido de alguns trambolhões valentes.
Mas gostava de deixar uma pergunta aos ATs: nunca se atiraram “de cabeça” a um título, apenas por feeling, análise fundamental ou uma esperança qualquer (por mais doida que tivesse sido) sobre a empresa, deixando que o tempo se encarregasse de a fazer subir? Leio muitas vezes o exemplo da PAD, mas não existirão vários exemplos contrários? A Altri do passado, o BCP da década de 1990, ou mesmo a JM dos últimos anos…
Bem, se eu dissesse que o feeling não desempenha papel nenhum no meu trading estaria a mentir.
E penso mesmo que não deve haver nenhum problema em que as pessoas admitam que têm uma determinada opinião por feeling (ou que o feeling têm um determinado peso na formulação de uma certa opinião). Porque o feeling não é necessariamente algo de mau, prejudicial ou irracional...
Sem pretender ser presunçoso, mas apenas porque na minha opinião faz todo o sentido, podemos e devemos dividir "dois tipos" de feeling. Um investidor recém chegado aos mercados, eu sugeriria que ignorasse o feeling. Mas à medida que se vai ganhando experiência eu sugiro (ou penso que é de ponderar) atribuir mais peso ao feeling.
Nem sempre conseguimos racionalizar tudo e este mecanismo parece existir na natureza e ainda subsistir no ser humano e desempenhar um papel de sobrevivência. A verdade é que nós não conhecemos todos os mecanismos através dos quais processamos a informação e quando a quantidade e natureza da informação é complexa, os processos lógicos podem e começam a falhar. Um processo menos tangível não é necessariamente mau. O cérebro é um computador extremamente complexo e poderoso (mesmo o cérebro de um insecto ou de um pequeno mamífero é um poderosíssimo computador) com uma particularidade muito especial que o distingue claramente dos computadores artificiais construídos por nós (actualmente baseados em silício e em zeros e uns): é um computador não especializado.
Para não entrar numa linguagem muito técnica (até porque não seria a pessoa mais adequada o meu conhecimento sobre a matéria é vago, de um leigo, mas mínimo porque o tema me interessa) nós conseguimos tratar muita informação de uma forma bastante flexível. Chegamos até a ter vários processos cerebrais diferentes para atingir o mesmo fim. Por exemplo, talvez alguns não saibam mas nós não contamos sempre da mesma forma: para valores pequenos e quando isso é possível usamos um processo tipo reconhecimento de imagem e não chegamos a contar coisa nenhuma. Isto já foi demonstrado. Se se apresentar uma imagem com três bolas, os sujeitos não contam "1, 2, 3". Eles reconhecem a imagem e dizem "automaticamente" que representa 3...
Mas para números mais elevados usamos um processo diferente. Simplesmente o cérebro encontra formas "podemos chamar-lhe shortcuts mentais" para atingir determinados fins da forma que ele considera mais prática ou adequada sem termos noção disso.
É por isso que em determinadas situações por exemplo sentimos um impulso de urgência antes de sermos capaz de racionalizar o que quer que seja. Porque o cérebro recebeu informação que o colocou em estado de alerta ainda antes de podermos efectuar um raciocínio lógico sobre a informação que recebemos.
Este tipo de mecanismo, e daí eu ter feito esta exposição, penso estar relacionado com aquilo que descrevemos como feelings. E para voltar ao início, sem nos apercebermos inteiramente disso, o nosso cérebro vai-se treinando sozinho em determinadas operações chegando a certa altura a não estar à espera das nossas reacções ditas voluntárias para agir ou formar algum tipo de output.
Outro exemplo semelhante seria a "condução piloto" que qualquer condutor adquire assim que tem alguma prática de condução.
Portanto, eu penso que a experiência não deve ser ignorada e que esta se pode manifestar sobre a forma de um feeling. Portanto, ao fim de algum tempo de mercado se nós achamos que poderá estar prestes a acontecer isto ou aquilo com base numa "sensação" que não conseguimos expor de uma forma totalmente racional e lógica, que isso não deve ser ignorado inteiramente.
Hubble Escreveu:Não nos podemos esquecer que muito de nós não têm o tempo (ou a paciência ou os conhecimentos) para fazer análises detalhadas.
Por outro lado, e tentando ser sintético pois já me alonguei um bocadinho na secção anterior. Eu tenho a convicção que muitas pessoas confundem detalhe com eficiência...
Muitos "investidores-observadores" tendem a ficar deslumbrados ou simplesmente mais susceptíveis a aceitar uma determinada análise só porque ela é mais profunda e detalhada. Quando profunidade e detalhe não é necessariamente sinónimo de eficiência da análise.
E isto é, para mim, particularmente válido nos mercados porque o tratamento da informação não tem um efeito cumulativo. Quero dizer concretamente que quanto mais informação tratamos não significa que a nossa análise vai ser mais correcta e eficaz, dada a natureza do processo em questão (os mercados são um enorme sistema não linear).
Por isso, não só não temos tempo para tratar toda a informação de que dispomos exaustivamente como não é seguro que cheguemos a um melhor resultado quando o tentamos fazer. Na minha opinião pode retirar-se benefícios filtrando informação (logo tratando menos informação) mas tratando-a melhor, isto é, de forma mais eficaz.
Agora, tb tenho dificuldade em dizer que nos últimos 6 ou 7 anos comprei uma acção de forma cega. O máximo que consigo dizer é que o feeling desempenhou um papel na decisão. E nem sempre correu bem...