
Leif Pagrotsky
Serão os "bad banks" uma boa ideia?
© Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org
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A ideia de um "bad bank" parece estar a ganhar cada vez mais popularidade nos países onde os activos tóxicos paralisaram a concessão de crédito. O saneamento da banca sueca em inícios da década de 90 é frequentemente citado como um exemplo do quão bem sucedida pode ser esta ideia.
A ideia de um "bad bank" parece estar a ganhar cada vez mais popularidade nos países onde os activos tóxicos paralisaram a concessão de crédito. O saneamento da banca sueca em inícios da década de 90 é frequentemente citado como um exemplo do quão bem sucedida pode ser esta ideia. Mas as lições que, por vezes, são dadas com base na experiência sueca estão fundadas em pressupostos errados relativamente ao que de facto foi feito e à forma como o nosso sistema funcionou.
A iniciativa de criar um "bad bank" na Suécia não foi tomada pelos políticos, mas sim pela equipa de gestão do Nordbanken. Depois de anos e anos de má gestão e atribuição incauta de crédito, o banco foi a primeira grande vítima da queda do mercado das propriedades comerciais, em 1990.
O Nordbanken foi completamente nacionalizado e foi nomeada uma nova equipa de gestão para restaurar a viabilidade daquela entidade financeira. Mas rapidamente se percebeu que os gestores não dispunham de muito tempo para se focalizarem nas principais actividades bancárias do Nordbanken porque tinham de gerir uma enorme variedade de activos, que lhes pediam uma atenção desproporcionada. E a cada novo trimestre procedia-se a novas amortizações de activos, o que arruinou os esforços no sentido de restabelecer a reputação do banco e a moral dos seus colaboradores.
A solução radical foi separar todos os activos que não estavam ligados ao "core business" do banco e que se tratavam, essencialmente, de empresas do ramo imobiliário, mas também empresas dos sectores da transformação, construção e serviços.
O "bad bank" que foi criado para esse propósito, o Securum, precisou de uma avultada injecção de capital por parte do seu proprietário, o governo sueco. Mas depois disso, o Securum ganhou capacidade para contratar colaboradores qualificados, capazes de maximizar o valor dos activos quando os mercados recuperassem e capazes de dar ao banco a posição financeira necessária para esperar por essa recuperação. O resto do Nordbanken, agora conhecido como Nordea, acabou por se tornar no maior banco da Escandinávia.
Em contraste com a situação que se vive actualmente, os activos tóxicos eram, habitualmente, empresas inteiras e não títulos complexos. No entanto, tal como acontece com os actuais activos tóxicos, não havia mercado e um rápido desinvestimento teria despoletado uma queda dos preços, desvalorizando todos os activos da economia e resultando em mais falências de bancos.
Além disso, o que estava em causa não era ajudar os bancos privados a libertarem-se dos seus activos problemáticos. Quando grande parte dos restantes bancos suecos seguiram o exemplo do Nordbanken e criaram os seus próprios "bad banks", fizeram-no sem a participação do Estado. Mas isso só foi possível porque o governo sueco já possuía todos os activos, evitando assim a questão extremamente difícil de lhes fixar um preço.
Com um proprietário privado, as avultadas subvenções públicas teriam sido politicamente inaceitáveis. Teria sido necessário dar aos activos um preço bastante acima do seu valor de mercado, com os contribuintes a subsidiarem os anteriores proprietários falidos, ou então o banco privado não receberia qualquer espécie de ajuda. Assim sendo, criar um "bad bank" patrocinado pelo governo para activos privados é uma ideia muito má.
Em 1994, quando me tornei secretário de Estado dos Assuntos Financeiros no Ministério sueco das Finanças, a recuperação parecia estar já no horizonte, após a abolição da taxa de câmbio fixa, a consequente forte depreciação da coroa sueca e a redução das taxas de juro. O novo governo implementou um eficaz programa de grande envergadura para encerrar um défice orçamental de aproximadamente 12% do PIB.
Gradualmente, a confiança foi crescendo e os mercados financeiros começaram a funcionar de novo. À medida que foram surgindo oportunidades, começámos a reprivatizar os activos e em poucos anos o Securum foi encerrado. Observando em retrospectiva, estou convicto de que vendemos os seus activos demasiado depressa. Os contribuintes poderiam ter recuperado mais dinheiro dessas perdas se tivéssemos sido mais pacientes, já que os preços continuaram a subir durante bastante tempo. Mas o estigma do socialismo foi mais forte do que o instinto de ter lucro.
Estas são as lições da experiência sueca que parecem ser relevantes actualmente:
• Um "bad bank" pode ser um instrumento eficaz para a recuperação das perdas e para a revitalização dos bancos.
• Apesar de a experiência da Suécia estar ligada a títulos de empresas usadas como garantia de o crédito, em vez de obrigações ou instrumentos financeiros similares, é provável que esta situação surja actualmente em muitos países, à medida que a crise avança, que mais empresas vão à falência e que os bancos retiram do mercado as suas garantias e tomam posse dos títulos das empresas endividadas.
• As subvenções estatais para os "bad banks" privados, ou para "bad banks" públicos destinados a sanear os activos tóxicos dos bancos privados, são uma má forma de os contribuintes transferirem dinheiro para bancos em apuros quando comparada com as normais injecções de capital. Todos os subsídios devem ser transparentes e os "bad banks" público/privados não o são.
• É vital colocar nos "bad banks" gestores profissionais e experientes que não estejam ligados a quaisquer escândalos. Neste caso, a experiência sueca é encorajadora. Foi mais simples do que esperávamos a tarefa de recrutar bons profissionais para o Securum, porque trabalhar em prol do interesse público neste projecto pioneiro de um "bad bank" estatal foi entendido como um desafio único.
• O princípio orientador deve ser a maximização dos interesses económicos dos contribuintes e não as considerações de ordem política ou ideológica. O público não deve ter dúvidas quanto a isto, pois a sua confiança é primordial.
JN
Serão os "bad banks" uma boa ideia?
© Project Syndicate, 2008. www.project-syndicate.org
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A ideia de um "bad bank" parece estar a ganhar cada vez mais popularidade nos países onde os activos tóxicos paralisaram a concessão de crédito. O saneamento da banca sueca em inícios da década de 90 é frequentemente citado como um exemplo do quão bem sucedida pode ser esta ideia.
A ideia de um "bad bank" parece estar a ganhar cada vez mais popularidade nos países onde os activos tóxicos paralisaram a concessão de crédito. O saneamento da banca sueca em inícios da década de 90 é frequentemente citado como um exemplo do quão bem sucedida pode ser esta ideia. Mas as lições que, por vezes, são dadas com base na experiência sueca estão fundadas em pressupostos errados relativamente ao que de facto foi feito e à forma como o nosso sistema funcionou.
A iniciativa de criar um "bad bank" na Suécia não foi tomada pelos políticos, mas sim pela equipa de gestão do Nordbanken. Depois de anos e anos de má gestão e atribuição incauta de crédito, o banco foi a primeira grande vítima da queda do mercado das propriedades comerciais, em 1990.
O Nordbanken foi completamente nacionalizado e foi nomeada uma nova equipa de gestão para restaurar a viabilidade daquela entidade financeira. Mas rapidamente se percebeu que os gestores não dispunham de muito tempo para se focalizarem nas principais actividades bancárias do Nordbanken porque tinham de gerir uma enorme variedade de activos, que lhes pediam uma atenção desproporcionada. E a cada novo trimestre procedia-se a novas amortizações de activos, o que arruinou os esforços no sentido de restabelecer a reputação do banco e a moral dos seus colaboradores.
A solução radical foi separar todos os activos que não estavam ligados ao "core business" do banco e que se tratavam, essencialmente, de empresas do ramo imobiliário, mas também empresas dos sectores da transformação, construção e serviços.
O "bad bank" que foi criado para esse propósito, o Securum, precisou de uma avultada injecção de capital por parte do seu proprietário, o governo sueco. Mas depois disso, o Securum ganhou capacidade para contratar colaboradores qualificados, capazes de maximizar o valor dos activos quando os mercados recuperassem e capazes de dar ao banco a posição financeira necessária para esperar por essa recuperação. O resto do Nordbanken, agora conhecido como Nordea, acabou por se tornar no maior banco da Escandinávia.
Em contraste com a situação que se vive actualmente, os activos tóxicos eram, habitualmente, empresas inteiras e não títulos complexos. No entanto, tal como acontece com os actuais activos tóxicos, não havia mercado e um rápido desinvestimento teria despoletado uma queda dos preços, desvalorizando todos os activos da economia e resultando em mais falências de bancos.
Além disso, o que estava em causa não era ajudar os bancos privados a libertarem-se dos seus activos problemáticos. Quando grande parte dos restantes bancos suecos seguiram o exemplo do Nordbanken e criaram os seus próprios "bad banks", fizeram-no sem a participação do Estado. Mas isso só foi possível porque o governo sueco já possuía todos os activos, evitando assim a questão extremamente difícil de lhes fixar um preço.
Com um proprietário privado, as avultadas subvenções públicas teriam sido politicamente inaceitáveis. Teria sido necessário dar aos activos um preço bastante acima do seu valor de mercado, com os contribuintes a subsidiarem os anteriores proprietários falidos, ou então o banco privado não receberia qualquer espécie de ajuda. Assim sendo, criar um "bad bank" patrocinado pelo governo para activos privados é uma ideia muito má.
Em 1994, quando me tornei secretário de Estado dos Assuntos Financeiros no Ministério sueco das Finanças, a recuperação parecia estar já no horizonte, após a abolição da taxa de câmbio fixa, a consequente forte depreciação da coroa sueca e a redução das taxas de juro. O novo governo implementou um eficaz programa de grande envergadura para encerrar um défice orçamental de aproximadamente 12% do PIB.
Gradualmente, a confiança foi crescendo e os mercados financeiros começaram a funcionar de novo. À medida que foram surgindo oportunidades, começámos a reprivatizar os activos e em poucos anos o Securum foi encerrado. Observando em retrospectiva, estou convicto de que vendemos os seus activos demasiado depressa. Os contribuintes poderiam ter recuperado mais dinheiro dessas perdas se tivéssemos sido mais pacientes, já que os preços continuaram a subir durante bastante tempo. Mas o estigma do socialismo foi mais forte do que o instinto de ter lucro.
Estas são as lições da experiência sueca que parecem ser relevantes actualmente:
• Um "bad bank" pode ser um instrumento eficaz para a recuperação das perdas e para a revitalização dos bancos.
• Apesar de a experiência da Suécia estar ligada a títulos de empresas usadas como garantia de o crédito, em vez de obrigações ou instrumentos financeiros similares, é provável que esta situação surja actualmente em muitos países, à medida que a crise avança, que mais empresas vão à falência e que os bancos retiram do mercado as suas garantias e tomam posse dos títulos das empresas endividadas.
• As subvenções estatais para os "bad banks" privados, ou para "bad banks" públicos destinados a sanear os activos tóxicos dos bancos privados, são uma má forma de os contribuintes transferirem dinheiro para bancos em apuros quando comparada com as normais injecções de capital. Todos os subsídios devem ser transparentes e os "bad banks" público/privados não o são.
• É vital colocar nos "bad banks" gestores profissionais e experientes que não estejam ligados a quaisquer escândalos. Neste caso, a experiência sueca é encorajadora. Foi mais simples do que esperávamos a tarefa de recrutar bons profissionais para o Securum, porque trabalhar em prol do interesse público neste projecto pioneiro de um "bad bank" estatal foi entendido como um desafio único.
• O princípio orientador deve ser a maximização dos interesses económicos dos contribuintes e não as considerações de ordem política ou ideológica. O público não deve ter dúvidas quanto a isto, pois a sua confiança é primordial.
JN