De volta!!!
Depois de casa arrombada, trancas à porta; depois da tempestade, a bonança; depois de um fim de semana alongado, semana de doidos... por isso mesmo esta tão tardia resposta.
tmms Escreveu:Ficou tudo claro agora. Efectivamente houve da sua parte uma interpretação completamente errada das minhas palavras fruto, admito-o, da pouca clareza das mesmas. O erro foi meu que assumi ser demasiado cedo para me alongar na nossa reflexão limitando-me a deixar uma porta entre-aberta que, originou, a má interpretação. Contudo, já ficou claro que é oportuno e até desejável aprofundar o tema. Espero eu, cujos argumentos que aqui defendo se alicerçam exclusivamente na minha visão pessoal e empírica do mundo, estar à altura de tal desafio. Pois, ou muito me engano, ou estamos perante “um profissional” (apologista) da Razão (e agora escrevi razão com letra maiúscula propositadamente).
Muito se engana. Não sou profissional no sentido em que não faço a apologia da Rãzão de forma a que não precise de fazer mais nada. Gostava, mas não tem sido possível, nem será expectável que venha a ser brevemente, porquanto a Razão está muito afastada da sociedade contra-natura do sec. XX.
Nem profissional, nem daqueles pseudo-profissionais. Caso contrário a esta altura do campeonato já lhe teria deixado uma dezena de links para um qualquer livro que tivesse escrito/editado. Nada disso, sou o que sou: um Homem que, a meio da vida (tarde em demasia lamentávelmente) conseguiu assumir que tudo o que havia aprendido, estudado e vivido o tinha sido fito com base num código contra-natura. Muitos passam por esta experiência mas poucos assumem, tão claramente como eu, que a vida não tem de ser como nos querem forçar a que seja; e ainda menos aqueles que decidem recomeçar.
Devo-lhe uma confissão: eu não interpretei erradamente as suas palavras. Calculei o que o Tiago quereria afirmar com elas e, apesar de estarmos globalmente de acordo, quis "provocar" a falência (ou expôr a falha) da sua admissão quanto aos limites da Razão e à dúvida. Se quiser, peguei numa picareta, e derrubei o muro onde o Tiago depois de o construir todo muito bem, deixou uma racha.
tmms Escreveu:Passo a explicar: Ao contrário da sua interpretação, eu considero essa dúvida legitima e até necessária como parte integrante do caminho (“O que classifiquei de perigoso foi o facto de o Tiago sancionar a existência dessa dúvida”). E, já agora, não considero que ter a humildade de a reconhecer enfraqueça de alguma forma a força dos meus argumentos, muito pelo contrário, pois a existência desta dúvida confere aos meus argumentos, precisamente, a força da razão (ao reconhecer os seus limites, como poderá ler a seguir). É óbvio que o sucesso é desejável e até uma virtude desde que, obviamente, seja fruto do mérito individual e vá sendo construído sobre sólidos e inquestionáveis valores éticos. Eu diria mesmo mais: o sucesso é, muito provavelmente, um dos elementos da via para a felicidade.
Eu diria mesmo: o sucesso é a UNICA via para a felicidade. Claro que os Homens não são todos iguais, nem na Razão, nem na capacidade, nem na ambição. Logo, cada um terá patamares de felicidade desejada bem diferentes. É o que leva os mais exigentes a chamar de "conformados" aqueles que não partilham de tão grandes ambições. Os conformados serão na verdade realizados tanto quanto a SUA felicidade esteja ou não alcançada. Os limites e objectivos de felicidade são diferentes para cada um, mas aquele que abdica de atingir a SUA felicidade é, invariavelmente IRRACIONAL.
A Razão jamais poderá ter limites. O seu contrário é a irracionalidade (não a emoção, o instinto ou a espiritualidade). Qualquer argumento racional destroi o irracional, logo seria uma contradição aceitar a existência do que se destroi.
tmms Escreveu:Partindo do pressuposto que admite debater esta questão publicamente, como é que a razão lida com Ele? No seu entender, Ele é a Razão? Como, racionalmente, lida com este assunto? Esta é a questão onde os limites se evidenciam em todo o seu esplendor.
Esta é a questão que encerra o processo de reaprendizagem que assumi após ter descoberto o erro para onde me deixei arrastar (e também a sociedade do sec.XX). Infelizmente não tenho ainda uma resposta sólida - se tivesse, o processo estaria concluido do ponto de vista do pensamento e teria de me limitar à acção - mas tenho alguns pontos de abordagem que fui construindo ao longo deste renascimento.
Abordei pessoalmente esta grande questão em 3 patamares: 1) o instinto; 2) a emoção e 3) a espiritualidade. A Razão exclui apenas a irracionalidade. Não exclui nenhum destes 3 patamares.
1) O instinto é até a própria Razão imediata. Uma reflexão/pensamento instântaneo - um reflexo. A sobrevivência é um bom exemplo de racionalidade.
2) Quanto à emoção, Manuel Damásio ajuda imenso a conciliar a Razão com a emoção. A falácia de que o coração comanda a emoção ou a inexistente mas propalada contradição entre o coração e a mente são facilmente desmontadas e expostas se percebermos que tudo o que o coração faz é a bombear sangue ao cérebro. É neste que as emoções têm lugar e onde tudo se passa.
3) Quanto à espiritualidade é mais complexo e é onde apenas encontro pontos de abordagem de possível exploração mas que ainda não enfrentei verdadeiramente. Existe uma dimensão espiritual no Homem que não nego. Apesar da Razão (e eu próprio) recusar o sobrenatural e o místicismo, não exclui necessária e totalmente a religiosidade, nem a partilha colectiva de crenças. Como se explica que as mais racionais pessoas devotem um fervoroso apoio a um qualquer clube de futebol? E porque é que uns preferem desporto e clubes, e outros dedicam essa mesma força devota a uma igreja ou comunidade? É no processo desta escolha (e não na execução do culto) que radica a Razão. Invariavelmente, o sentimento que leva os individuos a aderir a certas comunidades é racional, na medida em que se destina - ainda que inconscientemente - a promover uma sensação de bem estar com outros individuos. A interacção individual é necessária à sobrevivência e é um dado adquirido racionalmente.
Porque escolhemos um clube e não outro? Porque somos católicos e não budistas? Porque não somos religiosos, mas acabamos por ser fervorosos adeptos de uma filosofia de vida própria? Porque procuramos a felicidade? Porque falamos nós um com o outro? Poderiamos nós dois ter esta discussão um sem o outro? Seria possível crescer em pensamento sem pares? Seria possível crescer mentalmente sem competição? E será possível competir sem partilhar a realidade?
Porque nos deu Ele o livre-arbitrio, em vez de nos criar naturalmente e obrigatoriamente "bons"? Porque nos deu Ele esta vida na terra, uma vez que outra melhor está prometida?
Será Ele a Razão? Se o Homem é a Razão e Ele o criou à Sua imagem, valerá a pena fazer esta pergunta?
Eis uma frase que na resposta encerra todo o segredo do individualismo:
"Diz-me porque O escolheste, e saberei um pouco de ti e da tua Razão." tmms Escreveu:Sabendo que as decisões da esmagadora maioria da população têm por base uma forte componente emocional ou, no máximo, uma racionalidade de curto prazo (onde reina o interesse pessoal face ao bem maior), é evidente que o poder democraticamente instituído é uma mera representação dessa irracionalidade. E que a democracia, sendo o melhor sistema que o Homem conseguiu implantar até à data, nos confere apenas uma liberdade fortemente condicionada cujas barreiras são diariamente sentidas através da actividade castradora dos Estados. Falou em apresentar soluções. Gostaria de as ler.
O interesse pessoal é a Razão. Não há outro. O bem maior é o quê? É maior porquê? Com que critérios? Definido por quem? O unico bem maior que visualizo é a soma dos maiores interesses pessoais de cada individuo completamente realizados.
A democracia está longe de ser o melhor sistema implantado até a data. Já nos habituamos a considerar o capitalismo como um sistema económico, mas é falso. O Capitalismo é um sistema político e não económico. Esse sim, o melhor sistema já implantado pelo Homem.
Não sou democrata porque sou capitalista. Não resisto a uma pergunta: porque é que para ser considerado comunista não tem de se possuir nenhuma comuna, mas invariavelmente se pensa que um capitalista tem de ter capital? Porque é o que convém que pensemos, para não falar sobre o que é o capitalismo.
Eu sou capitalista, não por ter capital, mas porque acredito, advogo e defendo o capitalismo como sistema político.
Ao contrário dos pseudo-capitalistas, cujo capital advem dos benefícios que tiram da democracia, eu sei que o capitalismo morreu no inicio do séc.XX.
O (laissez-faire) capitalismo deu ao mundo grandes invenções, produto de homens livres e mentes livres, acontecimentos como a revolução industrial, prosperidade e paz.
O capitalismo pressupõe:
1. liberdades individuais.
2. propriedade privada.
3. O dinheiro como veículo de transmissão de riqueza (e não como riqueza em si mesmo) e sustentado em bens reais (como ouro e prata).
4. Que esse dinheiro sirva para guardar em valor, o produto do trabalho de cada individuo, para facilitar a troca deste pelo produto do trabalho de outros.
5. Que a troca desse valor seja feita em liberdade, por homens livres, de comum acordo, e para mutua satisfação.
O que temos:
1. autonomias regulamentadas.
2. usufruto condicionado.
3. O dinheiro como fonte de riqueza em si mesmo, sustentado na confiança nos governos que imprimem papel moeda e na força da lei que o força a ser aceite.
4. Dinheiro cujo valor está dependente da vontade e dos actos dos governos que o "encomendam" através da dívida pública, e da quantidade de notas "impressas" pelos bancos centrais que pagamos através duma inflacção sistémica.
5. Toda e qualquer troca, e até mesmo a liberdade de produzir estão fortemente regulamentadas e artificialmente condicionadas.
A democracia (um sistema organizacional de nomeação para cargos públicos e nada mais) só nos trouxe a liberdade (ainda assim condicionada por leis eleitorais restritivas) de escolher - de 4 em 4 anos - quem comanda a nossa vida e quem gere a comuna.
Qual é a diferença entre nacionalizar os meios de produção ou nacionalizar e deter o monopólio do único instrumento para troca de qualquer produção? Na verdade, todos nós vivemos num regime neo-comunista durante TODA a nossa vida e nem nos damos conta. É por isso que fazem o que querem: porque nem damos conta.
A
"liberdade fortemente condicionada cujas barreiras são diariamente sentidas através da actividade castradora dos Estados" não é liberdade mas apenas autonomia (que varia de estado para estado, de sector para sector). Tal e qual como a propriedade fortemente condicionada não é propriedade mas sim usofruto (que varia consoante o enquadramento legal).
tmms Escreveu:Antes de terminar, aproveito para deixar a minha opinião em termos gerais. No seguimento do que eu disse anteriormente “não acredito em grandes revoluções e em mudanças radicais. Penso que a mudança se faz todos os dias”. Penso que, pelo menos até a razão me apresentar argumento irrefutável em contrário:
Cada Homem pode e deve fundar, neste gigantesco Oceano de irracionalidade, a sua pequena ilha de racionalidade. Depois de fundar devida e solidamente a sua ilha estabelecer pontes de comunicação com outras ilhas (“... que eu julgo estar a chegar o momento em que a caminhada ao encontro da racionalidade do Homem entrará noutros domínios e jamais poderá ser continuada de uma forma exclusivamente individual”). Das muitas ligações entre muitas pequenas ilhas vão nascendo ilhas maiores. Um dia a racionalidade terá o seu próprio continente. Claro que isto é apenas a visão de um individuo muito paciente e com uma visão da vida de muito longo prazo.
Um abraço e muito obrigado por estar a proporcionar esta importante reflexão,
Tiago
edit: erro gramatical
"a caminhada ao encontro da racionalidade do Homem entrará noutros domínios e jamais poderá ser continuada de uma forma exclusivamente solitária" Com esta alteração, subscrevo inteiramente este paragrafo.
Sou fervoroso adepto da crença de Adam Smith de que o colectivo será sempre a soma dos vários individuos. Se assim não for, o sucesso de uns será sempre à custa de outros. Só assegurando que cada individuo busca permanentemente o seu interesse individual garantimos o interesse geral.
Alterando apenas aquela palavra, o paragrafo é um hino ao capitalismo.
E não me agradeça. É que mantive (e manterei) esta reflexão e debate apenas no meu próprio interesse (e o Tiago deverá fazer o mesmo). Não devemos nada um ao outro, e ambos ganhamos com a acção. É a essência do laissez-faire. Quando algum de nós deixar de tirar algum proveito desta discussão, a mesma deverá terminar imediatamente.
Um abraço, e perdão pela demora, pois a discussão merecia ter sido alimentada mais cedo. Não é um pedido de desculpas, mas um tributo de justiça ao tópico.