Publicado 26 Fevereiro 2009 14:26
Opinião
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Nouriel Roubini
É hora de nacionalizar os bancos insolventes
© Project Syndicate, 2008.
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Há um ano, previ que as perdas nas instituições financeiras norte-americanas atingiriam pelo menos um bilião de dólares e que poderiam mesmo ascender aos dois biliões de dólares.
Há um ano, previ que as perdas nas instituições financeiras norte-americanas atingiriam pelo menos um bilião de dólares e que poderiam mesmo ascender aos dois biliões de dólares. Nessa altura, o consenso entre os economistas e legisladores era de que estas estimativas eram exageradas, porque se acreditava que as perdas relacionadas com as hipotecas "subprime" (empréstimos de alto risco) totalizavam apenas cerca de 200 mil milhões de dólares.
Conforme salientei, com os Estados Unidos e a restante economia mundial a mergulharem numa grave recessão, as perdas na banca iriam bem além dos empréstimos hipotecários de alto risco e incluiriam também as hipotecas de risco médio e as de risco mínimo; a propriedade imobiliária comercial; os cartões de crédito, o crédito automóvel e os empréstimos a estudantes; os empréstimos industriais e comerciais; as obrigações "corporate"; as obrigações soberanas, bem como as obrigações estatais e das administrações locais; e as perdas de todos os activos que titularizaram esses empréstimos. Com efeito, desde então, as amortizações por parte dos bancos norte-americanos já superaram o marco do bilião de dólares (a minha estimativa mais baixa para as perdas) e instituições como o FMI e a Goldman Sachs prevêem agora perdas superiores a dois biliões de dólares.
Mas se pensa que o número dos dois biliões de dólares já é bastante elevado, as últimas estimativas feitas pela minha consultora de "research" RGE Monitor apontam para que as perdas totais com empréstimos concedidos pelas entidades financeiras norte-americanas e a queda do valor de mercado dos activos que elas detêm (tais como os valores mobiliários endossados a hipotecas) atinjam um valor astronómico de cerca de 3,6 biliões de dólares.
Os bancos norte-americanos e os corretores estão expostos a cerca de metade deste valor, ou seja, 1,8 biliões de dólares; o restante é suportado por outras instituições financeiras nos Estados Unidos e fora do território americano. O capital que financiava os activos da banca era de apenas 1,4 biliões de dólares no passado Outono, o que representava para o sistema bancário norte-americano um buraco de cerca de 400 milhões de dólares, ou perto de zero depois das operações de recapitalização desses bancos por parte do governo e do sector privado.
São necessários mais 1,5 biliões de dólares para que o capital dos bancos regresse ao nível anterior à crise com vista a solucionar a crise do crédito e restaurar a concessão de crédito ao sector privado. Assim, o conjunto do sistema bancário dos Estados Unidos está efectivamente insolvente, bem como uma grande parte do sistema bancário britânico e inúmeros bancos da Europa Continental.
Há quatro métodos para sanear o sistema bancário, que se confronta actualmente com uma crise sistémica: recapitalização dos bancos, de par com a compra dos seus activos tóxicos por um "bad bank" estatal; recapitalização, de par com garantias governamentais - depois de uma primeira perda por parte dos bancos - dos activos tóxicos; compra pelo sector privado de activos tóxicos, com uma garantia estatal (o actual plano do governo dos EUA); e nacionalização incondicional (ou "recuperação judicial pelo Estado" se não gostarem desse termo grosseiro) de bancos insolventes e sua revenda ao sector privado depois de terem sido saneados.
Dos quatro métodos, os primeiros três apresentam sérias deficiências. No modelo do "bad bank", o governo arrisca-se a pagar demasiado pelos activos tóxicos, cujo valor real é incerto. Mesmo no modelo que prevê uma garantia, pode estar implícito esse excessivo pagamento por parte do governo (ou um excesso de garantia cujo preço não se fixe adequadamente pelas comissões que o governo recebe).
No modelo do "bad bank", o governo tem o problema adicional de gerir todos os activos tóxicos que comprou - uma tarefa para a qual lhe falta preparação técnica. E a proposta tão trabalhosa do Departamento do Tesouro - que conjuga a eliminação dos activos tóxicos dos balanços dos bancos com a prestação de garantias governamentais - era tão pouco transparente e complicada que os mercados afundaram assim que foi anunciada.
Assim, a nacionalização pode ser, paradoxalmente, uma solução mais favorável para os mercados: eliminará os accionistas ordinários e preferenciais das instituições claramente insolventes e possivelmente os credores sem garantias se a insolvência for de larga escala, ao mesmo tempo que representará uma carga menor para os contribuintes. Pode também resolver o problema da gestão dos activos tóxicos dos bancos, através da revenda da maioria dos activos e depósitos - com garantia estatal - a novos accionistas privados depois de um saneamento dos activos tóxicos (como foi o caso da opção tomada na falência do banco Indy Mac).
A nacionalização também resolve o problema dos bancos de importância sistémica, isto é, dos bancos demasiado grandes para falirem, e que, por isso, precisam de ser resgatados pelo governo com um elevado custo para os contribuintes. Com efeito, o problema agravou-se, porque a actual abordagem levou os bancos débeis a comprarem bancos ainda mais débeis.
Fundir bancos "zombie" é como pedir a indivíduos alcoolizados que se ajudem mutuamente a manterem-se de pé. A compra do Bear Stearns e do WaMu pelo JPMorgan, a compra do Countrywide e do Merrill Lynch pelo Bank of America e a compra do Wachovia pelo Wells Fargo são um exemplo deste problema. Com a nacionalização, o governo pode fragmentar estas monstruosidades financeiras e vendê-las a investidores privados, como é o caso de bancos saudáveis de menor dimensão.
Ao passo que a Suécia adoptou esta abordagem de forma bem sucedida durante a crise da banca que viveu em inícios da década de 90, a actual abordagem dos Estados Unidos e do Reino Unido poderá acabar por resultar em bancos "zombie" ao estilo japonês - que nunca são adequadamente reestruturados e que eternizam o congelamento do crédito. O Japão sofreu uma quase depressão durante uma década devido à sua incapacidade para sanear os seus bancos. Os Estados Unidos, o Reino Unido e outras economias correm o risco de obter um resultado semelhante - uma recessão e deflação de preços durante vários anos - se não souberem actuar de forma adequada