
Enviado:
18/12/2008 18:15
por Panizzi
Acho que em certa medida uma tomada de posição dessas pode fazer com que a decisão de um Governo desapareca no contexto global sem gerar o impacto esperado.
Por exemplo , incentivando o consumo ao mesmo tempo que se incentiva a oferta , estamos claramente a fomentar importações e a beneficiar países essencialmente exportadores.
Acho que uma decisão de um Governo tendo como base única e exclusivamente a despesa pública , não faz sentido. É preciso algo mais , principalmente por parte dos países importadores como o nosso.
A ser aplicada uma política keynesiana , devia ser aplicada como uma política continua que permita manter uma economia estável e equilibrada , não aplicando como forma de recurso ou emergência ... não foi para isso que Keynes trabalhou.
Posto isto , será que vale a pena falar de Keynes aqui ?
:::Revisitar Keynes: os pacotes de estímulo económico

Enviado:
17/12/2008 0:40
por nnfranco
Newsletter Bank 7 de 16 de Dezembro
Depois de no início de Dezembro ter estado em evidência a política monetária, através de cortes sem precedentes nas taxas de juro, as atenções desviaram-se na passada semana para a outra grande “arma” das autoridades públicas no estímulo da economia: a política orçamental.
Na cimeira da União Europeia em Bruxelas, foi anunciado um pacote de 200 mil milhões de euros de apoio ao crescimento económico (cuja implementação em Portugal é também já conhecida). Foi igualmente ampliada a previsão sobre o valor do pacote fiscal norte-americano (que deverá ser a primeira medida do mandato de Obama). Também o Japão e a China anunciaram recentemente importantes medidas de estímulo orçamental.
Se hoje em dia o papel do Estado como dinamizador da recuperação económica é quase consensual (ainda que o grau e natureza da intervenção divida economistas e políticos), nem sempre assim foi. Esta semana recordamos o contexto histórico da intervenção do Estado na economia, e veremos quais os sectores que mais poderão beneficiar com o investimento estatal sem precedentes previsto para os próximos meses.
A mão invisível
O debate sobre os mecanismos de mercado na evolução da economia é antigo. Durante muito tempo, os economistas acreditaram que o mercado se regula a si próprio, não sendo necessária a intervenção do Estado para assegurar o equilíbrio económico.
Logo em 1776, na obra de referência «A Riqueza das Nações», o pioneiro economista e filósofo escocês Adam Smith procurou demonstrar que, num mercado livre, a maximização do lucro individual tende também a maximizar o bem-estar da comunidade, através de um princípio que denominou de “mão invisível”, utilizando o exemplo do comércio externo.
Em 1803, o economista francês Jean-Baptiste Say formulou a Lei dos Mercados (ou Lei de Say), segundo a qual a oferta cria a sua própria procura, evidenciando uma vez mais os mecanismos automáticos que existem para garantir o equilíbrio na economia.
Ainda que a existência de ciclos económicos tenha sido identificada na 2ª metade do Século XIX, a política económica tendia a basear-se na teoria dominante do «laisser faire» (pouca intervenção estatal) e, com excepção de períodos de guerra, os Governos procuravam manter orçamentos equilibrados.
A Grande Depressão dos anos 30
A maior crise económica do Século XX (entre 1930 e 1933, a economia norte-americana “encolheu” 27% em termos reais e o desemprego chegou aos 25%) é geralmente atribuída a erros de política económica:
• A política monetária foi demasiado restritiva: quando a libra abandonou o Padrão Ouro em Setembro de 1931, a Reserva Federal (Fed) aumentou a taxa de juro de 1,5% para 3,5% para proteger o dólar;
• Os sucessivos Governos procuraram assegurar o equilíbrio orçamental: os impostos foram aumentados em Junho de 1932 e em 1933 (já com o Presidente Roosevelt) o orçamento federal foi reduzido em 500 milhões de dólares; mesmo as medidas de estímulo económico que ficaram conhecidas como “New Deal” não aumentaram de forma substancial a despesa pública;
• Foi permitida até 1933 a falência de milhares de bancos, com base na teoria de que se devia deixar o mercado funcionar e “expurgar os excessos”.
Apesar da Grande Depressão ter originado um aumento da intervenção do Estado na economia, tal não foi acompanhado por uma significativa subida da despesa pública. Foi mais marcante a criação de entidades que ainda existem hoje, como a Federal Deposit Insurance Company (Fundo de Garantia de Depósitos), a Segurança Social (financiada por contribuições de empregados e empregadores, e não pelo Orçamento de Estado) ou a Securities and Exchange Comission (SEC), o supervisor do mercado de capitais (equivalente à nossa CMVM).
Apenas durante a 2ª Guerra Mundial a despesa pública aumentou de forma significativa.
Keynes e a despesa pública
John Maynard Keynes, considerado por muitos o mais influente economista do Século XX, foi recebido em 1934 pelo Presidente Roosevelt na Casa Branca e procurou demonstrar que a recuperação económica seria facilitada pelo aumento da despesa pública, tendo contudo encontrado pouca receptividade às suas propostas.
A ideia de que o Estado poderia contribuir para suavizar os ciclos económicos através da despesa pública não era, em si mesma, inovadora: o relatório britânico de 1909 «Minority Report of the Poor Law Commision» recomendava despesas em trabalhos públicos sempre que o desemprego atingisse os 4% da força de trabalho.
A principal contribuição de Keynes, expressa no seu livro «A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda» (publicado em Fevereiro de 1936), foi dar a esta ideia um enquadramento conceptual e analítico que podia ser medido e testado. Segundo o historiador Mark Blaug*, «se existe algo de completamente novo em Keynes, é este deliberado assalto à fé depositada nas capacidades de recuperação inerentes ao mecanismo de mercado».
Os economistas clássicos defendiam que é possível atingir o pleno emprego através do ajustamento dos salários: quando a economia entra em recessão, os salários podem ser reduzidos por forma a manter uma situação de equilíbrio. Keynes procurou demonstrar que o nível de emprego resulta antes da procura agregada, podendo uma economia funcionar abaixo do seu potencial durante longos períodos de tempo. Ou seja, o desemprego pode ser uma condição durável e persistente de uma economia capitalista, não existindo nenhum mecanismo automático que garanta a recuperação económica e níveis de pleno emprego.
Daí que Keynes defendesse uma política orçamental contra-cíclica: em momentos de recessão e desemprego elevado, deverá ser aumentada a despesa pública e reduzidos os impostos, por forma a aumentar a procura agregada na economia e aproximar o produto do seu potencial. Esta actuação deve ser complementada com um estímulo por via monetária, nomeadamente pela redução de taxas de juro. Os défices acumulados deverão ser pagos durante a fase subsequente de expansão da economia, durante a qual poderá ser necessária uma política oposta: aumento de impostos e redução da despesa pública.
Keynes defendia igualmente que a política orçamental deve ser dirigida em especial aos indivíduos com menores rendimentos, uma vez que é mais provável que estes aumentem de imediato o consumo, em vez da incrementarem a poupança.
A seguir à 2ª Guerra Mundial, as políticas económicas de inspiração keynesiana, conjugadas com a defesa dos mecanismos de mercado, foram adoptadas com sucesso na generalidade dos países desenvolvidos, contribuindo para o período de prosperidade vivido até aos anos 70.
No entanto, o colapso do sistema de Bretton Woods e o choque petrolífero dos anos 70 vieram pôr em causa a aceitação de políticas de cariz keynesiano, na medida em que se tornou impossível, com as ferramentas tradicionais, combater em simultâneo o aumento do desemprego e da inflação.
O monetarismo
A quebra de popularidade de Keynes deu lugar à crescente aceitação da teoria monetarista, cujo expoente máximo é o Prémio Nobel Milton Friedman, que defende que a intervenção do Estado na economia se deve centrar na política monetária do Banco Central, controlando o nível de inflação através da determinação de um nível de oferta de moeda que garanta um equilíbrio com a sua procura.
Os monetaristas defendem a teoria clássica de que as economias de mercado são inerentemente estáveis, na ausência de flutuações inesperadas na oferta de moeda. O estímulo da procura por via orçamental (despesa pública) tenderá a ser prejudicial, uma vez que provoca um aumento das taxas de juro, desincentivando o investimento privado (fenómeno conhecido por crowding out). Ou seja, a despesa pública não aumenta a procura, limitando-se a aumentar o peso do consumo e diminuir o do investimento.
Os monetaristas entendem que a Grande Depressão foi causada por uma contracção massiva da oferta de moeda (e não pela falta de investimento argumentada por Keynes) e a inflação do pós-guerra por um excesso na oferta de moeda.
A corrente monetarista foi predominante desde o início dos anos 80, desde logo com a nomeação de Paul Volcker como Presidente da Fed, o qual conseguiu reduzir a inflação de 13,5% para 3,2% em apenas 2 anos, limitando o crescimento da massa monetária.
O regresso de Keynes
A dimensão da actual recessão económica está a obrigar os Governos de todo o mundo a conciliar uma perspectiva monetarista (reduzindo agressivamente as taxas de juro, entre outras medidas, para aumentar a oferta de moeda) com uma perspectiva keynesiana (anunciando pacotes de estímulo económico num valor sem precedentes).
1. União Europeia
Na cimeira realizada em Bruxelas nos passados dias 11 e 12 de Dezembro, os líderes da União Europeia acordaram num pacote de estímulo orçamental no valor de 200 mil milhões de euros (cerca de 1,5% do PIB), deixando liberdade a cada país quanto forma de implementação, aumentando o investimento público e/ou optando por reduzir a carga fiscal dos contribuintes. As medidas de apoio à procura “devem ter efeito imediato, ter um limite temporal e centrar-se nos sectores mais afectados e mais importantes para a estrutura da economia”.
O apoio proposto torna necessária a flexibilização do Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC), que limita o défice público a 3% do Produto Interno Bruto (PIB).
O governo português já anunciou de que forma este pacote vai ser implementado no nosso país: através de 29 medidas para incentivar o emprego e o investimento, no valor de 2.180 milhões de euros (1,25% do PIB), o qual implicará o aumento do défice orçamental de 2,2% para 3%. Este pacote está assente em 3 pilares:
• Reforço do investimento público (800 milhões) – modernização das escolas, energia sustentável (painéis solares, rede de transporte de electricidade, eficiência energética dos edifícios) e modernização da infra-estrutura tecnológica (redes de banda larga de nova geração);
• Apoio às empresas e actividade económica (800 milhões) – linha de crédito para as Pequenas e Médias Empresas (PME), medidas fiscais (IVA e Pagamento Especial por Conta), fundo de reestruturação industrial, linha de seguros de crédito à exportação e apoio à promoção externa;
• Apoio ao emprego e reforço da protecção social (580 milhões) – redução de contribuições para a Segurança Social, criação de estágios profissionais, linhas de crédito bonificadas, cursos de formação, prolongamento do subsídio desemprego.
Em simultâneo, os líderes europeus anunciaram a implementação do chamado plano 20-20-20, relacionado com as alterações climáticas. O objectivo é reduzir em pelo menos 20% as emissões de gases causadores do efeito de estufa (face aos níveis de 1990), aumentar a utilização de energias renováveis de 8,5% para 20% até 2020 e aumentar em 20% a eficiência energética. A redução de emissões poderá chegar aos 30%, se existir um acordo global numa importante conferência das Nações Unidas que irá ter lugar em Copenhaga no final de 2009.
2. Japão
Também na passada 6ª feira, o primeiro-ministro japonês anunciou um plano para criar novos empregos, aumentar o crédito e ajudar os desempregados. O pacote tem um valor de 23 triliões de ienes (cerca de 188 mil milhões de euros), equivalente a 4,6% do PIB. 10 triliões de ienes serão canalizados para investimento público e 13 triliões para estabilizar o sistema financeiro e aumentar concessão crédito (em especial às PME).
3. EUA
O Presidente-eleito Barrack Obama anunciou que está a ser preparado um pacote de estímulo económico “sem precedentes” nos EUA, mas o seu valor e condições definitivas estão ainda a ser alvo de discussão com alguns dos principais economistas norte-americanos. Estima-se que possa atingir 750 mil milhões de dólares (550 mil milhões de euros), cerca de 5% do PIB norte-americano, podendo mesmo chegar a 1 trilião de dólares, segundo notícia do Wall Street Journal. Deverá ser aprovado pelo Congresso no início de 2009, prevendo-se que seja a primeira prioridade do novo Presidente depois de tomar posse no dia 20 de Janeiro.
A ênfase será em medidas que possam ser implementadas imediatamente, por forma a criar ou salvar 2,5 milhões de postos de trabalho nos próximos 2 anos. De acordo com a agenda apresentada na campanha eleitoral, deverão ser privilegiados:
• Projectos de infra-estruturas (estradas, pontes, esgotos, escolas, transportes públicos, redes de internet de banda larga). Os 50 Estados têm 136 mil milhões de dólares de projectos “prontos a arrancar”, logo que exista financiamento;
• Eficiência energética dos edifícios e energias renováveis: criação de 5 milhões de empregos “verdes”, nos próximos 10 anos. Salienta-se a nomeação para Secretário da Energia de Steven Chu, Prémio Nobel da Física, o qual deverá dar um contributo importante para os projectos previstos;
• Redução de impostos, em especial para as classes mais desfavorecidas;
• Mais benefícios sociais para desempregados e formação profissional.
4. China
No passado dia 10 de Novembro, a China havia já anunciado um ambicioso pacote de 4 triliões de yuan (cerca de 430 mil milhões de euros), com o objectivo de criar 10 milhões de novos empregos. Prevê-se o investimento em infra-estruturas, habitação social, serviços médicos, educação e controlo de poluição. Foram ainda anunciados estímulos fiscais para o investimento em equipamentos e o aumento de subsídios.
Prevê-se que a China tenha um crescimento de 7% em 2009, ritmo que faz inveja aos países ocidentais, mas que será o mais baixo em quase 2 décadas. Desde Setembro que está igualmente a ser implementada uma política monetária expansionista, tendo a taxa de juro de referência sido reduzida por 4 vezes, em 1,89%.
Quais são os riscos?
Estima-se que as medidas de apoio já anunciadas pelos Governos atinjam 6 triliões de dólares (cerca de 10% do PIB mundial), entre as garantias concedidas, a recapitalização bancos e os estímulos orçamentais.
Os défices orçamentais deverão crescer para níveis sem precedentes, em especial nos EUA (onde o défice poderá atingir 8% do PIB), o que obrigará a uma emissão massiva de dívida pública.
Segundo uma estimativa da Société Générale, os EUA deverão emitir 1,6 triliões de dólares de dívida pública em 2009, 5 vezes mais que em 2008. As Treasuries são ainda vistas como o investimento mais seguro do mundo, o que tem levado os Bancos Centrais de todo o mundo a aumentar as suas aquisições destes títulos nos últimos meses, ao ritmo mais rápido desde 1988, de acordo com a Fed, mesmo que a taxa de juro oferecida tenha atingido recentemente o nível zero, para maturidades curtas.
Algumas preocupações permanecem sobre a sustentabilidade deste processo:
• uma parte significativa dos compradores tendem a ser Bancos Centrais asiáticos, mas a procura por activos denominados em dólares tende a diminuir e o crescimento das reservas a desacelerar fortemente;
• a curto prazo, a emissão de dívida pública pode desviar investimento da dívida privada, afectando a capacidade de endividamento das empresas;
• a médio prazo, o aumento da dívida pública tende a originar o aumento das taxas de juro, reduzindo o investimento privado (crowding out), de acordo com alguns economistas.
Em conclusão ...
A primeira recessão desde a 2ª Guerra Mundial que atinge em simultâneo todas as principais economias mundiais exige medidas coordenadas e sem precedentes na vertente monetária e orçamental, aproveitando os contributos de duas das principais correntes económicas do Século XX.
Gerir a duração e intensidade das medidas de estímulo é agora a principal questão: uma intervenção moderada pode não ser suficiente para dinamizar a economia; um excesso de intervenção pode também ser contraproducente, gerando grandes pressões inflacionistas e um aumento significativo das taxas de juro a médio prazo. A atenção estará centrada na próxima reunião do G-20 (a primeira com Obama), que terá lugar no dia 2 de Abril em Londres.
Acima de tudo, é fundamental aprender com os erros do passado. Quando a confiança dos particulares e das empresas desaparece, parece cada vez mais consensual que as autoridades públicas (Banco Central e Governo) devem actuar como credores, consumidores, investidores e empregadores de último recurso. Keynes está de volta!
*Mark Blaug, «Economic Theory in Retrospect» (1985), Cambridge University Press
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