Off Topic - A gestão norte-americana da terra queimada
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Off Topic - A gestão norte-americana da terra queimada
O título podia ser também, segundo a minha opinião, "Capitalismo Selvagem".
Realço o ponto em que o autor refere o CEO heroico, que é algo que por acaso vai ao encontro de alguns pensamentos meus, que é de que muitas empresas, a pensar sistematicamente no valor para o accionista, tendem a ter muitas vezes um quadro de directores, e o resto "empregados de snack", sem querer ser ofensivo para ninguém, mas referindo-me à retirada de autonomia aos quadros intermédios.
in Jornal de Negócios
por Henry Mintzberg
http://www.jornaldenegocios.pt/index.ph ... &id=328326
Os sinais da perigosa condição da economia norte-americana estão por todo o lado - desde os colossais défices orçamental e da balança de pagamentos à queda dos preços das casas e à debilidade do dólar.
Mas há algo que não consta nos indicadores económicos e que pode estar a impulsioná-los: a deterioração da gestão norte-americana, que está a minar não só muitas grandes empresas dos EUA, mas também o seu lendário espírito empreendedor.
Paradoxalmente, um indicador que tem vindo a melhorar de forma constante nos Estados Unidos - a produtividade - poderá ser o sinal mais evidente do problema.
Em matéria de produtividade, os gestores tanto investem na formação dos trabalhadores e em processos de fabrico mais eficientes e afins, como tomam medidas que parecem impulsionar a produtividade no curto prazo mas que a destroem no longo prazo.
A produtividade mede a produção por cada hora de trabalho. Assim, uma empresa que despede todos os seus trabalhadores e depois entrega mercadoria do seu "stock", pode parecer muito produtiva - até ficar sem inventário.
É evidente que nenhuma empresa pode fazer isso, mas muitas companhias norte-americanas têm vindo a demitir muitos trabalhadores e gestores de níveis intermédios - os números de Janeiro de 2008 apresentam um aumento de 19% face ao mesmo mês de 2007.
Enquanto isso, os trabalhadores que se mantêm na empresa têm de trabalhar muito mais arduamente, muitas vezes sem um aumento salarial. Os salários dos trabalhadores, ajustados à inflação, diminuíram em 2007, perpetuando uma tendência que tem vindo a verificar-se ao longo de toda esta década.
Isso também é "produtivo" - até esses trabalhadores sobrecarregados se irem embora ou terem um esgotamento.
Uma empresa sustentável não é um conjunto de "recursos humanos". É uma comunidade de seres humanos. A sua força reside nos seus colaboradores, na sua cultura e no nome comercial que construiu entre os seus clientes e fornecedores.
Assim, os trabalhadores e gestores de níveis intermédios que se foram embora dessas empresas, levaram consigo não só bastante informação crítica, como muitas vezes também os corações e almas das suas empresas, o que tem efeitos profundos na competitividade norte-americana.
Consideremos a alta tecnologia, domínio em que é suposto os Estados Unidos sobressaírem.
Segundo um relatório de Novembro de 2006 elaborado pela The Task Force on the Future of American Innovation (Grupo de Estudo sobre o Futuro da Inovação norte-americana), composto por investigadores de grandes universidades, grupos de peritos, associações comerciais e industriais e empresas, o défice comercial no domínio da alta tecnologia deteriorou-se em 2005, pelo terceiro ano consecutivo.
Não estamos a falar de vestuário ou automóveis, mas sim do maior e mais reconhecido sector de exportação dos Estados Unidos.
Este défice reflecte um défice de investigação subjacente. Das 25 empresas que obtiveram mais patentes nos EUA em 2006, apenas oito eram norte-americanas; 12 eram japonesas.
Talvez isto ajude a explicar por que razão, num inquérito a mais de 60 mil pessoas em 29 países, realizado em 2007 pelo Reputation Institute, sediado em Nova Iorque, para classificar as "empresas mais respeitadas do mundo", a primeira empresa norte-americana da lista surgia em 15º lugar: a segunda ocupava a 25ª posição.
Ninguém consegue determinar em que medida os ganhos de produtividade nos Estados Unidos nos últimos anos provêm da asfixia do capital humano, porque esse factor não é mensurável.
Mas, claramente, houve um forte recurso a essa estratégia: as empresas despedem trabalhadores porque têm de o fazer, mas muitas vezes também por não irem ao encontro das expectativas financeiras dos analistas de Wall Street.
O crescente foco dos gestores na maximização do valor accionista ganhou muitos adeptos quando a ideia foi introduzida na década de 80: a disciplina impessoal dos mercados financeiros forçou as empresas a tornarem-se mais produtivas e inovadoras.
E, de facto, grande parte do aumento de produtividade nos Estados Unidos nas décadas de 80 e de 90 pode ser atribuído a um investimento em larga escala em tecnologia de informação e comunicações.
Contudo, quando os ganhos marginais de produtividade derivados desse investimento começaram a diminuir, a sobrevivência e remuneração dos gestores de topo continuou a estar ligada ao desempenho dos títulos no mercado accionista.
Consequentemente, muitos simplesmente aprenderam a gerir o valor de curto prazo dos títulos das suas empresas, em detrimento da atenção que deveriam dar aos seus produtos e clientes.
Além disso, como a maximização do valor accionista é um fraco incentivo para os trabalhadores e para os gestores de níveis intermédios, os conselhos de administração das empresas começaram cada vez mais a centralizar o poder em torno dos presidentes executivos, alentando assim uma forma "heróica" de liderança, desconexa do resto da empresa. Com efeito, em muitos casos, o CEO - frequentemente uma "estrela" apoiada por Wall Street que aterrou para "sacudir as coisas" - agora é a empresa, mesmo que não saiba muito sobre os seus produtos, clientes e concorrentes.
Esta viragem para um tipo de liderança "heróica" pode ser observada na remuneração sobredimensionada dos CEO. Segundo um relatório de Janeiro de 2008 do Hay Group, os presidentes executivos das 50 maiores empresas norte-americanas ganham quase três vezes mais do que os seus homólogos europeus - o que corresponde a centenas de vezes mais do que os seus próprios trabalhadores.
Até há pouco tempo, a bolha dos preços dos activos nos Estados Unidos - primeiro no mercado accionista e depois no mercado imobiliário - dissimulou a depreciação subjacente das empresas norte-americanas.
Mas a própria bolha resultou das mesmas patologias ao nível da gestão que afligiam a economia real. Acima de tudo, a gestão a curto prazo encorajou as entidades de concessão de empréstimos hipotecários a oferecerem taxas de juro "tentadoras" artificialmente baixas para atraírem potenciais compradores de casas.
E depois aqueles que compraram essas hipotecas nunca se preocuparam em investigar o seu valor subjacente - o que foi abdicar fortemente da responsabilidade ao nível da gestão.
Agora que a bolha estoirou, a actual desaceleração económica dos Estados Unidos será provavelmente muito pior do que as anteriores, pois as empresas norte-americanas terão de ser reconstruídas, lenta e cuidadosamente.
O forte enfraquecimento do dólar poderá ajudar os Estados Unidos a estreitarem o seu enorme défice comercial, mas não devemos esperar que se registe uma melhoria duradoura sem mudanças drásticas ao nível da gestão nos EUA.
Felizmente, talvez seja possível minimizar as repercussões para o resto do mundo. Se bem que os economistas, políticos e líderes empresariais norte-americanos tenham tentado durante anos exportar o seu modelo de gestão, muitas empresas não o compraram.
Assim, muitas outras economias-chave estão de melhor saúde do que a norte-americana. Para que não haja confusões: este problema nasceu nos Estados Unidos e é lá que tem de ser resolvido.
Realço o ponto em que o autor refere o CEO heroico, que é algo que por acaso vai ao encontro de alguns pensamentos meus, que é de que muitas empresas, a pensar sistematicamente no valor para o accionista, tendem a ter muitas vezes um quadro de directores, e o resto "empregados de snack", sem querer ser ofensivo para ninguém, mas referindo-me à retirada de autonomia aos quadros intermédios.
in Jornal de Negócios
por Henry Mintzberg
http://www.jornaldenegocios.pt/index.ph ... &id=328326
Os sinais da perigosa condição da economia norte-americana estão por todo o lado - desde os colossais défices orçamental e da balança de pagamentos à queda dos preços das casas e à debilidade do dólar.
Mas há algo que não consta nos indicadores económicos e que pode estar a impulsioná-los: a deterioração da gestão norte-americana, que está a minar não só muitas grandes empresas dos EUA, mas também o seu lendário espírito empreendedor.
Paradoxalmente, um indicador que tem vindo a melhorar de forma constante nos Estados Unidos - a produtividade - poderá ser o sinal mais evidente do problema.
Em matéria de produtividade, os gestores tanto investem na formação dos trabalhadores e em processos de fabrico mais eficientes e afins, como tomam medidas que parecem impulsionar a produtividade no curto prazo mas que a destroem no longo prazo.
A produtividade mede a produção por cada hora de trabalho. Assim, uma empresa que despede todos os seus trabalhadores e depois entrega mercadoria do seu "stock", pode parecer muito produtiva - até ficar sem inventário.
É evidente que nenhuma empresa pode fazer isso, mas muitas companhias norte-americanas têm vindo a demitir muitos trabalhadores e gestores de níveis intermédios - os números de Janeiro de 2008 apresentam um aumento de 19% face ao mesmo mês de 2007.
Enquanto isso, os trabalhadores que se mantêm na empresa têm de trabalhar muito mais arduamente, muitas vezes sem um aumento salarial. Os salários dos trabalhadores, ajustados à inflação, diminuíram em 2007, perpetuando uma tendência que tem vindo a verificar-se ao longo de toda esta década.
Isso também é "produtivo" - até esses trabalhadores sobrecarregados se irem embora ou terem um esgotamento.
Uma empresa sustentável não é um conjunto de "recursos humanos". É uma comunidade de seres humanos. A sua força reside nos seus colaboradores, na sua cultura e no nome comercial que construiu entre os seus clientes e fornecedores.
Assim, os trabalhadores e gestores de níveis intermédios que se foram embora dessas empresas, levaram consigo não só bastante informação crítica, como muitas vezes também os corações e almas das suas empresas, o que tem efeitos profundos na competitividade norte-americana.
Consideremos a alta tecnologia, domínio em que é suposto os Estados Unidos sobressaírem.
Segundo um relatório de Novembro de 2006 elaborado pela The Task Force on the Future of American Innovation (Grupo de Estudo sobre o Futuro da Inovação norte-americana), composto por investigadores de grandes universidades, grupos de peritos, associações comerciais e industriais e empresas, o défice comercial no domínio da alta tecnologia deteriorou-se em 2005, pelo terceiro ano consecutivo.
Não estamos a falar de vestuário ou automóveis, mas sim do maior e mais reconhecido sector de exportação dos Estados Unidos.
Este défice reflecte um défice de investigação subjacente. Das 25 empresas que obtiveram mais patentes nos EUA em 2006, apenas oito eram norte-americanas; 12 eram japonesas.
Talvez isto ajude a explicar por que razão, num inquérito a mais de 60 mil pessoas em 29 países, realizado em 2007 pelo Reputation Institute, sediado em Nova Iorque, para classificar as "empresas mais respeitadas do mundo", a primeira empresa norte-americana da lista surgia em 15º lugar: a segunda ocupava a 25ª posição.
Ninguém consegue determinar em que medida os ganhos de produtividade nos Estados Unidos nos últimos anos provêm da asfixia do capital humano, porque esse factor não é mensurável.
Mas, claramente, houve um forte recurso a essa estratégia: as empresas despedem trabalhadores porque têm de o fazer, mas muitas vezes também por não irem ao encontro das expectativas financeiras dos analistas de Wall Street.
O crescente foco dos gestores na maximização do valor accionista ganhou muitos adeptos quando a ideia foi introduzida na década de 80: a disciplina impessoal dos mercados financeiros forçou as empresas a tornarem-se mais produtivas e inovadoras.
E, de facto, grande parte do aumento de produtividade nos Estados Unidos nas décadas de 80 e de 90 pode ser atribuído a um investimento em larga escala em tecnologia de informação e comunicações.
Contudo, quando os ganhos marginais de produtividade derivados desse investimento começaram a diminuir, a sobrevivência e remuneração dos gestores de topo continuou a estar ligada ao desempenho dos títulos no mercado accionista.
Consequentemente, muitos simplesmente aprenderam a gerir o valor de curto prazo dos títulos das suas empresas, em detrimento da atenção que deveriam dar aos seus produtos e clientes.
Além disso, como a maximização do valor accionista é um fraco incentivo para os trabalhadores e para os gestores de níveis intermédios, os conselhos de administração das empresas começaram cada vez mais a centralizar o poder em torno dos presidentes executivos, alentando assim uma forma "heróica" de liderança, desconexa do resto da empresa. Com efeito, em muitos casos, o CEO - frequentemente uma "estrela" apoiada por Wall Street que aterrou para "sacudir as coisas" - agora é a empresa, mesmo que não saiba muito sobre os seus produtos, clientes e concorrentes.
Esta viragem para um tipo de liderança "heróica" pode ser observada na remuneração sobredimensionada dos CEO. Segundo um relatório de Janeiro de 2008 do Hay Group, os presidentes executivos das 50 maiores empresas norte-americanas ganham quase três vezes mais do que os seus homólogos europeus - o que corresponde a centenas de vezes mais do que os seus próprios trabalhadores.
Até há pouco tempo, a bolha dos preços dos activos nos Estados Unidos - primeiro no mercado accionista e depois no mercado imobiliário - dissimulou a depreciação subjacente das empresas norte-americanas.
Mas a própria bolha resultou das mesmas patologias ao nível da gestão que afligiam a economia real. Acima de tudo, a gestão a curto prazo encorajou as entidades de concessão de empréstimos hipotecários a oferecerem taxas de juro "tentadoras" artificialmente baixas para atraírem potenciais compradores de casas.
E depois aqueles que compraram essas hipotecas nunca se preocuparam em investigar o seu valor subjacente - o que foi abdicar fortemente da responsabilidade ao nível da gestão.
Agora que a bolha estoirou, a actual desaceleração económica dos Estados Unidos será provavelmente muito pior do que as anteriores, pois as empresas norte-americanas terão de ser reconstruídas, lenta e cuidadosamente.
O forte enfraquecimento do dólar poderá ajudar os Estados Unidos a estreitarem o seu enorme défice comercial, mas não devemos esperar que se registe uma melhoria duradoura sem mudanças drásticas ao nível da gestão nos EUA.
Felizmente, talvez seja possível minimizar as repercussões para o resto do mundo. Se bem que os economistas, políticos e líderes empresariais norte-americanos tenham tentado durante anos exportar o seu modelo de gestão, muitas empresas não o compraram.
Assim, muitas outras economias-chave estão de melhor saúde do que a norte-americana. Para que não haja confusões: este problema nasceu nos Estados Unidos e é lá que tem de ser resolvido.
O que é um cínico? É aquele que sabe o preço de tudo, mas que não sabe o valor de nada.
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