Transparência
A Direcção
O Diário Económico escreveu, na edição especial sobre o Orçamento do Estado para 2006, que aumentos salariais para os funcionários públicos superiores a 2% poderiam agravar o défice previsto, que é de 4,8% do PIB.
E para sustentar estas dúvidas, o DE cruzou os valores das despesas total que constam do relatório do orçamento e os que constam dos mapas do mesmo documento. Logo aí, verificou-se que as cativações definidas à cabeça nas diversas rubricas orçamentais não estavam contabilizadas no valor de défice, o que significa, na prática, que já são cortes efectivos. Um dos exemplos diz respeito aos 7,5% de cativação das despesas de investimento. No mesmo cruzamento de informação, tudo indicava que também a chamada dotação provisional do Ministério das Finanças - que serve, especialmente, para garantir os aumentos salariais - não constava do valor de despesa tido em conta no apuramento do défice público. Face a estas dúvidas, o DE tentou obter esclarecimentos junto do Ministério das Finanças, como é de resto a sua obrigação, mas tal não foi possível.
Ontem, na entrevista ao jornal Público, quando confrontado pelos jornalistas sobre as dúvidas suscitadas pelo DE, o ministro das Finanças não prestou qualquer esclarecimento, limitando-se a afirmar que “as contas deles [DE] não são válidas. Estão erradas”. E, nos últimos dois dias, não se cansou de dizer que o Orçamento de 2006 não tem truques.
Face a estas declarações, que põem em causa a credibilidade do DE e o rigor, seriedade e empenho que, todos os dias, os jornalistas do DE põem na produção deste jornal, importa esclarecer o seguinte:
1º O DE tem razão. O Orçamento tem truques.
2º Na edição de hoje, o DE chega à conclusão - sem dúvidas - que parte da dotação provisional destinada a aumentos salariais, no valor de 424,5 milhões de euros, já está contabilizada nas despesas com pessoal e, mais concretamente, nas remunerações certas e permanentes. Isto quer dizer que aquela rubrica está artificialmente inflacionada e, sem esses valores, o Governo admite gastar menos em salários da Função Pública em 2006 do que gastou em 2005. E este é o ponto.
Não está em causa o eventual aumento de 2% da Função Pública. O que está em causa é que esse aumento não é possível mantendo inalterados os salários pagos em 2005. Ou seja, para que os aumentos vão além de 1% será necessário cortar na folha de salários. E isso não se faz pagando menos. Faz-se através de soluções de gestão que permitam escoar funcionários públicos para fora da máquina - já que a Constituição podem permite que estes sejam despedidos. E isso, em Portugal, significa colocar o célebre quadro de supranumerários ao serviço das necessidades do país.
Dito de outra forma: para que os funcionários públicos sejam aumentados acima de 1% (e não se duvida aqui que serão) será preciso reduzir o número de funcionários públicos.
É só isto - o que não é pouco - que o DE considera que precisa de ser esclarecido. Sobretudo quando o ministro das Finanças afirma, no dia da apresentação do OE, que este é um Orçamento sem truques.
Tem um truque: não assume que o rigor das contas apresentado pressupõe um número menos de funcionários públicos.
E que não sobrem dúvidas: o DE é o primeiro a acreditar que o problema das finanças públicas portuguesa se explica pelo peso excessivo da máquina pública -o custo dos funcionários públicos à cabeça. E que apoiaria - se fosse esse o seu papel, que não é - qualquer Governo que estivesse empenhado em cortar nessa gordura.
O que o DE não faz é considerar suficientes esclarecimentos que, tecnicamente, não vão além de um “estão errados”.
Não estamos. Temos a certeza que o truque deste orçamento consiste na tentativa política de adiar a necessidade de cortar (legalmente, claro) no número de funcionários públicos no activo.
E a isso se chama um orçamento transparente.