Caldeirão da Bolsa

Os cortes na Administração Pública e nas prestações sociais

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

por Jameson » 21/10/2005 14:04

Transparência

A Direcção


O Diário Económico escreveu, na edição especial sobre o Orçamento do Estado para 2006, que aumentos salariais para os funcionários públicos superiores a 2% poderiam agravar o défice previsto, que é de 4,8% do PIB.

E para sustentar estas dúvidas, o DE cruzou os valores das despesas total que constam do relatório do orçamento e os que constam dos mapas do mesmo documento. Logo aí, verificou-se que as cativações definidas à cabeça nas diversas rubricas orçamentais não estavam contabilizadas no valor de défice, o que significa, na prática, que já são cortes efectivos. Um dos exemplos diz respeito aos 7,5% de cativação das despesas de investimento. No mesmo cruzamento de informação, tudo indicava que também a chamada dotação provisional do Ministério das Finanças - que serve, especialmente, para garantir os aumentos salariais - não constava do valor de despesa tido em conta no apuramento do défice público. Face a estas dúvidas, o DE tentou obter esclarecimentos junto do Ministério das Finanças, como é de resto a sua obrigação, mas tal não foi possível.

Ontem, na entrevista ao jornal Público, quando confrontado pelos jornalistas sobre as dúvidas suscitadas pelo DE, o ministro das Finanças não prestou qualquer esclarecimento, limitando-se a afirmar que “as contas deles [DE] não são válidas. Estão erradas”. E, nos últimos dois dias, não se cansou de dizer que o Orçamento de 2006 não tem truques.

Face a estas declarações, que põem em causa a credibilidade do DE e o rigor, seriedade e empenho que, todos os dias, os jornalistas do DE põem na produção deste jornal, importa esclarecer o seguinte:
1º O DE tem razão. O Orçamento tem truques.

2º Na edição de hoje, o DE chega à conclusão - sem dúvidas - que parte da dotação provisional destinada a aumentos salariais, no valor de 424,5 milhões de euros, já está contabilizada nas despesas com pessoal e, mais concretamente, nas remunerações certas e permanentes. Isto quer dizer que aquela rubrica está artificialmente inflacionada e, sem esses valores, o Governo admite gastar menos em salários da Função Pública em 2006 do que gastou em 2005. E este é o ponto.

Não está em causa o eventual aumento de 2% da Função Pública. O que está em causa é que esse aumento não é possível mantendo inalterados os salários pagos em 2005. Ou seja, para que os aumentos vão além de 1% será necessário cortar na folha de salários. E isso não se faz pagando menos. Faz-se através de soluções de gestão que permitam escoar funcionários públicos para fora da máquina - já que a Constituição podem permite que estes sejam despedidos. E isso, em Portugal, significa colocar o célebre quadro de supranumerários ao serviço das necessidades do país.

Dito de outra forma: para que os funcionários públicos sejam aumentados acima de 1% (e não se duvida aqui que serão) será preciso reduzir o número de funcionários públicos.

É só isto - o que não é pouco - que o DE considera que precisa de ser esclarecido. Sobretudo quando o ministro das Finanças afirma, no dia da apresentação do OE, que este é um Orçamento sem truques.

Tem um truque: não assume que o rigor das contas apresentado pressupõe um número menos de funcionários públicos.

E que não sobrem dúvidas: o DE é o primeiro a acreditar que o problema das finanças públicas portuguesa se explica pelo peso excessivo da máquina pública -o custo dos funcionários públicos à cabeça. E que apoiaria - se fosse esse o seu papel, que não é - qualquer Governo que estivesse empenhado em cortar nessa gordura.

O que o DE não faz é considerar suficientes esclarecimentos que, tecnicamente, não vão além de um “estão errados”.

Não estamos. Temos a certeza que o truque deste orçamento consiste na tentativa política de adiar a necessidade de cortar (legalmente, claro) no número de funcionários públicos no activo.

E a isso se chama um orçamento transparente.
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por Jameson » 21/10/2005 13:58

ainda são incipientes, mas já começa a existir uma consciência nacional da sua necessidade, já é um avanço

ao defenderes uma solução radical é pedires para as coisas ficarem iguais. Isto tem que lá ir step by step...

nós somos um povo de brandos costumes..lembra-te
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por Incognitus » 21/10/2005 13:50

Cortes? Quais cortes? Da última vez que olhei, o monstro continuava a crescer, e mais, preparava-se para tentar crescer as suas receitas alguns 7 ou 8%.

È ridículo que se fale de "cortes" ou se diga que se vai no bom caminho quando nada acontece. "Cortes" é quando o Estado tiver 1/2 da dimensão actual, e quem estiver a mais estará cá fora a trabalhar como os outros ...
"Nem tudo o que pode ser contado conta, e nem tudo o que conta pode ser contado.", Albert Einstein

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Os cortes na Administração Pública e nas prestações sociais

por Jameson » 21/10/2005 13:17

O mundo está a mudar

José Manuel Moreira


Os cortes na Administração Pública e nas prestações sociais vão no bom sentido e até devem ir além do anunciado.

Agora é o tempo das greves. Greves que, contudo, já não são o que eram. Antigamente eram para prejudicar os patrões, agora são para prejudicar toda a gente. Dantes eram no sector privado, agora é em tudo o que é público: dos enfermeiros e professores aos juízes e funcionários judiciais. Hoje é o dia da greve da Função Pública. O cidadão-contribuinte lá terá que aguentar. A Justiça não funciona. A Saúde vai bem, de buraco em buraco. Quanto à Segurança social, não vai mal – só este ano terão sido 100 mil pessoas a recusar trabalho. A insustentabilidade é só daqui a 10 anos. Por agora vai só nos 18% do PIB.

A saída de Campos e Cunha, felizmente, não interrompeu a obsessão pelo défice. Os cortes na Administração Pública e nas prestações sociais vão no bom sentido e até devem ir além do anunciado. Mesmos assim, os impostos continuam a acompanhar o louco aumento da despesa social. Coisa que de todo não parece preocupar os sindicatos dos funcionários, a quem antes se associava a dedicação à causa pública.

Dantes as greves eram pela igualdade de direitos, agora são para lutar pela manutenção da desigualdade de direitos adquiridos. A Grã-Bretanha tem menos cerca de 200 mil funcionários públicos, apesar de o Reino ter seis vezes mais população do que Portugal. Temos muito a aconselhar aos súbditos de sua Majestade. Antes de mais, a mudarem de designação: de servidores civis (civil servants) para servidores do Estado, vão descobrir logo que falta pessoal.

O povo é sereno e sem dar por isso foi levado a acreditar que o Estado é uma organização caritativa, para cujos fins contribuímos voluntariamente. Como se as justas reivindicações não significassem, regra geral, mais dinheiro a pagar pelos contribuintes.

Tenho um colega meu que, com alguma frequência, costumava ir à noite, com o filho mais novo, levantar dinheiro no multibanco. Um dia o miúdo fez-lhe, a medo, um pedido: Oh Pai, antes de morreres, dás-me esse cartão? A criança, hoje já adulto, por certo não entendia como a coisa se passava, nem como o dinheiro lá ia parar, mas sabia que a coisa dava e sem grande trabalho. Foi isso que os dirigentes - do que Medina Carreira chama “Partido do Estado” - nos habituaram a pensar, e a coisa entranhou-se.

Será que o povo ainda não percebeu que solidariedade, antes virtude, significa agora coacção sobre o dinheiro dos outros? Felizmente as palavras não perdem facilmente o sentido. E o poder dá uma ajuda, ao continuar a chamar ao dinheiro dos contribuintes um nome cheio de coacção: impostos.

Tudo somado, olhando para o orçamento, talvez o problema maior, para além da urgente redefinição das funções do Estado, esteja na segurança social, vista ainda como paradigma da democracia moderna. Não deve ser por impedir as pessoas de escolherem, ao impor quotizações obrigatórias. Muito menos por ter sido criada por um famoso anti-democrata como Otto von Bismarck, o “chanceler de ferro”, e impulsionada depois por numerosos inimigos da democracia, como Franco e Salazar. Talvez seja por ter sido questionada por uma tal “dama de ferro”…
Passar das mutualidades sindicais livres para a segurança social, terá sido mesmo um avanço? Para onde? Será que ainda não percebemos que por efeito de conquistas ditas sociais se justificou a conquista da sociedade pelo Estado?

PS - Apresenta-se hoje como candidato um homem que um dia escreveu um texto sobre como a má moeda expulsa a boa, espero que a sua provável eleição seja um passo necessário para ajudar a perceber como inverter um processo que levou a que tantos falsos direitos expulsassem os verdadeiros direitos.

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José Manuel Moreira é professor universitário e membro da Mont Pelerin Society e assina esta coluna quinzenalmente à quinta-feira
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