Editorial > 2005-11-02 14:00
A Telefónica e a PT
André Macedo
Para se ter uma ideia do montante do negócio, ele equivale a três vezes mais do que o orçamento do Ministério da Saúde português para 2006 e a 44 vezes mais do que a previsão de lucros da Galp para este ano.
É, de facto, um negócio impressionante que revela enorme músculo financeiro. No entanto, não seria a primeira vez que a Telefónica mostrava ter mais olhos do que barriga. Há cinco anos, no meio da loucura das ‘dotcom’, a empresa espanhola pagou 5,5 mil milhões de euros pela Endemol, a produtora responsável por ‘reality-shows’ como o Big Brother. Hoje é evidente que se tratou de mau investimento que não criou valor: uma espécie de mala sem alça que a Telefónica arrasta ao colo.
Mas esse é um problema da Telefónica. O que interessa aos portugueses é saber onde fica a PT no meio de tudo isto.
Como se sabe, a PT tem passado os últimos meses preocupada com o próprio umbigo. Porquê? Porque a substituição do CEO Miguel Horta e Costa está no ar desde Junho. Primeiro quando o ministro das Obras Públicas, Mário Lino, afirmou que o Estado, detentor da ‘golden share’, passaria a ter uma voz mais activa na empresa. Depois, com as declarações recentes de Ricardo Salgado na RTP deixando entender que a partir de Abril haverá mesmo outro CEO.
Como é óbvio este clima não serve a nenhuma empresa. Seja qual for a decisão final, o assunto é uma espécie de eucalipto: seca tudo à volta e quase só se fala dele. Ou seja, é o circo do costume, mas um circo sem graça, porque limita a capacidade da empresa focar-se no que realmente importa aos accionistas: o negócio propriamente dito. E são tantos os assuntos a decidir:
1) Para que países crescer?
2) Como encontrar um parceiro europeu para evitar o ataque de outro gigante?
3) Como reduzir a dependência do telefone fixo em erosão constante?
4) Como definir melhor a política de dividendos?
5) Como tornar a estrutura da empresa mais dinâmica?
A actual indefinição acaba por condicionar a margem de acção da PT numa altura particularmente delicada para o sector. No final da semana passada, Horta e Costa procurou desfazer esta impressão ao apresentar a estratégia que gostaria de pôr em prática nos próximos anos. O documento, como se sabe, não vinculou a PT a nada de muito definitivo e, talvez por isso, não lhe foi dada muita relevância. Mas a verdade é que deveria ter sido um momento especialmente importante. A PT é a maior empresa nacional e dela dependem muitas outras. É por isso que o Governo deveria usar a ‘golden share’ com atenção. Proteger a PT do apetite estrangeiro é uma coisa. Expô-la à lógica partidária é outra muito diferente.
amacedo@economicasgps.com