Sérgio Figueiredo
Decadência soviética
sf@mediafin.pt
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Na decadência do império soviético, um camarada que faltava frequentemente às reuniões do Politburo foi abordado por um outro dirigente inquiridor: «então camarada, faltaste à última reunião?». Resposta: «bem, se soubesse que era a última, tinha ido». Álvaro Barreto pensava que era a última. Por isso não foi ontem à reunião do Conselho de Ministros.
Oficialmente, apanhou gripe. E, prudente, não quis contagiar os colegas de Governo.
Sucede que, à mesma hora, preferia ficar no seu Ministério, recebendo outras pessoas. Que, pelos vistos, são mais imunes a vírus do santanismo.
Este episódio seria isso e apenas isso. Não fosse Barreto um ministro de Estado, número dois do Governo, e não fosse este último Conselho de Ministros sobretudo marcado pela polémica dos dossiers por si directamente tutelados.
Assim, ao trocar a última reunião na Presidência do Conselho de Ministros pelo ar-condicionado do seu gabinete, o engenheiro Barreto revelou tudo: a aversão a problemas que dão trabalho, a falta de empenho no Governo, a desconsideração pelo primeiro-ministro e, afinal, uma falta de sentido de Estado.
Não era coisa pouca que estava ali em causa. Nem pouca, nem pacífica. Entre Álvaro Barreto e Santana Lopes, que desde sempre divergiu da solução Galp / Petrocer, o ambiente não estava fácil. Outras matérias relevantes, ainda na energia, estavam agendadas para o Conselho de Ministros.
Nem com uma perna partida ou afónico, Barreto não podia faltar àquela reunião. Por isso, Santana decidiu convocar outro Conselho de Ministros para a semana. Por isso, decidiu reagendar o tema Galp. Por isso, o que está a dizer é «camarada Barreto, prà semana não podes faltar...».
E assim cai mais um mito deste equívoco que dura há seis meses e se chama Governo. O ministro das Actividades Económicas sabia o que estava a dizer quando confessava aos amigos mais próximos que não pensava envolver-se muito na governação: «vou ser ministro não-executivo», disse a um parceiro de golfe.
A agonia do santanismo torna-se, a cada dia que passa, mais e mais impiedosa. A decomposição atingiu o interior do Governo. Começou com os amigos (aquele adjunto, que já ninguém lembra o nome...). E acaba nos ministros PP, que já andam em campanha contra ele e a calcular as chances que têm se Sócrates falhar a maioria absoluta.
Os dois pilares de credibilidade, aqueles que levaram empresários e gestores a entusiasmarem-se com a equipa económica do Governo, ruíram.
A somatização das críticas levou Bagão Félix a incompatilizar-se com a imprensa, com a banca, com as agências de rating, com a ministra anterior, com o Eurostat, enfim, com o mundo.
A preguiça assumida, mais a prudência calculista, faz o ministro das Actividades Económicas acabar o mandato neste Governo como se nunca dele tivesse participado. Barreto queria passar à história como ministro-fantasma.
Só Mexia continua na estrada. Com as ganas com que chegou. O programa do PSD tem medidas estilo-Schwarzneger, o Exterminador.
Dado o contexto, parece o ministro de Informação de Saddam: as tropas inimigas às portas de Bagdade e ele grita «estamos a esmagá-los».