Paulo Ferreira
Ainda havia mais esta...
pferreira@mediafin.pt
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Tão frágil, este país. Uma decisão contrária do organismo comunitário de estatística e o caos instala-se. O primeiro-ministro cancela a agenda. O Presidente da República reúne-se de emergência com o ministro das Finanças e com o governador do Banco de Portugal. Este é, afinal, o verdadeiro espelho da decadência a que chegámos: já nem o Eurostat conseguimos enganar quando precisamos.
Tão frágil, este país. Uma decisão contrária do organismo comunitário de estatística e o caos instala-se. O primeiro-ministro cancela a agenda. O Presidente da República reúne-se de emergência com o ministro das Finanças e com o governador do Banco de Portugal. Este é, afinal, o verdadeiro espelho da decadência a que chegámos: já nem o Eurostat conseguimos enganar quando precisamos.
Com tudo a cair aos bocados, resta-nos cuidar das aparências. Porque em termos estritamente económicos, haver ou não operação de «lease-back» com os imóveis do Estado é rigorosamente indiferente.
A gravidade do problema orçamental não se altera por isso. O verdadeiro défice das contas públicas está acima dos 5% do PIB, é estrutural e está transformado num símbolo da falta de soluções para o país.
O tema do défice já está tão estafado que qualquer português já o entendeu ao ponto de poder discuti-lo à mesa do café quando quer desenjoar do futebol.
A novidade, agora, é que o Eurostat também tem o seu orgulho (pequeno, é certo) e por vezes gosta de lembrar que existe.
Cansado de fazer o papel de idiota de serviço na contabilização oficial dos défices, o organismo comunitário entendeu que já era demais. E quem melhor do que Portugal para servir de caso exemplar?
Esta operação com imóveis do Estado ultrapassava em descaramento tudo o que já tinha sido visto. O chumbo ontem conhecido mostra-nos que até as fraudes têm o seu limite, que até os contabilistas-ilusionistas têm um código de ética, que não está escrito mas que é amplamente conhecido entre eles e quem os avalia.
A forma como as operações «extraordinárias» deste ano foram preparadas é, também ela, reveladora: em cima da hora e do joelho, muito para lá da linha do aceitável e com o resultado que está à vista. Quase na hora da despedida, fica um triste balanço: nem na cosmética orçamental este Governo conseguiu ser competente.
É verdade que Bagão já nos tinha avisado que não era mágico. Isso ficou agora claro pela forma como deixou cair as cartas da manga à vista de todos.
E agora? O défice contabilizado deixa de estar nos 2,9% e passa para 3,2% sem operação de imóveis? Baixa para os 2,8% com outra operação montada de emergência entre o Natal e o Ano Novo? É irrelevante.
O problema de fundo é de políticas. E o problema imediato é de política e de imaginação.
Imaginação, para inventar apressadamente um novo «lease-back», uma titularização ou qualquer outra operação retirada de um manual financeiro.
Política, para fazer o controlo de danos em Bruxelas no caso do défice ultrapassar os 3%.
Se assim for, será a segunda vez em quatro anos que Portugal viola as regras comunitárias. Nada que a França e a Alemanha não tenham também feito. O pequeno pormenor, que faz toda a diferença, é que nós não somos a França nem a Alemanha, na riqueza e na credibilidade. Nem nunca seremos, como é bom de ver.