Muita fama e muitos problemas de higiene durante as inspecções... Pelo menos é o que se ouve por aqui
Boa comida Portuguesa, experimentem o Restaurante Veneza - Mem Moniz, entre as Ferreiras e Paderne
PÚBLICO - EDIÇÃO IMPRESSA - FUGAS
Director: José Manuel Fernandes
Directores-adjuntos: Nuno Pacheco e Manuel Carvalho
POL nº 5965 | Sábado, 22 de Julho de 2006
Restaurante- Beber no Veneza de Mem Moniz
David Lopes Ramos
Restaurante Veneza
Mem Moniz (entre Ferreiras e Paderne), à beira da estrada
Telefone: 289 367 129
Almoços: do meio dia às 15h30; jantares: das 19h00 até 23h00
Cartões só Multibanco
Encerra às 3ªs feiras. Estacionamento fácil
Há, em Portugal, uma ou outra casa de comer que são mais casas de beber. É esse o caso do restaurante algarvio Veneza, que fica longe das praias e das mais conhecidas localidades do Algarve, mas que tem uma garrafeira, com destaque para os vinhos portugueses, de se lhe tirar o chapéu. A comida, de cariz regional, é apaladada, mas são os vinhos que tornam o Veneza uma casa recomendável. David Lopes Ramos esteve lá com um grupo de amigos e ficou cliente. As fotografias são de.............................................................
O Veneza é um restaurante do interior algarvio, de Mem Moniz, na beira da estrada entre Ferreiras e Paderne, que tem uma oferta e serviço de vinhos que o tornam recomendável e o distinguem da generalidade das casas de comer portuguesas. A grande maioria dos restaurantes portugueses reserva um lugar secundário aos vinhos e respectivo serviço. No Veneza, os vinhos ocupam o lugar cimeiro. Há frigoríficos para manter os brancos e os tintos à temperatura ideal. Ali sabe-se que "os tintos à temperatura ambiente", quando esta ronda os 30 e mais graus centígrados, é um disparate e fonte de desprazer para os apreciadores. Sabe-se ainda que, em copos adequados - formato, vidro liso, fino e transparente e pé alto -, os vinhos exprimem melhor as suas características. Depois, a oferta de vinhos portugueses e estrangeiros é igualmente incomum. Nada ou quase do que de mais conhecido e famoso se elabora em Portugal e muito do melhor que há no estrangeiro, com destaque para a nossa vizinha Espanha, falta nas prateleiras e nos frigoríficos do Veneza.
E quanto à comida para se harmonizar com a oferta de vinhos? Não sendo nada que nos faça sonhar ou aguar a memória, está bem. É uma cozinha de raiz regional, em que avultam os cozinhados de tacho e de forno, bem temperados e apaladados, capazes de nos proporcionar uma refeição decente e que permitem aos vinhos tornar-se as vedetas dos repastos. Não há ementa escrita. A dona da casa anda de mesa e mesa e, embora sem a encenação e o "panache" de Queiroz de Andrada no saudoso Sua Excelência, de Lisboa, recita o que está pronto. No jantar de 24 de Junho havia, entre outros, a sopa, iscas de fígado de porco de cebolada, arroz de pato e carne de porco assada no forno. Esta foi a nossa escolha - éramos quatro - e começámos pelo pão de trigo, oloroso, bem cozido, muito bom, umas azeitonas bem curadas, umas taliscas de bom presunto e bom paio, um queijinho de Azeitão de meia cura potável (17 euros pelo conjunto), mais umas gambas sem história e uma sapateira fresca e preparada sem artifícios (19 euros pela "mariscada").
A parte séria da refeição, para que se escolheu o Xisto Roquette e Cazes 2003 (29,50 euros), um novo tinto do Douro, de grande harmonia e elegância, com taninos doces e um frutado fresco e envolvente, que domina o perfil do vinho, em que a presença da madeira de qualidade transmite complexidade e estrutura, mas se mantém discreta, começou com uma "tijela de sopa" (nove euros). É uma dessas sopas portuguesas rústicas, barrocas, com feijão, couves, carnes e enchidos variados, que, só por si, podem preencher uma refeição. Provámos os quatro e avançámos - em estilo ora agora picas tu, ora agora pico eu - para o arroz de pato (12 euros), com a carne do marreco grosseiramente desfiada, a gramínea no seu melhor ponto de cozedura em caldo aromático; a carne de porco assada no forno (12 euros), suculenta, que se acompanhou com um poucochinho de papas de milho e umas batatinhas, mais umas iscas de fígado de porco de cebolada (10 euros), que poderiam ser cortadas mais fininhas, mas que tinham bom tempero e estavam bem fritas. Houve um ponto da refeição em que ficámos sem vinho. Um de nós reparou que, no frigorífico dos tintos, estava à vista o Quinta Sardonia 2003 (49 euros), um espanhol vizinho da Ribera del Duero que, em 2005, ganhou a prova Douro/Duero, organizada pela portuguesa "Revista de Vinhos" e pela espanhola "Sobremesa". Servido a uns 18 graus, revelou-se um tinto raçudo, quase preto de cor, denso de aromas, com mirtilo e outros frutos pretos à superfície, alcaçus e notas de chocolate. Taninoso, encorpado na boca, é um tinto cujo perfil se situa nos antípodas do Xisto, que resulta da associação feliz entre aa famílias Roquette (Quinta do Crasto, Douro) e Jean-Michel Cazes (Château Lynch-Bages, Bordéus, entre outros) e uma bela obra enológica de Susana Esteban (Crasto) e de Daniel Llose (Lynch-Bages). O Quinta Sardonia [ver texto nestas páginas] é uma criação do enólogo-vedeta Peter Sisseck, autor do famoso e caro Pingus.
A refeição terminou com selecções de frutas (10 euros) e de doces regionais (7,50 euros) recomendáveis, mas a sua história, verdadeiramente, começou e acabou nos vinhos. Serviço atento e simpático, com destaque para o profissionalismo e carinho no tratamento dos vinhos. Morrer em Veneza? Deixemos isso para a cidade italiana dos canais. No Veneza algarvio tratemos antes de beber...
Quinta Sardonia
A Quinta Sardonia, um projecto conjunto do enólogo-vedeta Peter Sisseck, criador do famoso tinto Pingus, da Ribera del Duero, e de Jerome Bougnaud, existe desde 2002 em Sardon del Duero. A quinta situa-se a 400 metros do rio Duero, a 700-800 metros acima do nível do mar, e, desde o início, as vinhas são cultivadas segundo os princípios da biodinâmica, ou seja, sem a utilização de pesticidas sintécticos, herbicidas ou fertilizantes. Os Invernos são frios e os Verões muito quentes e secos. Os solos são argilosos com formações de rochas calcárias e giz.
O Quinta Sardonia é um "blend" [lote] de 42 por cento de Tinto Fino, 28 por cento de Cabernet Sauvignon, 16 por cento de Merlot, cinco por cento de Syrah, cinco por cento de Petit Verdot, dois por cento de Malbec e dois por cento de Cabernet Franc. A fermentação decorre em depósitos de inox de 10 mil litros baixos e largos especialmente desenhados para a quinta e a "educação" [estágio] do vinho é feita durante 18 meses em barricas novas de carvalho francês. Na primeira vindima foram cheias seis mil garrafas.
O Quinta Sardonia 2003 ganhou, destacado, a prova Douro/Duero, que decorreu no Pinhão, em Setembro de 2005. As incidências, identificação do painel de provadores, vinhos provados e resultados foram publicados nos números de Novembro de 2005 das revistas organizadoras: a portuguesa Revista de Vinhos e a espanhola Sobremesa.