Há dias discutiu-se neste forum a validade da Análise Técnica em termos estatísticos num tópico introduzido pela Marta e relativamente participado. Retomo o tema com algumas considerações adicionais...
Cada vez menos vejo a AT como pura estatística e cada vez mais como um método de Análise Empírica. A verdade é que, ao olhos de uma análise estatística rigorosa, o mérito da Análise Técnica enquanto metodologia rígida assente em regras e princípios estatísticos, é relativamente reduzido... infelizmente.
Um dos «graves» problemas da Análise Técnica é o facto de esta se basear inteiramente no Passado quando o objectivo é, naturalmente, o de actuar no Futuro. Obviamente que a nossa única base de trabalho é o Passado e se tivessemos conhecimento preciso do Futuro (e não apenas conjecturas abstractas) não necessitaríamos da Análise Técnica. A questão é que o Futuro revela-se sistematicamente diferente do Passado, o que podemos constatar observando o próprio passado, senão vejamos: se tomarmos uma amostra e analisarmos determinados padrões ou o comportamento de determinados indicadores nessa amostra e de seguida compararmos os resultados com outros obtidos numa outra amostra, por hipótese relativa a outro momento no tempo, constataremos que os dados tendem para valores claramente diferentes, por sistema. Ora, a tendência natural é a de procurar optimizar os resultados para uma determinada amostra de que dispomos o que se traduz num efeito de <i>overfitting</i> pois na realidade as nossas optmizações tendem a deixar de funcionar como tal em dados <i>out-of-sample</i>, o mesmo será dizer, as optimizações para uma segunda amostra seríam muito provavelmente diferentes. Ora, o Futuro serão dados <i>out-of-sample</i> necessariamente, ou seja, serão dados diferentes dos que dispomos. Ao optimizarmos estatísticamente o Passado quase que temos a garantia de que não estamos a optimizar o Futuro porque essa é a natureza dos mercados... Este efeito é denominado pelos académicos de Data-Snooping Bias e o <i>overfitting</i> (optimização para uma dada amostra) tende a agravar esse efeito...
Porquê Bulkowsky? Porque se trata de um excelente exemplo. É uma obra bastante difundida e referenciada, por vezes, como a Bíblia dos padrões. Acontece que o trabalho, muito embora meritório, de Bulkowsky assenta numa amostra de apenas 500 históricos ao longo de apenas 5 anos em que o mercado se comportou quase sempre em <i>Bull Mode</i> (o que merece aliás uma observação do autor). Trata-se de uma amostra aparentemente enorme mas... na prática e na realidade dos mercados... praticamente insignificante. Esta amostra não representa sequer 0.1% dos dados disponíveis (todos os activos, todos os mercados, todos os anos) e provavelmente os <b>nossos</b> próximos anos (os próximos 0.1%) serão diferentes da amostra considerada...
Tanto mais que em diversos casos, o que o autor fez foi procurar o padrão que obtivesse os melhores resultados na amostra. Esta atitude, aparentemente positiva, não o é na realidade pois o que a prática (e a análise estatística dos mercados) nos diz é que os parâmetros optimizados numa amostra não correspondem a uma optimização para o Futuro. Ou seja, por outras palavras, se um padrão funcionou de forma optimizada com determinados parâmetros, provavelmente já não será com os mesmo parâmetros que o mesmo padrão surgirá optimizado no Futuro...
Outras questões relacionadas com o trabalho de Bulkowsky (e bastante evidente para quem consultar a obra) é que apesar do preciosismo técnico (e paramétrico) a definir os padrões, uma observação dos exemplos constantes do livro rapidamente nos levam a concluir que muitos dos padrões dificilmente são visíveis/reconhecíveis a olho nú, sendo nuns casos bastante rebuscados e noutros bastante diferentes entre si, fruto naturalmente da metodologia utilizada (quer por recorrer a um reconhecimento mecânico quer por recorrer a optimizações nos parâmetros dos padrões). O resultado é que este processo abre caminho a que a análise contemple o padrão x como sendo XPTO quando a generalidade dos analistas provavelmente não o vislumbraria e não contempla o padrão y como sendo XPTO quando provavelmente um número significativo de analistas o consideraría...
Devo dizer, não obstante, que aprecio a obra e considero-a bastante útil para consulta, como referência. No entanto, coloco bastantes reservas quanto a tomar os números apresentados como fiáveis e indiscutíveis e, em alguns casos, como sendo a metodologia seguida a melhor para a definição dos padrões (se é que há <b>uma</b> boa metodologia).
Voltando à questão inicial, se reduzirmos a AT a um conjunto de regras rígido e puramente estatísticas (um sistema de análise assente exclusivamente num raciocínio do tipo convergente) os resultados tenderão a desaparecer à medida que a informação vai estando acessível aos diversos intervenientes (daí que sistemas com resultados fabulosos no passado terem pura e simplesmente deixado de funcionar). O mercado está constantemente a regenerar-se e a anular as suas ineficiências. Se determinado evento estatístico é demasiado previsível e é negociável (pode obter-se lucro dessa previsibilidade) tal ineficiência tenderá a ser anulada pela actuação dos diversos intervenientes e portanto a desaparecer até estar acessível apenas a um conjunto restrito de intervenientes, uma minoria (exemplo: a arbitragem). Este é aliás um dos grandes argumentos <i>anti-at</i>.
Quer isto dizer então que não deverão existir regras?
Não. Naturalmente têm de existir regras, muito embora não seja obrigatório que todos se rejam pelas mesmas regras. E as regras são, na minha óptica, basicamente:

Coerência;

Bom senso;

Princípios fundamentais;
Entenda-se por princípios fundamentais como um conjunto de princípios lógicos com um mínimo de correspondência/confirmação prática. Como qualquer área do conhecimento (ciêntífica, filosófica, etc) terá que assentar num conjunto de princípios fundamentais dos quais derivam um conjunto de regras e interpretações, o que não obriga de todo a que todos os analistas tenham a mesma abordagem relativamente à Análise Técnica.
Ora, como eu dizia há dias... entendo que a Análise Técnica é subjectiva e que tem de ser subjectiva!