2003, segundo César Borja (Parte 1)
Gostei da análise
É dificil encontrar alguém com tanto saber encriptado! até na geopolitica!
Força Borja
Força Borja
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ASA Delta
César,
Excelente, como nós já nos habituaste.
Sabes que não gosto de fazer previsões a longo prazo, porque sempre que o faço acabam por desvirtuar a essência dos meus "trades" de curto prazo. Mas confesso que é uma delícia ler algo de tão bem fundamentado, mesmo que cheguemos ao final de 2003 e tudo o que previste saia furado. Mas a clareza dos argumentos e a sua oprtunidade fazem desta análise um "must"!
Um grande abraço,
Ulisses
Excelente, como nós já nos habituaste.
Sabes que não gosto de fazer previsões a longo prazo, porque sempre que o faço acabam por desvirtuar a essência dos meus "trades" de curto prazo. Mas confesso que é uma delícia ler algo de tão bem fundamentado, mesmo que cheguemos ao final de 2003 e tudo o que previste saia furado. Mas a clareza dos argumentos e a sua oprtunidade fazem desta análise um "must"!
Um grande abraço,
Ulisses
geopolitica
Conceito de geopolitica............uma ciência e uma arte......a qual tem por objecto a construção de um modelo geografico (geografia vertical e não somente a horizontal, tais como factores económicos, de recursos humanos e materiais, localização dos mesmos, densidades...etc) feita no sentido da finalidade politica de uma determinada entidade da cena internacional.
Conceito de geoestratégia a praxis da geopolitica....
Temos de pensar.....acho que a parte relativa à geopolitica está feita com alguma ligeireza.....e com todo o respeito o digo. Penso que é meritório o esforço que essas linhas significam....eu nada sei ...em termos seguros de análises tecnicas....mas agradeço o esforço que este estudo representa para a progressiva compreensão do significado dos seus termos...
cumps...
Conceito de geoestratégia a praxis da geopolitica....
Temos de pensar.....acho que a parte relativa à geopolitica está feita com alguma ligeireza.....e com todo o respeito o digo. Penso que é meritório o esforço que essas linhas significam....eu nada sei ...em termos seguros de análises tecnicas....mas agradeço o esforço que este estudo representa para a progressiva compreensão do significado dos seus termos...
cumps...
Se naufragares no meio do mar,toma desde logo, duas resoluções:- Uma primeira é manteres-te à tona; - Uma segunda é nadar para terra;
Sun Tzu
Sun Tzu
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Grande César
É sempre um prazer ler estas tuas aprofundadas, elaboradas e cuidadas análises! Aqui deixaste um valiosíssimo documento que será certamente um referencial para toda a comunidade caldeiranense... e propiciará certamente reflexões e debates frutuosos...
Gostei imenso da secção Geopolítica! Penso que tens razão quanto às verdadeiras causas do interesse de uma Guerra com o Iraque para mudar o regime político. Acho que o Caldeirão devia abrir um fórum específico para Geopolítica. Estava aqui a pensar escrever umas coisas para suscitar o debate e contrapor a algumas missivas deixadas por vários forenses relativas ao temor da guerra e a um certo antiamericanismo latente...
É também curioso verificar que uma análise (técnica) pelo método de Ondas de Elliott permite inferir uma evolução dos mercados consentanea no tempo e nos targets com a tua análise histórica! Dizes que o "Zig-zag" indica que falta uma onda 5... e nas minhas eliópticas cheguei à conclusão que estamos a percorrer essa onda 5 que será desdobrada em 5 sub-ondas. Estamos actualmente nos primórdios da terceira!
Hoje encontrei duas páginas com análises prospectivas que poderão interessar-te bem como a todos os companheiros. Nem de longe nem de perto conseguem ter a qualidade holística da tua... aqui ficam os seus endereços:
a) Market Trendz
b) Ask Dr Bob
Uma coisa interessante é que nos dois períodos anteriores em que os mercados caíram durante 3 anos consecutivos, seguiu-se um Bull Market de 4 anos. Haja esperança!
Um grande abraço,
Sol Dado
Gostei imenso da secção Geopolítica! Penso que tens razão quanto às verdadeiras causas do interesse de uma Guerra com o Iraque para mudar o regime político. Acho que o Caldeirão devia abrir um fórum específico para Geopolítica. Estava aqui a pensar escrever umas coisas para suscitar o debate e contrapor a algumas missivas deixadas por vários forenses relativas ao temor da guerra e a um certo antiamericanismo latente...
É também curioso verificar que uma análise (técnica) pelo método de Ondas de Elliott permite inferir uma evolução dos mercados consentanea no tempo e nos targets com a tua análise histórica! Dizes que o "Zig-zag" indica que falta uma onda 5... e nas minhas eliópticas cheguei à conclusão que estamos a percorrer essa onda 5 que será desdobrada em 5 sub-ondas. Estamos actualmente nos primórdios da terceira!
Hoje encontrei duas páginas com análises prospectivas que poderão interessar-te bem como a todos os companheiros. Nem de longe nem de perto conseguem ter a qualidade holística da tua... aqui ficam os seus endereços:
a) Market Trendz
b) Ask Dr Bob
Uma coisa interessante é que nos dois períodos anteriores em que os mercados caíram durante 3 anos consecutivos, seguiu-se um Bull Market de 4 anos. Haja esperança!
Um grande abraço,
Sol Dado
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- Registado: 8/11/2002 8:29
2003, segundo César Borja (Parte 1)
2003, segundo César Borja
1. Introdução
Este estudo tem o ambicioso objectivo de prever 2003 em termos de grandes variáveis macroeconómicas e de mercados financeiros que considero mais interessantes analisar nesta altura. Sabemos que prever, principalmente para o futuro, é algo bastante complicado e extremamente falível. Mas ainda assim, não viro as costas ao desafio. E isto porquê?
Porque acredito que para lucrar nos mercados é necessário prever. Seja uma previsão dos próximos 5 minutos ou do próximo ano, é preciso estudar, analisar, compreender a história, de forma a responder à questão: vai subir ou vai descer?
A Análise Técnica é uma forma de previsão, embora muitos que a utilizam não compreendam isso (porque preferem recusar que fazem previsões, como se estas fossem exclusivas dos bruxos, fossem algo não científico). A AT prevê com base nos preços e volumes passados. E é, para mim, a melhor ferramenta de previsão, pois traduz, a cada momento, o que os investidores em equilíbrio pensam do futuro. Mas existem outras ferramentas para prever o futuro. A História, por exemplo. Os mercados são cíclicos, alternando entre depressões pessimistas e euforias especulativas, normalmente com vários anos de intervalo entre cada fase. De facto, os anos de intervalo são tantos, que apenas estudando história se pode ter algum conhecimento acerca do assunto, ou então ser um investidor matusalém de 90 anos que ainda se lembra da Depressão dos anos 30 :-).
Na dicotomia opinião versus neutralidade opto de caras pela opinião. Os riscos são maiores, mas como sabemos quanto maior o risco maior a rendibilidade esperada. Depois posso ir corrigindo a previsão, adequando-a e actualizando-a com novos dados, mas sempre com o pensamento 6 meses à frente, que é como os mercados pensam. Reagir às notícias e factos de hoje é uma das formas mais seguras de perder dinheiro. Quem não se lembra do início de 2002, em que a recuperação económica no 2º semestre era uma certeza e que o Bull Market estava de volta? E eu perguntava, «mas, recuperação económica de quê, depois do PIB ter crescido 6,1% no 1º trimestre em termos anualizados, the only way is down».
As previsões são úteis para que se tenha um fio condutor, um caminho por onde orientar o pensamento e as movimentações no mercado. O caminho não é sempre a direito, tem rectas e curvas (algumas apertadas) e por vezes chegamos a um beco sem saída. Aí, há que procurar alternativas. Por outro lado, ao longo do percurso, vários sinais surgirão com indicações de mudanças de destino. É preciso saber que mudanças valem a pena, e quais são meras distracções que nos desviam do objectivo final.
Agora, qual o comportamento que o investidor racional deve ter face às previsões que apresentarei? Mera curiosidade, e interesse em relação aos motivos apresentados. Por amor de Deus, que ninguém se ponha a seguir isto, pois pode estar tudo errado, e mais, seguir a opinião de outros é outra forma bastante rápida e segura de perder dinheiro (há mais de 1.000 maneiras de perder dinheiro nos mercados... agora de ganhá-lo, há poucas). O raciocício que possa estar por trás das previsões é que pode ajudar alguém, embora seja impossível escrever tudo o que me leva a afirmar algo, por vezes nem eu sei porque digo o que digo. Tudo é simples e tudo é complexo. E não é com filosofias que vamos lá, por isso, meus amigos ...
Um bom 2003 e vamos ao trabalho !
2. A história de 2002
Para descrever sucintamente a história dos mercados mundiais em 2002 escolho o S&P 500, porque é o índice mais representativo do maior mercado accionista e da maior economia do Mundo, a dos EUA (cerca de 22% do PIB mundial). Mas também porque é o mercado líder incontestável, existindo uma grande (e crescente) correlação de quase todos os mercados mundiais com o norte-americano. Ainda hoje a forma mais fácil de comprar acções de todos os sectores ou até de múltiplos países é abrir uma conta numa corretora americana, é uma coisa que me entristece, Lisboa teria neste momento uma oportunidade única de criar praças que servissem a zona euro. Mas essa é outra questão que não podemos solucionar ou fazer alguma coisa, por isso vamos em frente.
2002 começou com expectativa, as pessoas estavam optimistas com a grande subida anterior - que foi uma correcção à queda exacerbada sem fundamento macroeconómico após o 11 de Setembro. Se não tivésse havido o 11 de Setembro, não teria caído tanto em tão pouco tempo e não teria havido um rebound tão poderoso, mas enfim, aconteceu essa catástrofe humanitária, lamentamos o sucedido.
Apesar da expectativa, Janeiro foi um mês de descidas no S&P 500, caiu 1,56%, o que era já um sinal de alerta, devido ao «January Effect». O efeito de Janeiro diz que se o mercado subir em Janeiro subirá no total do ano, e se descer em Janeiro vai descer no total do ano em causa. Claro que não é sempre assim, mas tem uma probabilidade estatística elevada de acontecer (é fácil de calcular, mas agora não temos tempo). Fevereiro e Março corresponderam à subida que levou ao topo duplo formado nos 1.176 pontos (ponto 2 no gráfico). Aqui não se vê, mas em Dezembro houve um ponto 1 também nos 1.176, que era uma importante resistência.
Na altura foi logo claro que o mercado não iria passar da resistência e que iria cair, e essa análise era uma das mais simples que se pode fazer: as notícias eram muito melhores no ponto 2 do que no ponto 1 (o que é Bear - ler O potencial de money in e money out). Enquanto que em Dezembro ainda só se falava nos ataques terroristas e na queda do Consumo derivado disso, em Março, no mesmo ponto de mercado, já só se falava no retorno ao crescimento económico vigoroso e na recuperação de longo prazo do mercado. Por essa altura escrevi um artigo importante, se quiserem ler ...
Os motivos de um Bear
Depois de atingir esse ponto 2 nos 1.176 pontos, o S&P mergulhou numa espiral descencente de -34% em 4 meses, quando atingiu um mínimo importante nos 775 pontos a 24 de Julho. Não era fácil identificar esse fundo. O mercado tinha uma tendência marcadamente descendente plenamente justificada pelos fundamentais. Estava oversold, mas isso já acontecia há bastante tempo e não impedia as quedas (as maiores descidas acontecem com os mercados já oversold, e as maiores subidas acontecem com os mercados já overbought). A certa altura a queda acelerou e nos 775 houve uma reacção, que apesar de ter uma amplitude assinalável, não era na minha opinião transaccionável, pois claramente o fundo único nos 775 não deveria ser o fundo absoluto do mercado, não tinha havido qualquer figura técnica de inversão.
Restava-nos shortar o rebound, eram H&S, falling wedges, possibilidade de duplo fundo, tudo em termos técnicos apontava para os 775. E foi lá novamente ! Nessa altura, todos os que estavam a ver o mesmo que eu, tomaram lucros. E não se sabia o que se iria passar, se quebrava os 775 seguindo a tendência de longo prazo, se andaria ali de lado a magoar o maior nº de pessoas, ou se pelo contrário iria tentar dar a impressão da formação de um duplo fundo, aproveitando o short covering nos 775 e o impulso sazonal de final do ano.
Sabemos agora que aconteceu a 3ª hipótese. Sem respirar, em apenas 4 sessões, o S&P fez a grande parte de todo o rebound de final do ano. Os que foram lá depois foram buscar migalhas, correndo elevados riscos, toda esta fase desde meio de Outubro até ao final de 2002 para mim não é senão uma grande fase de distribuição, a preparar, a fermentar, a grande queda do início de 2003.
Mas, ainda não chegámos às previsões, isso é bastante mais lá para a frente no artigo ... em 2002 o S&P está a cair (ainda faltam duas sessões) 24%, o que constitui o 3º ano consecutivo de descidas. Apenas uma vez na História o S&P desceu 4 anos consecutivos, que foi em 1929 - 1932. Será que se vai repetir a longínqua história da década de 30?
3. Previsões macroeconómicas e motivos
3.1. EUA versus Japão
Gráfico Nikkei 225 (desde 1982):
Lamentavelmente não consegui encontrar um gráfico mais expressivo do Nikkei 225, desde a 2ª Guerra Mundial, temos só este desde 1982 que é muito redutor da realidade histórica. Mas posso descrever muito sucintamente o que aconteceu no Japão.
O país ficou destruído na 2ª GM (ironicamente os dois grandes derrotados da Guerra são agora a 2ª e 3ª maiores economias mundiais), como todos sabemos. O esforço de reconstrução (com a ajuda dos EUA) foi enorme, e apenas em 1957 o Japão atingiu o mesmo patamar económico que tinha em 1940. Nos 13 anos seguintes até 1970 a economia nipónica cresceu a uma taxa média anual de 10%, a maior taxa de crescimento do Mundo. Em 1957 o Nikkei estava abaixo de 1.000 pontos, não posso precisar quantos pois falo de memória de um gráfico de longo prazo apresentado pelo José A.B. Machado, mas fica a ideia.
A partir de 1970 a taxa de crescimento do PIB abrandou um pouco, mas sempre acima dos 5% ao ano, e na década de 80 no mundo económico só se falava no milagre económico japonês, baseado essencialmente nas exportações. O Japão era competitivo, fazia melhor e a preços mais baixos, e as suas exportações tinham grande colocação no mercado mundial. Faziam melhores televisores, melhores carros (em 1980 o Japão ultrapassou em volume a produção de automóveis dos EUA), melhores aparelhagens, enfim ... o Nikkei teve um Bull Market gigantesco (merecido, pois o Japão passou de uma economia quase tradicional baseada na agricultura para uma economia de ponta, a 2ª maior do Mundo), que foi de menos de 1.000 pontos aos 40.000 pontos em cerca de 35 anos.
Como sempre acontece nestas coisas, no final a euforia transformou-se numa bolha especulativa, que inevitavelmente estoirou, e o Nikkei cai há 12 anos, estando neste momento nos mínimos dos últimos 19 anos. No topo, o PER de mercado do Nikkei era de 100, e só para termos uma ideia do que aconteceu no imobiliário (cuja bolha continuou bastante para além de 1990 - início do Bear nas acções), em 1992 um terreno do tamanho de um campo de futebol no centro de Tóquio valia mais a preços de mercado do que o Estado da Florida, nos EUA. O cartão de sócio de um clube de Golfe em Tóquio valia, em 1992, 1 milhão de US dolares, para vermos até onde vai a loucura dos homens, parecendo, a todos, normal. Esta bolha também estoirou, como acontece com todas as bolhas especulativas, e de 1992 para 2002 o preço médio da propriedade no Japão caiu mais de 80% (e ainda é o mais caro do Mundo - faz sentido que o seja, devido ao PIB per capita do país e densidade populacional, o valor do m2 de terreno no Japão em princípio valerá sempre mais do que em qualquer outro país do Mundo).
O milagre económico japonês baseava-se no constante aumento das exportações. E a forma de organização da economia, com um estado bastante forte e interligado com as empresas, que fomentavam o emprego para toda a vida. Este modelo parece esgotado, pois o sucesso na economia global já não se baseia na produção industrial, mais sim no sector terciário, na informação, no conhecimento.
O Japão tem outros problemas em voltar a repetir o milagre, dos quais vou destacar 4 principais:
1) O admirável sucesso dos anos 60-80 foi conseguido através de um sacrifício incrível da população, de uma vontade de vencer e um esforço que talvez nunca outra nação tenha feito na história. As gerações mais jovens não têm o mesmo espiríto de sacrifício, é normal, acontece assim com as empresas, com as famílias e com as nações.
2) A demografia. A taxa de crescimento da população no Japão está a diminuir bastante, e a população a ficar cada vez mais envelhecida (um problema de todos os países desenvolvidos). Um aumento da população faz sempre crescer a economia no longo prazo, em qualquer modelo macroeconómico.
3) O Japão não tem recursos naturais, o que constitui um sério problema para uma nação industrial.
4) A deflação. Os produtos industriais são quase «mercadorias» nesta altura, e com o aumento da concorrência e a baixa dos custos de produção, os produtos tendem a descer de preço e a emagrecer as taxas de lucro das empresas, o que traz problemas ao Estado devido a uma menor colecta de impostos e aumento de desemprego (o desemprego no Japão está no máximo desde a 2ª GM).
A melhor saída para o Japão seria um entendimento e um estreitar de relações económicas com a China e a Rússia, é sugerida até por alguns autores uma trilogia vencedora, o conhecimento e tecnologia japonesa, aliados à população chinesa e aos recursos energéticos de uma Sibéria poderia criar um novo milagre económico e provavelmente a mais próspera zona económica do Mundo (não que a China não o consiga fazer sozinha).
Mas isto são questões de muito longo prazo, voltando a um ponto atrás, a relação entre o Estado, as empresas e os trabalhadores constitui um problema ao desenvolvimento económico normal no Japão (não um milagre, mas digamos, uma taxa de crescimento do produto potencial de uns 2-3% ao ano). É que no Japão muito dificilmente as empresas vão à falência. O Estado não deixa o mercado funcionar. Os mercados estão saturados, não existe «pricing power» e ainda assim o Estado procura manter artificialmente as empresas deficitárias (principalmente os bancos, muitos estão insolventes, mas o Governo, à custa de um défice orçamental de 8% do PIB - o maior do Mundo, o que diria a Comissão Europeia se a Ferreira Leite apresentásse um défice destes? hehe - não os deixa cair).
Se bem que existem alguns sinais ténues de reestruturação e de comprometimento com as leis do mercado, parece que ainda há muita dor para ser sentida pelos japoneses antes desta longa Depressão acabar, infelizmente.
É aqui que está a maior diferença com os EUA !!! É que o Governo dos EUA e também do UK está a deixar cair as empresas com prejuízos, não se preocupando com os efeitos sociais de tal postura. Vejam-se os recentes casos da UAL e da British Aerospace. Pedem ajuda ao Estado e o Estado vira-lhes as costas. É uma diferença fulcral, por estas linhas se escreve a História, e entre Keynes e Shumpeter as economias ocidentais estão a optar por Shumpeter, o que poderá ter consequências bastante graves no curto prazo, mas provavelmente garantir o sucesso de longo prazo.
Mas vamos a um gráfico do S&P 500, para comparar a situação americana com a japonesa:
Gráfico S&P 500 (desde 1980):
Começamos já por uma diferença importante, a bolha especulativa foi menor nos EUA que no Japão. O Nikkei subiu, em termos de longo prazo, durante cerca de 33 anos, antes de estoirar. O S&P subiu só 18 anos. O Nikkei valorizou-se 40 vezes, o S&P apenas 15 vezes. Tudo bem que a taxa média de crescimento anual do PIB no Japão entre 1957 e 1990 foi superior à dos states nos anos 1982-2000, mas fica registado o facto do Bull Market ter tido uma menor dimensão nos states do que no Japão, pelo que se poderá pensar que também o Bear Market terá uma menor duração temporal nos EUA que no Japão.
Por outro lado, o PER do Nikkei 225 no topo era de 100, enquanto o do S&P em 2000 era de 42. Os excessos cometidos não parecem ter sido, portanto, tão graves nos EUA comparativamente ao Japão.
A economia dos EUA, baseada no sector terciário, na informação e no conhecimento, tem vantagens futuras sobre a economia japonesa ainda baseada no sector secundário. Realçando estas diferenças estruturais, continuo a afirmar que os decisores políticos e económicos nas economias ocidentais de mercado devem ter os olhos postos e bem postos na experiência japonesa, principalmente no que se refere aos problemas da armadilha da liquidez (taxas de juro a zero não estimulam a economia, devido à saturação de mercados, ausência de pricing power e sobre-endividamento das famílias e empresas) e da deflação.
E eles estão atentos. E estão a agir de forma diferente. Vão deixar o mercado funcionar. O dólar já está a ir por aí abaixo em flecha (só tinha que ser, está muito sobre-avaliado), e o que tem que falir está a falir, as empresas mais fortes sobreviverão e ganharão market share, os endividados pagarão as suas dívidas ou declaram falência, e a economia, em princípio, surgirá das cinzas novamente saudável e com potencial de crescimento de longo prazo. Claro que isto demorará talvez uns anos, mas em termos de mercados deverão existir swings interessantes em 2003, como veremos mais à frente ...
3.2. PIB
(PIB = Consumo + Investimento + Exportações - Importações)
Não é visível no gráfico, mas em 5 das últimas 6 recessões houve um double dip (a de 1990 foi a excepção). Portanto, o double dip económico é mais a regra do que a excepção. Comparando a recessão de 1990 com a de 2001 (recessão = dois trimestres consecutivos de variação negativa do PIB real), vemos que a de 1990 foi bastante mais grave. No entanto, derivado dessa recessão, o S&P caiu apenas 20%, e actualmente cai 42% do máximo histórico. Adicionalmente, o mercado está bastante abaixo do que estava quando se viveu a suave recessão de 2001.
Outra questão importantíssima é a estrutrura do crescimento económico. É que o ciclo económico prepara uma recessão começando sempre por uma quebra do Investimento (leading indicator), mas é quando o Consumo (coincident indicator) cai que vem a verdadeira recessão (pois o Consumo normalmente contribui com 2/3 para o PIB). Normalmente, na recessão, o Investimento até já está a recuperar, mas a queda do Consumo mais do que compensa negativamente a subida do Investimento. Essa é a estrutura de variação das componentes do PIB que favorece e sinaliza o crescimento económico futuro.
Ora, a recessão de 2001 foi causada por uma quebra fortíssima do Investimento, mas o Consumo aguentou o PIB. O mercado está claramente a prever um segundo dip, que constituiria o tal double dip, que virá naturalmente, como a história nos ensina, com a capitulação do consumidor norte-americano. Não tem hipótese, principalmente devido ao seu endividamento, mas também porque é assim que o ciclo económico se desenvolve.
Acredito que o segundo dip, bastante mais carregado que o do final de 2001, venha agora no 1º semestre de 2003, devido à queda abrupta do Consumo. Será muito importante, nessa altura, verificar a estrutura do crescimento do PIB, pois se o Consumo cair enquanto o Investimento der sinais de ligeira melhoria, temos uma clássica situação macroeconómica bull, com o povo consumidor a baixar os braços precisamente no momento em que os investidores recomeçam a investir no futuro. Prevejo então duas partes distintas em 2003, uma queda violenta do PIB no 1º semestre, e uma recuperação no 2º semestre.
3.3. Taxa de Desemprego
O Desemprego reage com atraso em relação à evolução do PIB. A taxa de desemprego é de facto um lagging indicator, se desejar saber mais sobre o assunto poderá ler o meu artigo: Leading e lagging indicators
Na recessão de 1990 a taxa de desemprego nos EUA atingiu o máximo de 8%. Actualmente está nos 6%. É bastante previsível que em 2003 o desemprego vá aumentar, e que os 8% sejam ultrapassados, uma vez que esta recessão se prevê bastante mais grave que a de 1990.
Ao contrário do que prevejo para o PIB, com duas metades distintas em 2003, para a taxa de desemprego prevejo uma subida contínua ao longo de todo o 2003, para terminarmos o ano com a taxa entre os 8 e os 9% da população activa (infelizmente). Isto acontece devido ao carácter «lagger» do desemprego.
3.4. FED e Obrigações
Num ciclo económico normal, a expansão económica (aumento da procura), leva a uma subida da inflação. Os bancos centrais, para conterem a procura e a inflação, sobem as taxas de juro, condicionando o crédito, em suma, subindo o preço do dinheiro, a procura abranda, o Investimento e de seguida o Consumo caem e temos uma recessão num ciclo económico normal.
Para voltar a estimular o Investimento e o Consumo os bancos centrais começam a descer as taxas de juro, e a economia recupera e volta a crescer. É assim que funciona a política monetária num ciclo normal.
Mas este ciclo não é normal, repare-se. Houve uma grande expansão (de facto, foi a mais prolongada de sempre da história dos EUA), mas a inflação não subiu. Derivado de um elevado crescimento da produtividade, a inflação não subiu, logo o FED não subiu as taxas de juro para os 12-15% habituais no final da expansão. Pelo contrário, neste ciclo o máximo da FED Funds Rate foi 6,5%. Quando a economia começou a resvalar, o FED começou a cortar, a cortar, e neste momento as taxas de juro estão num mínimo de mais de 40 anos, aparentemente sem efeito na actividade económica.
É que num ciclo normal, a economia abranda por causa das elevadas taxas de juro. Neste ciclo, a economia abrandou por outros motivos. E, convenhamos, o estímulo dado por uma descida de taxas dos 15% para os 3-4% é diferente do estímulo dado por uma descida dos 6,5% para os 1,25%. O que se passa é que nunca neste ciclo existiu um problema de altas taxas de juro, logo baixá-las não é a solução, embora ajude a suavizar o downturn económico.
Neste momento a taxa de juro real (taxa de juro real = taxa de juro nominal - inflação) é negativa, o que sinaliza que os EUA estão na armadilha da liquidez referenciada por Keynes na sua obra de 1936 (Teoria Geral do Juro, do Emprego e do Capital), que serve de base a toda a teoria económica moderna. A «armadilha da liquidez» acontece quando o nível de taxas de juro é tão baixo que cortes adicionais já não estimulam a procura. Não funcionou até aqui, não vai funcionar, ponto final. E podem baixar até zero, é indiferente, como o foi no Japão (taxas de juro nominais no Japão são zero, a taxa de juro real é negativa).
A deflação, que aconteceu em 1930-1932 nos EUA em que os preços caíram 10% ao ano nesses 3 anos, tem consequências absolutamente catastróficas para a economia. É que reparem uma coisa: se os preços caem 10% ao ano, mesmo com taxas de juro nominais a 0% (não podem ser negativas, ninguém empresta dinheiro para receber menos, era bom hehe), a taxa de juro real é 10%, o que num período económico depressivo é, como disse, catastrófico. O Japão não está neste ponto, a sua deflação é suave, entre -1 e -2% ao ano no nível geral de preços.
Porém, a 21 de Novembro de 2002, foi proferido o mais importante discurso em termos macroeconómicos de 2002. Um dos Governadores do FED, Ben Bernanke, veio a palco com cartas na manga que o mercado não imaginaria que poderiam sair da boca de um Governador do FED. Leiam, que vale a pena:
Deflation: Making Sure "It" Doesn´t Happen Here
Basicamente, o Ben Bernanke disse que o FED tem em seu poder uma máquina de imprimir notas, e que a vai usar exaustivamente, injectando liquidez na economia de forma massiva, até inflar o nível geral de preços, não permitindo a deflação. E mais, no artigo ele enuncia outras ferramentas que o FED poderá usar, mesmo com a FED Funds Rate a 0%, na eventualidade de deflação. O mercado gravou as suas palavras como se fosse Deus a falar, não tenham dúvidas amigos. O mercado sabe que, num grande sell off, o FED vai entrar com tudo a imprimir massa monetária e vai inflar o mercado. Quais são as consequências disto? Vamos falar sobre isso mais à frente, mas uma imediata é uma enorme queda do dólar (que já está a acontecer, por falar nisso, já estão cobertos do risco de variação da taxa cambial, para quem investe nos EUA?) - já agora, sobre este assunto, ler Será preciso chamar os Keynesianos?, onde alerto para o perigo de queda abrupta do dólar, ainda estava ele nos 0.86 - 0.87 face ao euro.
Em termos de FED Funds Rate, penso que pode existir mais um corte de taxas no 1º semestre de 2003, provavelmente de 50 pontos base, para 0,75%. No final do ano o FED já estará a pensar subir taxas, mas poderá ter assumido compromissos com o mercado de que não iria subir nos 2 anos seguintes, uma cartada defendida por Ben Bernanke no seu discurso (assim como comprar todas as obrigações de longo prazo a uma determinada yield, imprimindo massa monetária, claro está).
A expectativa de deflação passará a inflação, algures no 1º semestre de 2003, é essa a minha previsão para os states (e para a Europa, devido à grande correlação dos mercados financeiros e políticas monetárias).
[img]phorum/uploaded/especulacao/2003_interestrates.gif[/img]
O Bull Market de longo das obrigações já dura desde 1980, são 22 anos de taxas de juro em queda nos EUA e no Mundo (com subidas ocasionais, mas sem pôr em causa a tendência de queda de longo prazo das yields das obrigações - subida dos preços).
Mas neste momento existem dois factores que têm o potencial de destruir este Bull Market, já em 2003, que são:
1º - Queda do dolar por êxodo dos capitais dos EUA. A tendência de queda do dolar que analisaremos mais à frente deverá continuar, pelo que a atractividade das obrigações norte-americanas diminuirá para os investidores estrangeiros, que são os maiores holders de obrigações americanas.
2º - O FED deverá tomar medidas absolutamente drásticas e inovadoras para reflacionar a economia (reflation é um tema que está a começar a ser falado nos meios económicos). Este recrudescimento da inflação será bastante negativo para as obrigações, se bem que o FED, como podemos ler no discurso de Ben Bernanke, possa comprometer-se a comprar obrigações de longo prazo a uma determinada yield, intervindo no mercado para manter artificialmente baixas as taxas de juro.
Como disse há pouco tempo o maior gestor de fundos de obrigações do Mundo, Bill Gross da Pimco, com as yields a 10 anos nos 3,8% e uma inflação de cerca de 2%, mais comissões e impostos, praticamente já não compensa investir em obrigações do Tesouro norte-americanas.
Se bem que não afirmo que possam vir aí quedas severas nas obrigações, e até aceite claramente que um novo mínimo histórico nas yields (máximo nos preços) possa ocorrer no 1º semestre de 2003, penso que já não há aqui um grande espaço de manobra ou uma elevada rendibilidade esperada nos seus investimentos. Penso que a rendibilidade esperada já não compensa o risco de um investimento em obrigações em termos de longo prazo.
3.5. Mercado Imobiliário
Este é de caras, é evidente que o único caminho para o mercado imobiliário nesta altura é o de queda (veja-se no gráfico o que aconteceu em 1991, mais de 1 ano depois da recessão - que foi suave, esta será mais grave). Quem leu o «Leading e Lagging Indicators» sabe que o mercado imobiliário reage com atraso em relação à actividade económica (assim como o Desemprego), e que em todos os ciclos, quando a Bolsa já vai em queda há largos meses ou até anos (dependendo da duração do ciclo expansivo) é que o mercado imobiliário atinge o seu máximo. Aliás, esta regra funciona de tal forma que para bem investir no mercado imobiliário basta observar o comportamento do seu leading indicator, o mercado accionista.
Se os índices de acções começam a descer, os investidores procuram refúgio e investem as mais valias geradas no Bull no mercado imobiliário, que tem a sua maior subida já com a Bolsa em queda. Porém, essa é a subida final, a seguir os preços caem ou pelo menos estagnam, dependendo da subida anterior. Por exemplo, como disse atrás no Japão os preços cairam mais de 80% a partir de 92, pois os preços anteriores eram ridículos do ponto de vista da racionalidade económica. No Mundo Ocidental actual não se foi tão longe como no Japão, mas mesmo observando o que se passa em Portugal, em que se vê perfeitamente que a oferta excede a potencial procura neste momento, os preços vão cair no mínimo 50% nos próximos 2 a 5 anos.
O mercado imobiliário é muito pouco líquido como sabemos (não se faz position trading nas casas :-) e a elasticidade preço-procura é muito baixa, ou seja, os preços são rígidos e não reagem imediatamente a retracções na procura. Mas é inevitável que o façam, são as leis da procura e da oferta que no longo prazo acabam por vigorar, apesar das teimosias ou convicções dos agentes do mercado em questão.
A provável subida de taxas de juro no início de 2004 fará cair o mercado imobiliário como um castelo de cartas, até cá no nosso país basta fazer umas contas para reconhecer que os preços actuais são meramente especulativos.
Agora, se eu quiser comprar uma casa por ir ter mais um filho, vou deixar de comprar? Não pá, eu não invisto em casas, eu vivo nelas, mas convém estar a par do que é racional do ponto de vista económico e do que não é, e endividar-se para comprar uma casa a 40 anos que está muito sobreavaliada é um erro. Talvez, se não houver grande necessidade, valha a pena esperar uns anos, até que a relação procura-oferta esmague os preços. Claro que no longo prazo volta a subir, para novos máximos, é uma questão de timing como em todos os mercados, quando toda a gente está a pensar comprar casas porque é um bom investimento de longo prazo é preciso abrir a mente à opinião contrária.
3.6. Endividamento e Crédito
Como vemos nestes gráficos a dívida global das empresas e das famílias tem crescido de forma exponencial, e esta tendência não é sustentável por muito mais tempo. Em vários artigos no passado escrevi sobre a necessidade de uma mudança de paradigma, em favor da poupança, para que o crescimento económico de longo prazo volte a ser sustentável.
Em equilíbrio macroeconómico Investimento = Poupança. Ora, se neste momento a taxa de poupança das famílias norte-americanas está em torno de zero, de onde poderá vir o investimento? De mais endividamento. Mas as dívidas, algures no tempo, serão pagas, não há almoços grátis. Por isso o Mundo está tão vulnerável a uma subida de taxas de juro, por mais pequena que seja.
Mas provavelmente será isso que vai consertar as coisas, diminuindo o Consumo e aumentando a Poupança, que mais tarde se tornará em Investimento produtivo. Taxas de juro tão baixas não estimulam a Poupança, mas sim um ainda maior endividamento. É um adiamento que terá um preço elevado, infelizmente. A coisa não se fará sem dor, mas pelo que temos observado da actuação dos principais governos capitalistas, parece que estão inclinados para a dor rápida (destruição criativa de Shumpeter) do que para o sofrimento quase indolor de longo prazo (caso Japonês).
A tendência de que falo, de diminuição do Crédito e do Endividamento, já começa a dar os seus primeiros sinais:
Ainda apenas por curiosidade, espreitem este site que contém um Relógio da Dívida, é engraçado:
3.7. Oferta de Moeda
O M3 (a castanho no gráfico), depois de subir bastante e continuamente desde o início de 1993, tem vindo a abrandar o seu crescimento, provavelmente devido à ligeira diminuição do crédito bancário que já se começou a verificar.
Segundo Ben Bernanke, se houver o perigo de deflação, a M3 vai voltar a crescer e de forma cada vez mais exponencial até que se dê a tal «reflation». O FED vai criar massa monetária, comprando obrigações do Tesouro de maturidade mais longa, comprando «corporate bonds» e possivelmente até acções no mercado accionista. Portanto, o investidor tem de estar alerta, o que pode parecer uma espiral deflacionista em 2003 pode na realidade ser o início de uma explosão da massa monetária - e de um processo inflacionista.
Desta forma a minha previsão para o crescimento da oferta de moeda, é que a taxa de crescimento desça até um determinado ponto de viragem no mercado, e de grande subida posterior até ao final de 2003. Ou seja, espero uma inflexão, patrocinada pelo FED (que é o Criador de moeda), no 1º semestre de 2003, para uma política monetária de excepção extremamente expansionista, utilizando meios pouco ortodoxos e alguns nunca experimentados na História.
Segundo o seu discurso, o FED está disposto a tudo para evitar a deflação. Vai utilizar todos os seus instrumentos, e o mercado sabe disso. Basta que o mercado lhes dê a desculpa para o fazer, e eles irão agir, embora provavelmente isso não venha anunciado nos jornais ou notícias da altura. Em certa altura, quando questionado, Alan Greenspan uma vez disse num comentário algo íntimo: «Às vezes desejo que venha aí um downturn do ciclo Kondratiev, para poder inundar o sistema de liquidez». Ele fê-lo em 1987 e evitou uma recessão. E agora prepara-se para fazê-lo novamente, utilizando tácticas nunca vistas na História do Capitalismo.
Na minha mente tudo se passará desta forma, e isso está patente no artigo «Os motivos de um Bear», numa parte que foi incompreendida por muitos: o Capitalismo precisa de alguma espécie de monopólio ou oligopólio para sobreviver. Em concorrência perfeita os lucros no longo prazo são zero em todas as industrias e o capitalismo morre. O que vai fazer o FED (baseado em Shumpeter) para manter o capitalismo? Vai ajudar os maiores e mais fortes, e vai deixar morrer os mais fracos e pequenos. Compra obrigações e papel comercial (e quem sabe acções) das empresas líderes em cada sector, e deixa a concorrência que está criar «oversupply» e a tirar «pricing power» definhar e falir, e quanto mais depressa melhor. É a unica forma, e a mais saudável (embora rude e dolorosa), de manter o actual status quo do capitalismo.
Traduzindo a ideia para a realidade portuguesa (talvez muito pequena e imberbe no capitalismo para servir de exemplo), trata-se de devolver as telecomunicações à PT, a banca aos grandes grupos tradicionais, enfim, devolver o mercado aos grandes para que estes sobrevivam, possam ganhar quota de mercado, voltar a subir os preços e lucrar. Nessa fase existirão muitas OPA´s, próprias de um mercado em transição do Bear para o Bull Market.
3.8. Confiança dos Consumidores
Reparem no gráfico. Nos períodos recessivos da economia, a confiança dos consumidores vem sempre a níveis do índice nos 50-60. Não há qualquer motivo para suspeitar que desta vez será diferente, antes pelo contrário.
O valor do mês de Dezembro 2002 fixou-se nos 80. Como referi na parte da previsão do PIB, tem sido o Consumo a manter o crescimento económico, e o Investimento estava em queda. Ora, para uma situação de inversão do ciclo económico, seria desejável o contrário, ou seja, recessão por causa do Consumo estar a diminuir, ao mesmo tempo que o Investimento já crescia.
E o Consumo irá cair velozmente no 1º semestre de 2003, é essa a minha previsão, com a Consumer Confidence a atingir os tais níveis nos 50 - 60. Mas, ao contrário do que poderá parecer à maioria das pessoas, essa é uma situação Bull, não Bear, repare-se na correlação negativa em termos históricos de longo prazo entre a consumer confidence e os mercados:
No início do maior Bull Market da história nos EUA, em 1982, o índice estava nos 50-60. No início de um dos maiores Bear Markets da história, em 2000, o índice estava nos 140. Por isso, cuidado com as notícias e com a interpretação dos media, normalmente eles não inserem os indicadores no seu contexto histórico, e a ideia que quero deixar passar é que quanto mais baixa a consumer confidence, mais bull está o mercado accionista. Quanto mais elevada a consumer confidence, mais Bear o mercado.
Também, não se estaria à espera que fosse a massa consumidora a prever de forma acertada o ciclo económico, pois não? Nos mercados e na economia, nos pontos de viragem, a multidão está sempre errada.
3.9. Inflação
Este gráfico tem demasiadas linhas e talvez seja confuso, mas o que nos interessa focar para esta análise é a linha verde a cheio, a que tem a variação homóloga do CPI. Como vemos na linha azul, na última década a variação do PPI já foi várias vezes negativa (especialmente em 2001 e 2002), pode falar-se em deflação no PPI.
No CPI, ainda que esteja em valores historicamente baixos, não se pode falar de deflação. Porém, com a queda do Consumo que prevejo, penso que o CPI cairá no vermelho no 1º semestre de 2003, dando a tal sensação de espiral deflacionista.
Nessa altura, como prometeu, o FED vai iniciar o processo de reflação já debatido e fulcral em todas as previsões macroeconómicas e de mercado que farei. E provavelmente na segunda metade do ano, o CPI vai voltar para positivo, e mais, pode ser que já seja algo elevado no início de 2004, porventura acima dos 4% em termos homólogos.
Deflação no 1º semestre, massiva injecção de liquidez por parte do FED iniciando um processo inflacionista, e terminamos 2003 e iniciamos 2004 com uma inflação já algo elevada, que poderá levar o FED a subir taxas de juro em 2004, mas isso talvez já seja ver demasiado longe e não nos interessa ...
3.10. A questão geopolítica
Penso que se tem exacerbado imenso o papel das tensões geo-políticas no desenvolvimento do ciclo macroeconómico global. De facto, em termos históricos os períodos de Guerra até costumam ser benfazejos para o crescimento económico, especialmente futuro, e como sabemos os mercados descontam o futuro ...
Há uns dias passou na CNBC uma sondagem que dizia que 89% dos americanos esperavam uma Guerra contra o Iraque, por isso o possível evento está quase totalmente descontado pelos investidores. Eu tenho uma visão muito particular, e potencialmente polémica, sobre esta questão, mas digo já que não estou muito informado (limito-me a ler artigos de especialistas sobre o assunto). Já que estamos nisto vou revelá-la, tendo em conta as limitações referidas:
Para mim o desejo de Guerra dos EUA com o Iraque tem pouco a ver com a existência ou não de armas de destruição massiva em posse do Governo de Saddam. O problema é o petróleo. É que o Iraque é o 2º país com as maiores reservas petrolíferas do Mundo (a par da Rússia), atrás da Arábia Saudita. Ora, a Arábia Saudita é (ou vinha sendo, até aqui) um dos aliados dos EUA no Médio Oriente. Porém, a população saudita não pode com os americanos, vi uma sondagem em que mais de 80% dos sauditas desaprovam o povo e cultura norte-americanas. E tenho lido que a CIA descobriu que o Governo da Arábia Saudita é o maior apoiante e patrocinador da Al Qaeda (não fosse o Bin Laden um saudita também).
Enfim, parece que os EUA estão a perder a amizade da Arábia Saudita, de longe o maior produtor de petróleo do Mundo e com as maiores reservas. E por aí se vê o crescente interesse nos lençóis petrolíferos do Iraque, os 2ºs maiores do mundo.
Ora, se não se espera que o Saddam e o Bush fiquem amigos de repente, seria bastante benéfico para os países ocidentais (especialmente para os EUA), em termos macroeconómicos (sabemos a importância do petróleo através da crise que aconteceu em 1973 com o 1º choque petrolífero) que houvesse uma mudança de regime no Iraque, apoiada pelos EUA, que equilibrásse as forças globais no campo petrolífero, no caso das hostilidades entre EUA e Arábia Saudita se concretizarem. Porventura o real desejo de Bush, obviamente não confessado, era atacar a Arábia Saudita e não o Iraque, mas primeiro há que salvaguardar a questão petrolífera.
Desde que existe civilização que Cristãos e Muçulmanos andam em Guerra. É uma Guerra religiosa que não terminou, pois para os Muçulmanos a Guerra é um instrumento legítimo para propagar a sua religião (os católicos também a utilizaram, com as cruzadas, por exemplo). A intensidade da Guerra Santa variou muito ao longo dos milénios, e há umas centenas de anos que não têm existido grandes tensões. Porém, se pensarmos que o Islamismo agora vai de Marrocos até ao Japão, com o surgimento de imensos novos países muçulmanos que anteriormente estavam afectos à União Soviética, podemos chegar à conclusão que o lado islâmico ganhou força e poder de impulsão nos últimos anos. A Al Qaeda baseia-se nisso, e se estão aparentemente calmos desde o 11 de Setembro (com alguns incidentes graves de permeio), é porque estão a retemperar forças para novo ataque.
Eu não sei como se resolve este imbróglio religioso estúpido, normalmente costuma ser com a abertura das sociedades e tolerância, mas infelizmente não é esse o caminho que as coisas estão a tomar, embora inevitavelmente no longo prazo o rumo da paz tenha de ser retomado, se queremos continuar a viver neste planeta ... é que há umas centenas de anos atrás nem a loucura de todos os homens juntos conseguia destruir o nosso lar, agora basta a loucura de um punhado de governantes.
brrrr, vamos passar à frente e falar de mercados. O que significa isto tudo para os mercados?
Significa que uma Guerra com o Iraque, substituindo o regime de Saddam e colocando no poder um Governo amigo do Ocidente, é bom para os mercados no médio prazo. Poderão cair alguma coisa derivado da notícia, mas se isso acontecer no contexto macroeconómico previsível (ou seja, depois ou durante uma grande queda dos mercados no 1º semestre de 2003), após a descida inicial a eclosão da Guerra constituirá uma excelente oportunidade de compra nos mercados accionistas mundiais.
Provavelmente as forças do Universo conjugar-se-ão para que os timings sejam mais ou menos alinhados, e a Guerra dos EUA versus Iraque comece mesmo algures entre Março e Junho de 2003. A Guerra não é o motivo das quedas, mas poderá fazer com que alguns holders larguem as acções, o que é Bull, exactamente como aconteceu depois do 11 de Setembro de 2001. Porém convinha que a coisa não fosse muito matemática, ou seja, que os mercados não começássem a subir logo a seguir à eclosão da Guerra, senão vai dizer-se que é por causa disso, quando o principal motivo é a acção do FED ... é complicado ... olhem, cheguei a uma conclusão ideal. Imaginemos um fundo no S&P, durante o 1º semestre de 2003, na casa dos 550-650 pontos. O fundo seria um padrão H&S invertido, e o segundo ombro seria derivado da Guerra, sem fazer novo mínimo seria claro o caminho de subida até ao final do ano ...
Mas, e agora que finalmente terminámos a primeira parte do artigo, vamos passar às previsões de mercados.
César Borja
1. Introdução
Este estudo tem o ambicioso objectivo de prever 2003 em termos de grandes variáveis macroeconómicas e de mercados financeiros que considero mais interessantes analisar nesta altura. Sabemos que prever, principalmente para o futuro, é algo bastante complicado e extremamente falível. Mas ainda assim, não viro as costas ao desafio. E isto porquê?
Porque acredito que para lucrar nos mercados é necessário prever. Seja uma previsão dos próximos 5 minutos ou do próximo ano, é preciso estudar, analisar, compreender a história, de forma a responder à questão: vai subir ou vai descer?
A Análise Técnica é uma forma de previsão, embora muitos que a utilizam não compreendam isso (porque preferem recusar que fazem previsões, como se estas fossem exclusivas dos bruxos, fossem algo não científico). A AT prevê com base nos preços e volumes passados. E é, para mim, a melhor ferramenta de previsão, pois traduz, a cada momento, o que os investidores em equilíbrio pensam do futuro. Mas existem outras ferramentas para prever o futuro. A História, por exemplo. Os mercados são cíclicos, alternando entre depressões pessimistas e euforias especulativas, normalmente com vários anos de intervalo entre cada fase. De facto, os anos de intervalo são tantos, que apenas estudando história se pode ter algum conhecimento acerca do assunto, ou então ser um investidor matusalém de 90 anos que ainda se lembra da Depressão dos anos 30 :-).
Na dicotomia opinião versus neutralidade opto de caras pela opinião. Os riscos são maiores, mas como sabemos quanto maior o risco maior a rendibilidade esperada. Depois posso ir corrigindo a previsão, adequando-a e actualizando-a com novos dados, mas sempre com o pensamento 6 meses à frente, que é como os mercados pensam. Reagir às notícias e factos de hoje é uma das formas mais seguras de perder dinheiro. Quem não se lembra do início de 2002, em que a recuperação económica no 2º semestre era uma certeza e que o Bull Market estava de volta? E eu perguntava, «mas, recuperação económica de quê, depois do PIB ter crescido 6,1% no 1º trimestre em termos anualizados, the only way is down».
As previsões são úteis para que se tenha um fio condutor, um caminho por onde orientar o pensamento e as movimentações no mercado. O caminho não é sempre a direito, tem rectas e curvas (algumas apertadas) e por vezes chegamos a um beco sem saída. Aí, há que procurar alternativas. Por outro lado, ao longo do percurso, vários sinais surgirão com indicações de mudanças de destino. É preciso saber que mudanças valem a pena, e quais são meras distracções que nos desviam do objectivo final.
Agora, qual o comportamento que o investidor racional deve ter face às previsões que apresentarei? Mera curiosidade, e interesse em relação aos motivos apresentados. Por amor de Deus, que ninguém se ponha a seguir isto, pois pode estar tudo errado, e mais, seguir a opinião de outros é outra forma bastante rápida e segura de perder dinheiro (há mais de 1.000 maneiras de perder dinheiro nos mercados... agora de ganhá-lo, há poucas). O raciocício que possa estar por trás das previsões é que pode ajudar alguém, embora seja impossível escrever tudo o que me leva a afirmar algo, por vezes nem eu sei porque digo o que digo. Tudo é simples e tudo é complexo. E não é com filosofias que vamos lá, por isso, meus amigos ...
Um bom 2003 e vamos ao trabalho !
2. A história de 2002

Para descrever sucintamente a história dos mercados mundiais em 2002 escolho o S&P 500, porque é o índice mais representativo do maior mercado accionista e da maior economia do Mundo, a dos EUA (cerca de 22% do PIB mundial). Mas também porque é o mercado líder incontestável, existindo uma grande (e crescente) correlação de quase todos os mercados mundiais com o norte-americano. Ainda hoje a forma mais fácil de comprar acções de todos os sectores ou até de múltiplos países é abrir uma conta numa corretora americana, é uma coisa que me entristece, Lisboa teria neste momento uma oportunidade única de criar praças que servissem a zona euro. Mas essa é outra questão que não podemos solucionar ou fazer alguma coisa, por isso vamos em frente.
2002 começou com expectativa, as pessoas estavam optimistas com a grande subida anterior - que foi uma correcção à queda exacerbada sem fundamento macroeconómico após o 11 de Setembro. Se não tivésse havido o 11 de Setembro, não teria caído tanto em tão pouco tempo e não teria havido um rebound tão poderoso, mas enfim, aconteceu essa catástrofe humanitária, lamentamos o sucedido.
Apesar da expectativa, Janeiro foi um mês de descidas no S&P 500, caiu 1,56%, o que era já um sinal de alerta, devido ao «January Effect». O efeito de Janeiro diz que se o mercado subir em Janeiro subirá no total do ano, e se descer em Janeiro vai descer no total do ano em causa. Claro que não é sempre assim, mas tem uma probabilidade estatística elevada de acontecer (é fácil de calcular, mas agora não temos tempo). Fevereiro e Março corresponderam à subida que levou ao topo duplo formado nos 1.176 pontos (ponto 2 no gráfico). Aqui não se vê, mas em Dezembro houve um ponto 1 também nos 1.176, que era uma importante resistência.
Na altura foi logo claro que o mercado não iria passar da resistência e que iria cair, e essa análise era uma das mais simples que se pode fazer: as notícias eram muito melhores no ponto 2 do que no ponto 1 (o que é Bear - ler O potencial de money in e money out). Enquanto que em Dezembro ainda só se falava nos ataques terroristas e na queda do Consumo derivado disso, em Março, no mesmo ponto de mercado, já só se falava no retorno ao crescimento económico vigoroso e na recuperação de longo prazo do mercado. Por essa altura escrevi um artigo importante, se quiserem ler ...
Os motivos de um Bear
Depois de atingir esse ponto 2 nos 1.176 pontos, o S&P mergulhou numa espiral descencente de -34% em 4 meses, quando atingiu um mínimo importante nos 775 pontos a 24 de Julho. Não era fácil identificar esse fundo. O mercado tinha uma tendência marcadamente descendente plenamente justificada pelos fundamentais. Estava oversold, mas isso já acontecia há bastante tempo e não impedia as quedas (as maiores descidas acontecem com os mercados já oversold, e as maiores subidas acontecem com os mercados já overbought). A certa altura a queda acelerou e nos 775 houve uma reacção, que apesar de ter uma amplitude assinalável, não era na minha opinião transaccionável, pois claramente o fundo único nos 775 não deveria ser o fundo absoluto do mercado, não tinha havido qualquer figura técnica de inversão.
Restava-nos shortar o rebound, eram H&S, falling wedges, possibilidade de duplo fundo, tudo em termos técnicos apontava para os 775. E foi lá novamente ! Nessa altura, todos os que estavam a ver o mesmo que eu, tomaram lucros. E não se sabia o que se iria passar, se quebrava os 775 seguindo a tendência de longo prazo, se andaria ali de lado a magoar o maior nº de pessoas, ou se pelo contrário iria tentar dar a impressão da formação de um duplo fundo, aproveitando o short covering nos 775 e o impulso sazonal de final do ano.
Sabemos agora que aconteceu a 3ª hipótese. Sem respirar, em apenas 4 sessões, o S&P fez a grande parte de todo o rebound de final do ano. Os que foram lá depois foram buscar migalhas, correndo elevados riscos, toda esta fase desde meio de Outubro até ao final de 2002 para mim não é senão uma grande fase de distribuição, a preparar, a fermentar, a grande queda do início de 2003.
Mas, ainda não chegámos às previsões, isso é bastante mais lá para a frente no artigo ... em 2002 o S&P está a cair (ainda faltam duas sessões) 24%, o que constitui o 3º ano consecutivo de descidas. Apenas uma vez na História o S&P desceu 4 anos consecutivos, que foi em 1929 - 1932. Será que se vai repetir a longínqua história da década de 30?
3. Previsões macroeconómicas e motivos
3.1. EUA versus Japão
Gráfico Nikkei 225 (desde 1982):

Lamentavelmente não consegui encontrar um gráfico mais expressivo do Nikkei 225, desde a 2ª Guerra Mundial, temos só este desde 1982 que é muito redutor da realidade histórica. Mas posso descrever muito sucintamente o que aconteceu no Japão.
O país ficou destruído na 2ª GM (ironicamente os dois grandes derrotados da Guerra são agora a 2ª e 3ª maiores economias mundiais), como todos sabemos. O esforço de reconstrução (com a ajuda dos EUA) foi enorme, e apenas em 1957 o Japão atingiu o mesmo patamar económico que tinha em 1940. Nos 13 anos seguintes até 1970 a economia nipónica cresceu a uma taxa média anual de 10%, a maior taxa de crescimento do Mundo. Em 1957 o Nikkei estava abaixo de 1.000 pontos, não posso precisar quantos pois falo de memória de um gráfico de longo prazo apresentado pelo José A.B. Machado, mas fica a ideia.
A partir de 1970 a taxa de crescimento do PIB abrandou um pouco, mas sempre acima dos 5% ao ano, e na década de 80 no mundo económico só se falava no milagre económico japonês, baseado essencialmente nas exportações. O Japão era competitivo, fazia melhor e a preços mais baixos, e as suas exportações tinham grande colocação no mercado mundial. Faziam melhores televisores, melhores carros (em 1980 o Japão ultrapassou em volume a produção de automóveis dos EUA), melhores aparelhagens, enfim ... o Nikkei teve um Bull Market gigantesco (merecido, pois o Japão passou de uma economia quase tradicional baseada na agricultura para uma economia de ponta, a 2ª maior do Mundo), que foi de menos de 1.000 pontos aos 40.000 pontos em cerca de 35 anos.
Como sempre acontece nestas coisas, no final a euforia transformou-se numa bolha especulativa, que inevitavelmente estoirou, e o Nikkei cai há 12 anos, estando neste momento nos mínimos dos últimos 19 anos. No topo, o PER de mercado do Nikkei era de 100, e só para termos uma ideia do que aconteceu no imobiliário (cuja bolha continuou bastante para além de 1990 - início do Bear nas acções), em 1992 um terreno do tamanho de um campo de futebol no centro de Tóquio valia mais a preços de mercado do que o Estado da Florida, nos EUA. O cartão de sócio de um clube de Golfe em Tóquio valia, em 1992, 1 milhão de US dolares, para vermos até onde vai a loucura dos homens, parecendo, a todos, normal. Esta bolha também estoirou, como acontece com todas as bolhas especulativas, e de 1992 para 2002 o preço médio da propriedade no Japão caiu mais de 80% (e ainda é o mais caro do Mundo - faz sentido que o seja, devido ao PIB per capita do país e densidade populacional, o valor do m2 de terreno no Japão em princípio valerá sempre mais do que em qualquer outro país do Mundo).
O milagre económico japonês baseava-se no constante aumento das exportações. E a forma de organização da economia, com um estado bastante forte e interligado com as empresas, que fomentavam o emprego para toda a vida. Este modelo parece esgotado, pois o sucesso na economia global já não se baseia na produção industrial, mais sim no sector terciário, na informação, no conhecimento.
O Japão tem outros problemas em voltar a repetir o milagre, dos quais vou destacar 4 principais:
1) O admirável sucesso dos anos 60-80 foi conseguido através de um sacrifício incrível da população, de uma vontade de vencer e um esforço que talvez nunca outra nação tenha feito na história. As gerações mais jovens não têm o mesmo espiríto de sacrifício, é normal, acontece assim com as empresas, com as famílias e com as nações.
2) A demografia. A taxa de crescimento da população no Japão está a diminuir bastante, e a população a ficar cada vez mais envelhecida (um problema de todos os países desenvolvidos). Um aumento da população faz sempre crescer a economia no longo prazo, em qualquer modelo macroeconómico.
3) O Japão não tem recursos naturais, o que constitui um sério problema para uma nação industrial.
4) A deflação. Os produtos industriais são quase «mercadorias» nesta altura, e com o aumento da concorrência e a baixa dos custos de produção, os produtos tendem a descer de preço e a emagrecer as taxas de lucro das empresas, o que traz problemas ao Estado devido a uma menor colecta de impostos e aumento de desemprego (o desemprego no Japão está no máximo desde a 2ª GM).
A melhor saída para o Japão seria um entendimento e um estreitar de relações económicas com a China e a Rússia, é sugerida até por alguns autores uma trilogia vencedora, o conhecimento e tecnologia japonesa, aliados à população chinesa e aos recursos energéticos de uma Sibéria poderia criar um novo milagre económico e provavelmente a mais próspera zona económica do Mundo (não que a China não o consiga fazer sozinha).
Mas isto são questões de muito longo prazo, voltando a um ponto atrás, a relação entre o Estado, as empresas e os trabalhadores constitui um problema ao desenvolvimento económico normal no Japão (não um milagre, mas digamos, uma taxa de crescimento do produto potencial de uns 2-3% ao ano). É que no Japão muito dificilmente as empresas vão à falência. O Estado não deixa o mercado funcionar. Os mercados estão saturados, não existe «pricing power» e ainda assim o Estado procura manter artificialmente as empresas deficitárias (principalmente os bancos, muitos estão insolventes, mas o Governo, à custa de um défice orçamental de 8% do PIB - o maior do Mundo, o que diria a Comissão Europeia se a Ferreira Leite apresentásse um défice destes? hehe - não os deixa cair).
Se bem que existem alguns sinais ténues de reestruturação e de comprometimento com as leis do mercado, parece que ainda há muita dor para ser sentida pelos japoneses antes desta longa Depressão acabar, infelizmente.
É aqui que está a maior diferença com os EUA !!! É que o Governo dos EUA e também do UK está a deixar cair as empresas com prejuízos, não se preocupando com os efeitos sociais de tal postura. Vejam-se os recentes casos da UAL e da British Aerospace. Pedem ajuda ao Estado e o Estado vira-lhes as costas. É uma diferença fulcral, por estas linhas se escreve a História, e entre Keynes e Shumpeter as economias ocidentais estão a optar por Shumpeter, o que poderá ter consequências bastante graves no curto prazo, mas provavelmente garantir o sucesso de longo prazo.
Mas vamos a um gráfico do S&P 500, para comparar a situação americana com a japonesa:
Gráfico S&P 500 (desde 1980):

Começamos já por uma diferença importante, a bolha especulativa foi menor nos EUA que no Japão. O Nikkei subiu, em termos de longo prazo, durante cerca de 33 anos, antes de estoirar. O S&P subiu só 18 anos. O Nikkei valorizou-se 40 vezes, o S&P apenas 15 vezes. Tudo bem que a taxa média de crescimento anual do PIB no Japão entre 1957 e 1990 foi superior à dos states nos anos 1982-2000, mas fica registado o facto do Bull Market ter tido uma menor dimensão nos states do que no Japão, pelo que se poderá pensar que também o Bear Market terá uma menor duração temporal nos EUA que no Japão.
Por outro lado, o PER do Nikkei 225 no topo era de 100, enquanto o do S&P em 2000 era de 42. Os excessos cometidos não parecem ter sido, portanto, tão graves nos EUA comparativamente ao Japão.
A economia dos EUA, baseada no sector terciário, na informação e no conhecimento, tem vantagens futuras sobre a economia japonesa ainda baseada no sector secundário. Realçando estas diferenças estruturais, continuo a afirmar que os decisores políticos e económicos nas economias ocidentais de mercado devem ter os olhos postos e bem postos na experiência japonesa, principalmente no que se refere aos problemas da armadilha da liquidez (taxas de juro a zero não estimulam a economia, devido à saturação de mercados, ausência de pricing power e sobre-endividamento das famílias e empresas) e da deflação.
E eles estão atentos. E estão a agir de forma diferente. Vão deixar o mercado funcionar. O dólar já está a ir por aí abaixo em flecha (só tinha que ser, está muito sobre-avaliado), e o que tem que falir está a falir, as empresas mais fortes sobreviverão e ganharão market share, os endividados pagarão as suas dívidas ou declaram falência, e a economia, em princípio, surgirá das cinzas novamente saudável e com potencial de crescimento de longo prazo. Claro que isto demorará talvez uns anos, mas em termos de mercados deverão existir swings interessantes em 2003, como veremos mais à frente ...
3.2. PIB

(PIB = Consumo + Investimento + Exportações - Importações)
Não é visível no gráfico, mas em 5 das últimas 6 recessões houve um double dip (a de 1990 foi a excepção). Portanto, o double dip económico é mais a regra do que a excepção. Comparando a recessão de 1990 com a de 2001 (recessão = dois trimestres consecutivos de variação negativa do PIB real), vemos que a de 1990 foi bastante mais grave. No entanto, derivado dessa recessão, o S&P caiu apenas 20%, e actualmente cai 42% do máximo histórico. Adicionalmente, o mercado está bastante abaixo do que estava quando se viveu a suave recessão de 2001.
Outra questão importantíssima é a estrutrura do crescimento económico. É que o ciclo económico prepara uma recessão começando sempre por uma quebra do Investimento (leading indicator), mas é quando o Consumo (coincident indicator) cai que vem a verdadeira recessão (pois o Consumo normalmente contribui com 2/3 para o PIB). Normalmente, na recessão, o Investimento até já está a recuperar, mas a queda do Consumo mais do que compensa negativamente a subida do Investimento. Essa é a estrutura de variação das componentes do PIB que favorece e sinaliza o crescimento económico futuro.
Ora, a recessão de 2001 foi causada por uma quebra fortíssima do Investimento, mas o Consumo aguentou o PIB. O mercado está claramente a prever um segundo dip, que constituiria o tal double dip, que virá naturalmente, como a história nos ensina, com a capitulação do consumidor norte-americano. Não tem hipótese, principalmente devido ao seu endividamento, mas também porque é assim que o ciclo económico se desenvolve.
Acredito que o segundo dip, bastante mais carregado que o do final de 2001, venha agora no 1º semestre de 2003, devido à queda abrupta do Consumo. Será muito importante, nessa altura, verificar a estrutura do crescimento do PIB, pois se o Consumo cair enquanto o Investimento der sinais de ligeira melhoria, temos uma clássica situação macroeconómica bull, com o povo consumidor a baixar os braços precisamente no momento em que os investidores recomeçam a investir no futuro. Prevejo então duas partes distintas em 2003, uma queda violenta do PIB no 1º semestre, e uma recuperação no 2º semestre.
3.3. Taxa de Desemprego

O Desemprego reage com atraso em relação à evolução do PIB. A taxa de desemprego é de facto um lagging indicator, se desejar saber mais sobre o assunto poderá ler o meu artigo: Leading e lagging indicators
Na recessão de 1990 a taxa de desemprego nos EUA atingiu o máximo de 8%. Actualmente está nos 6%. É bastante previsível que em 2003 o desemprego vá aumentar, e que os 8% sejam ultrapassados, uma vez que esta recessão se prevê bastante mais grave que a de 1990.
Ao contrário do que prevejo para o PIB, com duas metades distintas em 2003, para a taxa de desemprego prevejo uma subida contínua ao longo de todo o 2003, para terminarmos o ano com a taxa entre os 8 e os 9% da população activa (infelizmente). Isto acontece devido ao carácter «lagger» do desemprego.
3.4. FED e Obrigações

Num ciclo económico normal, a expansão económica (aumento da procura), leva a uma subida da inflação. Os bancos centrais, para conterem a procura e a inflação, sobem as taxas de juro, condicionando o crédito, em suma, subindo o preço do dinheiro, a procura abranda, o Investimento e de seguida o Consumo caem e temos uma recessão num ciclo económico normal.
Para voltar a estimular o Investimento e o Consumo os bancos centrais começam a descer as taxas de juro, e a economia recupera e volta a crescer. É assim que funciona a política monetária num ciclo normal.
Mas este ciclo não é normal, repare-se. Houve uma grande expansão (de facto, foi a mais prolongada de sempre da história dos EUA), mas a inflação não subiu. Derivado de um elevado crescimento da produtividade, a inflação não subiu, logo o FED não subiu as taxas de juro para os 12-15% habituais no final da expansão. Pelo contrário, neste ciclo o máximo da FED Funds Rate foi 6,5%. Quando a economia começou a resvalar, o FED começou a cortar, a cortar, e neste momento as taxas de juro estão num mínimo de mais de 40 anos, aparentemente sem efeito na actividade económica.
É que num ciclo normal, a economia abranda por causa das elevadas taxas de juro. Neste ciclo, a economia abrandou por outros motivos. E, convenhamos, o estímulo dado por uma descida de taxas dos 15% para os 3-4% é diferente do estímulo dado por uma descida dos 6,5% para os 1,25%. O que se passa é que nunca neste ciclo existiu um problema de altas taxas de juro, logo baixá-las não é a solução, embora ajude a suavizar o downturn económico.
Neste momento a taxa de juro real (taxa de juro real = taxa de juro nominal - inflação) é negativa, o que sinaliza que os EUA estão na armadilha da liquidez referenciada por Keynes na sua obra de 1936 (Teoria Geral do Juro, do Emprego e do Capital), que serve de base a toda a teoria económica moderna. A «armadilha da liquidez» acontece quando o nível de taxas de juro é tão baixo que cortes adicionais já não estimulam a procura. Não funcionou até aqui, não vai funcionar, ponto final. E podem baixar até zero, é indiferente, como o foi no Japão (taxas de juro nominais no Japão são zero, a taxa de juro real é negativa).
A deflação, que aconteceu em 1930-1932 nos EUA em que os preços caíram 10% ao ano nesses 3 anos, tem consequências absolutamente catastróficas para a economia. É que reparem uma coisa: se os preços caem 10% ao ano, mesmo com taxas de juro nominais a 0% (não podem ser negativas, ninguém empresta dinheiro para receber menos, era bom hehe), a taxa de juro real é 10%, o que num período económico depressivo é, como disse, catastrófico. O Japão não está neste ponto, a sua deflação é suave, entre -1 e -2% ao ano no nível geral de preços.
Porém, a 21 de Novembro de 2002, foi proferido o mais importante discurso em termos macroeconómicos de 2002. Um dos Governadores do FED, Ben Bernanke, veio a palco com cartas na manga que o mercado não imaginaria que poderiam sair da boca de um Governador do FED. Leiam, que vale a pena:
Deflation: Making Sure "It" Doesn´t Happen Here
Basicamente, o Ben Bernanke disse que o FED tem em seu poder uma máquina de imprimir notas, e que a vai usar exaustivamente, injectando liquidez na economia de forma massiva, até inflar o nível geral de preços, não permitindo a deflação. E mais, no artigo ele enuncia outras ferramentas que o FED poderá usar, mesmo com a FED Funds Rate a 0%, na eventualidade de deflação. O mercado gravou as suas palavras como se fosse Deus a falar, não tenham dúvidas amigos. O mercado sabe que, num grande sell off, o FED vai entrar com tudo a imprimir massa monetária e vai inflar o mercado. Quais são as consequências disto? Vamos falar sobre isso mais à frente, mas uma imediata é uma enorme queda do dólar (que já está a acontecer, por falar nisso, já estão cobertos do risco de variação da taxa cambial, para quem investe nos EUA?) - já agora, sobre este assunto, ler Será preciso chamar os Keynesianos?, onde alerto para o perigo de queda abrupta do dólar, ainda estava ele nos 0.86 - 0.87 face ao euro.
Em termos de FED Funds Rate, penso que pode existir mais um corte de taxas no 1º semestre de 2003, provavelmente de 50 pontos base, para 0,75%. No final do ano o FED já estará a pensar subir taxas, mas poderá ter assumido compromissos com o mercado de que não iria subir nos 2 anos seguintes, uma cartada defendida por Ben Bernanke no seu discurso (assim como comprar todas as obrigações de longo prazo a uma determinada yield, imprimindo massa monetária, claro está).
A expectativa de deflação passará a inflação, algures no 1º semestre de 2003, é essa a minha previsão para os states (e para a Europa, devido à grande correlação dos mercados financeiros e políticas monetárias).
[img]phorum/uploaded/especulacao/2003_interestrates.gif[/img]
O Bull Market de longo das obrigações já dura desde 1980, são 22 anos de taxas de juro em queda nos EUA e no Mundo (com subidas ocasionais, mas sem pôr em causa a tendência de queda de longo prazo das yields das obrigações - subida dos preços).
Mas neste momento existem dois factores que têm o potencial de destruir este Bull Market, já em 2003, que são:
1º - Queda do dolar por êxodo dos capitais dos EUA. A tendência de queda do dolar que analisaremos mais à frente deverá continuar, pelo que a atractividade das obrigações norte-americanas diminuirá para os investidores estrangeiros, que são os maiores holders de obrigações americanas.
2º - O FED deverá tomar medidas absolutamente drásticas e inovadoras para reflacionar a economia (reflation é um tema que está a começar a ser falado nos meios económicos). Este recrudescimento da inflação será bastante negativo para as obrigações, se bem que o FED, como podemos ler no discurso de Ben Bernanke, possa comprometer-se a comprar obrigações de longo prazo a uma determinada yield, intervindo no mercado para manter artificialmente baixas as taxas de juro.
Como disse há pouco tempo o maior gestor de fundos de obrigações do Mundo, Bill Gross da Pimco, com as yields a 10 anos nos 3,8% e uma inflação de cerca de 2%, mais comissões e impostos, praticamente já não compensa investir em obrigações do Tesouro norte-americanas.
Se bem que não afirmo que possam vir aí quedas severas nas obrigações, e até aceite claramente que um novo mínimo histórico nas yields (máximo nos preços) possa ocorrer no 1º semestre de 2003, penso que já não há aqui um grande espaço de manobra ou uma elevada rendibilidade esperada nos seus investimentos. Penso que a rendibilidade esperada já não compensa o risco de um investimento em obrigações em termos de longo prazo.
3.5. Mercado Imobiliário

Este é de caras, é evidente que o único caminho para o mercado imobiliário nesta altura é o de queda (veja-se no gráfico o que aconteceu em 1991, mais de 1 ano depois da recessão - que foi suave, esta será mais grave). Quem leu o «Leading e Lagging Indicators» sabe que o mercado imobiliário reage com atraso em relação à actividade económica (assim como o Desemprego), e que em todos os ciclos, quando a Bolsa já vai em queda há largos meses ou até anos (dependendo da duração do ciclo expansivo) é que o mercado imobiliário atinge o seu máximo. Aliás, esta regra funciona de tal forma que para bem investir no mercado imobiliário basta observar o comportamento do seu leading indicator, o mercado accionista.
Se os índices de acções começam a descer, os investidores procuram refúgio e investem as mais valias geradas no Bull no mercado imobiliário, que tem a sua maior subida já com a Bolsa em queda. Porém, essa é a subida final, a seguir os preços caem ou pelo menos estagnam, dependendo da subida anterior. Por exemplo, como disse atrás no Japão os preços cairam mais de 80% a partir de 92, pois os preços anteriores eram ridículos do ponto de vista da racionalidade económica. No Mundo Ocidental actual não se foi tão longe como no Japão, mas mesmo observando o que se passa em Portugal, em que se vê perfeitamente que a oferta excede a potencial procura neste momento, os preços vão cair no mínimo 50% nos próximos 2 a 5 anos.
O mercado imobiliário é muito pouco líquido como sabemos (não se faz position trading nas casas :-) e a elasticidade preço-procura é muito baixa, ou seja, os preços são rígidos e não reagem imediatamente a retracções na procura. Mas é inevitável que o façam, são as leis da procura e da oferta que no longo prazo acabam por vigorar, apesar das teimosias ou convicções dos agentes do mercado em questão.
A provável subida de taxas de juro no início de 2004 fará cair o mercado imobiliário como um castelo de cartas, até cá no nosso país basta fazer umas contas para reconhecer que os preços actuais são meramente especulativos.
Agora, se eu quiser comprar uma casa por ir ter mais um filho, vou deixar de comprar? Não pá, eu não invisto em casas, eu vivo nelas, mas convém estar a par do que é racional do ponto de vista económico e do que não é, e endividar-se para comprar uma casa a 40 anos que está muito sobreavaliada é um erro. Talvez, se não houver grande necessidade, valha a pena esperar uns anos, até que a relação procura-oferta esmague os preços. Claro que no longo prazo volta a subir, para novos máximos, é uma questão de timing como em todos os mercados, quando toda a gente está a pensar comprar casas porque é um bom investimento de longo prazo é preciso abrir a mente à opinião contrária.
3.6. Endividamento e Crédito

Como vemos nestes gráficos a dívida global das empresas e das famílias tem crescido de forma exponencial, e esta tendência não é sustentável por muito mais tempo. Em vários artigos no passado escrevi sobre a necessidade de uma mudança de paradigma, em favor da poupança, para que o crescimento económico de longo prazo volte a ser sustentável.
Em equilíbrio macroeconómico Investimento = Poupança. Ora, se neste momento a taxa de poupança das famílias norte-americanas está em torno de zero, de onde poderá vir o investimento? De mais endividamento. Mas as dívidas, algures no tempo, serão pagas, não há almoços grátis. Por isso o Mundo está tão vulnerável a uma subida de taxas de juro, por mais pequena que seja.
Mas provavelmente será isso que vai consertar as coisas, diminuindo o Consumo e aumentando a Poupança, que mais tarde se tornará em Investimento produtivo. Taxas de juro tão baixas não estimulam a Poupança, mas sim um ainda maior endividamento. É um adiamento que terá um preço elevado, infelizmente. A coisa não se fará sem dor, mas pelo que temos observado da actuação dos principais governos capitalistas, parece que estão inclinados para a dor rápida (destruição criativa de Shumpeter) do que para o sofrimento quase indolor de longo prazo (caso Japonês).
A tendência de que falo, de diminuição do Crédito e do Endividamento, já começa a dar os seus primeiros sinais:

Ainda apenas por curiosidade, espreitem este site que contém um Relógio da Dívida, é engraçado:

3.7. Oferta de Moeda

O M3 (a castanho no gráfico), depois de subir bastante e continuamente desde o início de 1993, tem vindo a abrandar o seu crescimento, provavelmente devido à ligeira diminuição do crédito bancário que já se começou a verificar.
Segundo Ben Bernanke, se houver o perigo de deflação, a M3 vai voltar a crescer e de forma cada vez mais exponencial até que se dê a tal «reflation». O FED vai criar massa monetária, comprando obrigações do Tesouro de maturidade mais longa, comprando «corporate bonds» e possivelmente até acções no mercado accionista. Portanto, o investidor tem de estar alerta, o que pode parecer uma espiral deflacionista em 2003 pode na realidade ser o início de uma explosão da massa monetária - e de um processo inflacionista.
Desta forma a minha previsão para o crescimento da oferta de moeda, é que a taxa de crescimento desça até um determinado ponto de viragem no mercado, e de grande subida posterior até ao final de 2003. Ou seja, espero uma inflexão, patrocinada pelo FED (que é o Criador de moeda), no 1º semestre de 2003, para uma política monetária de excepção extremamente expansionista, utilizando meios pouco ortodoxos e alguns nunca experimentados na História.
Segundo o seu discurso, o FED está disposto a tudo para evitar a deflação. Vai utilizar todos os seus instrumentos, e o mercado sabe disso. Basta que o mercado lhes dê a desculpa para o fazer, e eles irão agir, embora provavelmente isso não venha anunciado nos jornais ou notícias da altura. Em certa altura, quando questionado, Alan Greenspan uma vez disse num comentário algo íntimo: «Às vezes desejo que venha aí um downturn do ciclo Kondratiev, para poder inundar o sistema de liquidez». Ele fê-lo em 1987 e evitou uma recessão. E agora prepara-se para fazê-lo novamente, utilizando tácticas nunca vistas na História do Capitalismo.
Na minha mente tudo se passará desta forma, e isso está patente no artigo «Os motivos de um Bear», numa parte que foi incompreendida por muitos: o Capitalismo precisa de alguma espécie de monopólio ou oligopólio para sobreviver. Em concorrência perfeita os lucros no longo prazo são zero em todas as industrias e o capitalismo morre. O que vai fazer o FED (baseado em Shumpeter) para manter o capitalismo? Vai ajudar os maiores e mais fortes, e vai deixar morrer os mais fracos e pequenos. Compra obrigações e papel comercial (e quem sabe acções) das empresas líderes em cada sector, e deixa a concorrência que está criar «oversupply» e a tirar «pricing power» definhar e falir, e quanto mais depressa melhor. É a unica forma, e a mais saudável (embora rude e dolorosa), de manter o actual status quo do capitalismo.
Traduzindo a ideia para a realidade portuguesa (talvez muito pequena e imberbe no capitalismo para servir de exemplo), trata-se de devolver as telecomunicações à PT, a banca aos grandes grupos tradicionais, enfim, devolver o mercado aos grandes para que estes sobrevivam, possam ganhar quota de mercado, voltar a subir os preços e lucrar. Nessa fase existirão muitas OPA´s, próprias de um mercado em transição do Bear para o Bull Market.
3.8. Confiança dos Consumidores

Reparem no gráfico. Nos períodos recessivos da economia, a confiança dos consumidores vem sempre a níveis do índice nos 50-60. Não há qualquer motivo para suspeitar que desta vez será diferente, antes pelo contrário.
O valor do mês de Dezembro 2002 fixou-se nos 80. Como referi na parte da previsão do PIB, tem sido o Consumo a manter o crescimento económico, e o Investimento estava em queda. Ora, para uma situação de inversão do ciclo económico, seria desejável o contrário, ou seja, recessão por causa do Consumo estar a diminuir, ao mesmo tempo que o Investimento já crescia.
E o Consumo irá cair velozmente no 1º semestre de 2003, é essa a minha previsão, com a Consumer Confidence a atingir os tais níveis nos 50 - 60. Mas, ao contrário do que poderá parecer à maioria das pessoas, essa é uma situação Bull, não Bear, repare-se na correlação negativa em termos históricos de longo prazo entre a consumer confidence e os mercados:
No início do maior Bull Market da história nos EUA, em 1982, o índice estava nos 50-60. No início de um dos maiores Bear Markets da história, em 2000, o índice estava nos 140. Por isso, cuidado com as notícias e com a interpretação dos media, normalmente eles não inserem os indicadores no seu contexto histórico, e a ideia que quero deixar passar é que quanto mais baixa a consumer confidence, mais bull está o mercado accionista. Quanto mais elevada a consumer confidence, mais Bear o mercado.
Também, não se estaria à espera que fosse a massa consumidora a prever de forma acertada o ciclo económico, pois não? Nos mercados e na economia, nos pontos de viragem, a multidão está sempre errada.
3.9. Inflação

Este gráfico tem demasiadas linhas e talvez seja confuso, mas o que nos interessa focar para esta análise é a linha verde a cheio, a que tem a variação homóloga do CPI. Como vemos na linha azul, na última década a variação do PPI já foi várias vezes negativa (especialmente em 2001 e 2002), pode falar-se em deflação no PPI.
No CPI, ainda que esteja em valores historicamente baixos, não se pode falar de deflação. Porém, com a queda do Consumo que prevejo, penso que o CPI cairá no vermelho no 1º semestre de 2003, dando a tal sensação de espiral deflacionista.
Nessa altura, como prometeu, o FED vai iniciar o processo de reflação já debatido e fulcral em todas as previsões macroeconómicas e de mercado que farei. E provavelmente na segunda metade do ano, o CPI vai voltar para positivo, e mais, pode ser que já seja algo elevado no início de 2004, porventura acima dos 4% em termos homólogos.
Deflação no 1º semestre, massiva injecção de liquidez por parte do FED iniciando um processo inflacionista, e terminamos 2003 e iniciamos 2004 com uma inflação já algo elevada, que poderá levar o FED a subir taxas de juro em 2004, mas isso talvez já seja ver demasiado longe e não nos interessa ...
3.10. A questão geopolítica
Penso que se tem exacerbado imenso o papel das tensões geo-políticas no desenvolvimento do ciclo macroeconómico global. De facto, em termos históricos os períodos de Guerra até costumam ser benfazejos para o crescimento económico, especialmente futuro, e como sabemos os mercados descontam o futuro ...
Há uns dias passou na CNBC uma sondagem que dizia que 89% dos americanos esperavam uma Guerra contra o Iraque, por isso o possível evento está quase totalmente descontado pelos investidores. Eu tenho uma visão muito particular, e potencialmente polémica, sobre esta questão, mas digo já que não estou muito informado (limito-me a ler artigos de especialistas sobre o assunto). Já que estamos nisto vou revelá-la, tendo em conta as limitações referidas:
Para mim o desejo de Guerra dos EUA com o Iraque tem pouco a ver com a existência ou não de armas de destruição massiva em posse do Governo de Saddam. O problema é o petróleo. É que o Iraque é o 2º país com as maiores reservas petrolíferas do Mundo (a par da Rússia), atrás da Arábia Saudita. Ora, a Arábia Saudita é (ou vinha sendo, até aqui) um dos aliados dos EUA no Médio Oriente. Porém, a população saudita não pode com os americanos, vi uma sondagem em que mais de 80% dos sauditas desaprovam o povo e cultura norte-americanas. E tenho lido que a CIA descobriu que o Governo da Arábia Saudita é o maior apoiante e patrocinador da Al Qaeda (não fosse o Bin Laden um saudita também).
Enfim, parece que os EUA estão a perder a amizade da Arábia Saudita, de longe o maior produtor de petróleo do Mundo e com as maiores reservas. E por aí se vê o crescente interesse nos lençóis petrolíferos do Iraque, os 2ºs maiores do mundo.
Ora, se não se espera que o Saddam e o Bush fiquem amigos de repente, seria bastante benéfico para os países ocidentais (especialmente para os EUA), em termos macroeconómicos (sabemos a importância do petróleo através da crise que aconteceu em 1973 com o 1º choque petrolífero) que houvesse uma mudança de regime no Iraque, apoiada pelos EUA, que equilibrásse as forças globais no campo petrolífero, no caso das hostilidades entre EUA e Arábia Saudita se concretizarem. Porventura o real desejo de Bush, obviamente não confessado, era atacar a Arábia Saudita e não o Iraque, mas primeiro há que salvaguardar a questão petrolífera.
Desde que existe civilização que Cristãos e Muçulmanos andam em Guerra. É uma Guerra religiosa que não terminou, pois para os Muçulmanos a Guerra é um instrumento legítimo para propagar a sua religião (os católicos também a utilizaram, com as cruzadas, por exemplo). A intensidade da Guerra Santa variou muito ao longo dos milénios, e há umas centenas de anos que não têm existido grandes tensões. Porém, se pensarmos que o Islamismo agora vai de Marrocos até ao Japão, com o surgimento de imensos novos países muçulmanos que anteriormente estavam afectos à União Soviética, podemos chegar à conclusão que o lado islâmico ganhou força e poder de impulsão nos últimos anos. A Al Qaeda baseia-se nisso, e se estão aparentemente calmos desde o 11 de Setembro (com alguns incidentes graves de permeio), é porque estão a retemperar forças para novo ataque.
Eu não sei como se resolve este imbróglio religioso estúpido, normalmente costuma ser com a abertura das sociedades e tolerância, mas infelizmente não é esse o caminho que as coisas estão a tomar, embora inevitavelmente no longo prazo o rumo da paz tenha de ser retomado, se queremos continuar a viver neste planeta ... é que há umas centenas de anos atrás nem a loucura de todos os homens juntos conseguia destruir o nosso lar, agora basta a loucura de um punhado de governantes.
brrrr, vamos passar à frente e falar de mercados. O que significa isto tudo para os mercados?
Significa que uma Guerra com o Iraque, substituindo o regime de Saddam e colocando no poder um Governo amigo do Ocidente, é bom para os mercados no médio prazo. Poderão cair alguma coisa derivado da notícia, mas se isso acontecer no contexto macroeconómico previsível (ou seja, depois ou durante uma grande queda dos mercados no 1º semestre de 2003), após a descida inicial a eclosão da Guerra constituirá uma excelente oportunidade de compra nos mercados accionistas mundiais.
Provavelmente as forças do Universo conjugar-se-ão para que os timings sejam mais ou menos alinhados, e a Guerra dos EUA versus Iraque comece mesmo algures entre Março e Junho de 2003. A Guerra não é o motivo das quedas, mas poderá fazer com que alguns holders larguem as acções, o que é Bull, exactamente como aconteceu depois do 11 de Setembro de 2001. Porém convinha que a coisa não fosse muito matemática, ou seja, que os mercados não começássem a subir logo a seguir à eclosão da Guerra, senão vai dizer-se que é por causa disso, quando o principal motivo é a acção do FED ... é complicado ... olhem, cheguei a uma conclusão ideal. Imaginemos um fundo no S&P, durante o 1º semestre de 2003, na casa dos 550-650 pontos. O fundo seria um padrão H&S invertido, e o segundo ombro seria derivado da Guerra, sem fazer novo mínimo seria claro o caminho de subida até ao final do ano ...
Mas, e agora que finalmente terminámos a primeira parte do artigo, vamos passar às previsões de mercados.
César Borja
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