Efeito bola de neve - a biografia de Warren Buffet
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Efeito bola de neve - a biografia de Warren Buffet
O Público publicou no seu suplemento "Economia" da passada sexta feira um excerto do capítulo 8 do livro "Efeito bola de neve - a biografia de Warren Buffet, o homem mais rico do mundo".
Com a devida venia ao jornal aqui se transcreve esse texto - o livro ainda não saiu mas..., por razões varias (mais ludicas do que de formação), parece-me de leitura obrigatória.
Para conseguir escrever o livro "Efeito bola de neve - a biografia de Warren Buffett, o homem mais rico do mundo", Alice Schroeder teve um acesso pouco comum ao empresário e ao seu círculo de negócios. O resultado
é uma obra onde se descobre a pessoa e os caminhos que o levaram até
ao cume de uma das maiores fortunas do planeta
Warren Buffett ganhou os seus primeiros cêntimos a vender pacotes de pastilhas elásticas. E desde o dia em que começou - aos seis anos - mostrou sempre uma atitude inflexível para com os seus clientes, o que revelava muito sobre o seu estilo no futuro.
"Eu tinha um pequeno tabuleiro verde, dividido em cinco áreas. Tenho quase a certeza de que me foi oferecido pela minha tia Edie. Tinha compartimentos para cinco tipos diferentes de pastilha, Juicy Fruit, Spearmint, Doublemint e por aí fora. Comprava pacotes de pastilhas ao meu avô e ia vendê-los de porta em porta pela vizinhança. Fazia isso quase sempre à noite.
Lembro-me de uma mulher chamada Virginia Macoubrie dizer: 'Fico com uma pastilha Juicy Fruit.' E de eu lhe responder: 'Não abrimos pacotes de pastilhas' - ou seja, tenho os meus princípios. Ainda me lembro, como se fosse hoje, da senhora Macoubrie a dizer que só queria uma pastilha. Não, só vendia pacotes de cinco pastilhas. Custavam cinco cêntimos e ela só queria gastar um cêntimo comigo."
Conseguir vender era tentador mas não era o suficiente para o fazer mudar de ideias. Se vendesse uma pastilha a Virginia Macoubrie, ficava com outras quatro para vender a outra pessoa, o que não valia a pena o trabalho ou o risco. Por cada pacote completo, lucrava dois cêntimos. Podia sentir esses cêntimos, pesados e sólidos, na palma da sua mão. Tornaram-se os primeiros flocos da bola de neve de dinheiro que estava para vir.
A única coisa que Warren estava disposto a dividir em unidades eram as caixas vermelhas de Coca-Cola, que vendia de porta em porta nas noites de Verão. Continuou a vendê-las durante as férias da família, abordando os banhistas nas margens do Lago Okoboji, no Estado do Iowa. Os refrigerantes davam mais lucro do que as pastilhas elásticas: ganhava cinco cêntimos por cada seis garrafas, e guardava orgulhosamente as moedas na caixa de trocos metalizada que usava no cinto, ao melhor estilo de um vendedor de estádio. Também a usava quando ia de porta em porta vender exemplares das revistas Saturday Evening.
Fascínio pelo negócio
Sentia-se um profissional com a caixa de trocos. Simbolizava o que Warren mais gostava nas vendas: coleccionar. Embora coleccionasse caricas, moedas e selos, o que coleccionava mesmo era dinheiro. Guardava as moedas em casa, numa gaveta, juntando-as aos 20 dólares que o pai lhe dera quando fez seis anos, tudo registado numa pequena caderneta castanha - a sua primeira conta bancária.
Quando tinha nove ou dez anos, ele e Stu Erickson chegaram a vender bolasde golfe usadas no campo de golfe de Elmwood Park - até alguém os denunciar e serem expulsos pela polícia. Os agentes falaram com os pais de Warren, mas Howard e Leila não ficaram preocupados. Apenas consideraram o filho ambicioso.
Sendo o único - e precoce - filho varão dos Buffett, Warren possuía, de acordo com as suas irmãs, uma espécie de auréola e, na maior parte das vezes, conseguia o que queria. Aos dez anos, arranjou um emprego a vender amendoins e pipocas nos jogos de futebol americano da Universidade de Omaha.
Atravessava as bancadas gritando "Amendoins, pipocas, cinco cêntimos, um níquel, meio dime, compre aqui os seus amendoins e as suas pipocas!" A campanha presidencial de 1940 já tinha começado e ele juntara dúzias de crachás de Wilkie-McNary, que usava na camisa. O seu favorito dizia: "Washington não o faria, Cleveland não podia, Roosevelt não devia", uma alusão à decisão - ultrajante para os Buffett - de Franklin Delano Roosevelt (FDR) concorrer a um terceiro mandato. Mesmo tendo em conta que, nessa altura, os EUA não limitavam constitucionalmente os mandatos presidenciais, o país tinha - até então - recusado a ideia de um "Presidente imperial". Howard considerava FDR um déspota que utilizara a demagogia para se tornar popular. A ideia de mais quatro anos de FDR deixava-o indisposto.
Embora considerasse Wendell Wilkie demasiado liberal para o seu gosto, Howard achava que qualquer um servia para se ver livre de Roosevelt. Warren, que seguia a visão politica do pai, gostava de exibir os crachás Wilkie-McNary no estádio. Até que o seu chefe o chamou ao escritório e lhe disse: "Tira isso. Os apoiantes de Roosevelt vão reagir mal". Warren colocou os crachás no bolso do avental, onde algumas das moedas ficaram presas na parte de trás dos mesmos. Ao prestar contas depois do jogo, o chefe mandou-o esvaziar o bolso, crachás incluídos. Tirou-os do balcão e levou-os.
"Foi a minha introdução ao manual de negócios para principiantes. Fiquei muito triste", recorda Buffett. E quando Roosevelt conquistou o inédito terceiro mandato, os Buffett ficaram ainda mais tristes.
Influência familiar
Se para Howard a política era o principal interesse e o dinheiro apenas secundário, o seu filho pensava exactamente o oposto. Sempre que podia, Warren ia até ao escritório do pai no velho edifício do Omaha National Bank, onde lia a coluna "O Comerciante" da revista Barron's e os livros na estante do pai. Também ia até à sala de clientes da Harris Upham & Co. Nesta empresa regional de corretagem, dois lanços de escadas abaixo do escritório de Howard, Warren sentia-se importante quando o deixavam "marcar o quadro", escrevendo a giz os preços das acções nas lentas manhãs de sábado na altura da Depressão. O mercado ainda negociava ao fim-de-semana em sessões de duas horas. Homens corpulentos, sem nada melhor para fazer, enchiam o semicírculo de cadeiras da sala de clientes, observando com indiferença os números a passar no Trans-Lux, uma tela electrónica com os preços das acções mais importantes. Ocasionalmente, alguém saltava e arrancava uma mão-cheia de fita da máquina de cliques preguiçosos. Warren chegava com o seu tio-avô paterno, Frank Buffett - o misantropo da família que ficara de coração partido ao perder Henrietta, há muito falecida, para o seu irmão Ernest - e com o tio-avô materno John Barber.5 Qualquer um deles escravo do velho hábito de pensar num único sentido.
"O tio Frank era um urso em relação ao mundo e o tio John um touro. Sentava\u2011me no meio dos dois que competiam pela minha atenção, tentando convencer-me de que tinham razão. Não gostavam um do outro, por isso não falavam entre eles, falavam só comigo. Para o meu tio-avô Frank, o mundo inteiro estava a caminho da bancarrota.
E quando alguém ia até ao balcão por detrás das cadeiras e dizia 'quero comprar cem acções da U.S. Steel a vinte e três', o tio Frank explodia sempre e dizia 'U.S STEEL? HÁ-DE CHEGAR A ZERO!'" Aquilo não era bom para os negócios.
"Não o podiam expulsar, mas odiavam-no. Não era um escritório de pessimistas". Aconchegado entre os dois tios-avôs, Warren fixava os números, que lhe pareciam desfocados.
A dificuldade em ler o Trans-Lux levou a família a descobrir a sua miopia. Após experimentar os óculos, Warren reparou que os números pareciam mudar de acordo com uma espécie de lei imutável própria. Embora os tios-avôs estivessem ambos desejosos de o cativar para os seus respectivos - e extremistas - pontos de vista, Warren reparou que as suas opiniões pareciam não ter qualquer tipo de ligação com os números que passavam no Trans-Lux. Estava determinado a descobrir o padrão, nessa altura ainda não sabia como fazer.
"O meu tio Frank e o meu tio John competiam para me levar a almoçar, porque isso significava uma vitória sobre o outro. Com o tio Frank, íamos até ao velho Hotel Paxton, onde comprávamos comida do dia anterior por 25 cêntimos."
A Nova Iorque dos anos 40
Warren, que gostava de conviver com adultos, sentia-se radiante por ver os tios rivalizarem pela sua atenção. Na verdade, apreciava ser o centro das atenções. Desejava a atenção dos familiares e dos amigos dos pais, mas especialmente do pai. Howard ofereceu a cada um dos seus filhos uma viagem à Costa Leste pelo seu décimo aniversário, um acontecimento importante nas suas vidas. Warren sabia exactamente o que queria fazer: "Disse ao meu pai que queria ver três coisas. Queria ver a Scott Stamp and Coin Company. Queria ver a Lionel Train Company. Queria ver a Bolsa de Valores de Nova de Iorque. A Scott Stamp and Coin ficava na Rua 47, a Lionel era mais abaixo, aí para a Rua 27, e a Bolsa ficava mesmo no centro de Nova Iorque."
Em 1940, Wall Street começara a recuperar do crash, embora ainda mantivesse um ambiente de restabelecimento depois da queda. Os homens de Wall Street pareciam bandos de mercenários audazes que continuavam a lutar depois da maioria do seus camaradas terem sido abatidos na guerra. O seu modo de vida parecia vagamente ofensivo perante as memórias ainda frescas do crash de 1929.
Mesmo que não se vangloriassem publicamente, a vida corria muito bem a alguns destes mercenários. Howard Buffett levou o filho à zona sul de Manhattan, onde tinha um encontro com o responsável máximo de uma das maiores empresas de corretagem. O pequeno Warren Buffett espreitou pela primeira vez para dentro das portas douradas de Wall Street.
"Foi aí que conheci Sidney Weinberg, o homem mais famoso de Wall Street. O meu pai também não o conhecia, era apenas o proprietário de uma pequena empresa de Omaha. Mas o senhor Weinberg convidou-nos a entrar, talvez porque estava ali um miúdo pequeno. Falámos durante cerca de 30 minutos."
Como sócio maioritário do banco de investimentos Goldman Sachs, Weinberg passara uma década a recuperar cuidadosamente a reputação da instituição após ter caído em desgraça por iludir os investidores com um famoso esquema de pirâmide no crash da bolsa de 1929. Warren nada sabia sobre isso, nem sequer que Weinberg era filho de imigrantes e que começara como assistente de porteiro no Goldman, esvaziando escarradeiras e puxando o lustro aos chapéus de seda dos sócios. Mas percebeu logo que estava na presença de uma pessoa importante assim que entrou no escritório de painéis de nogueira de Sidney Weinberg, com as suas paredes forradas com originais de cartas, documentos e retratos de Abraham Lincoln. E o que Weinberg fez no fim da visita deixou-o francamente impressionado.
Um marco na vida
"Quando estava a sair, pôs um braço à minha volta e perguntou: 'Quais são as acções de que tu gostas, Warren?'Ele esqueceu-se logo no dia seguinte, mas eu vou recordá-lo para sempre."
Buffett nunca esqueceria que Weinberg, uma pessoa importante de Wall Street, lhe dera tanta atenção e parecia importar-se com a sua opinião.
Do Goldman Sachs, Howard levou Warren à Broad Street e, passando por um enorme conjunto de colunas coríntias, até à Bolsa de Valores de Nova Iorque. Aqui, no templo do dinheiro, homens com casacos de cores claras gritavam e "escrevinhavam" de pé em postos de negociação, enquanto estafetas corriam de um lado para o outro, espalhando pedaços de papel pelo chão. No entanto, seria uma cena no restaurante da Bolsa de Valores que cativaria a imaginação de Warren."Almoçámos na Bolsa com um sujeito chamado At Mol, um holandês, membro da Bolsa de Valores e homem de aspecto impressionante. Depois do almoço, apareceu um sujeito com um tabuleiro repleto com as mais diversas qualidades de folhas de tabaco.
Enrolou um charuto para o senhor Mol com as folhas que este tinha escolhido. E pensei: É isto mesmo. Melhor é impossível. Um charuto feito à medida." Um charuto feito à medida. As visões que aquele charuto trouxe à mente matemática de Warren! Ele não tinha qualquer interesse em fumar charuto. Só que, raciocinando, imaginou o que significava contratar um homem para um objectivo tão frívolo. A despesa só se justificava se, enquanto a maior parte do país ainda estava atolada na Depressão, o patrão do homem dos charutos estivesse a ganhar muito dinheiro. Entendeu logo. Da Bolsa de Valores devia jorrar dinheiro: rios, fontes, cascatas, torrentes de dinheiro suficientes para contratar um homem pela pura ostentação de enrolar charutos - feitos à mão e à medida - para satisfazer o prazer pessoal dos membros da Bolsa de Valores.
Naquele dia, enquanto contemplava o homem dos charutos, uma visão do seu futuro ficou registada na sua mente. Manteve aquela visão depois do regresso a Omaha, já com idade suficiente para organizar a sua busca e persegui-la de forma mais sistemática.
Com a devida venia ao jornal aqui se transcreve esse texto - o livro ainda não saiu mas..., por razões varias (mais ludicas do que de formação), parece-me de leitura obrigatória.
Para conseguir escrever o livro "Efeito bola de neve - a biografia de Warren Buffett, o homem mais rico do mundo", Alice Schroeder teve um acesso pouco comum ao empresário e ao seu círculo de negócios. O resultado
é uma obra onde se descobre a pessoa e os caminhos que o levaram até
ao cume de uma das maiores fortunas do planeta
Warren Buffett ganhou os seus primeiros cêntimos a vender pacotes de pastilhas elásticas. E desde o dia em que começou - aos seis anos - mostrou sempre uma atitude inflexível para com os seus clientes, o que revelava muito sobre o seu estilo no futuro.
"Eu tinha um pequeno tabuleiro verde, dividido em cinco áreas. Tenho quase a certeza de que me foi oferecido pela minha tia Edie. Tinha compartimentos para cinco tipos diferentes de pastilha, Juicy Fruit, Spearmint, Doublemint e por aí fora. Comprava pacotes de pastilhas ao meu avô e ia vendê-los de porta em porta pela vizinhança. Fazia isso quase sempre à noite.
Lembro-me de uma mulher chamada Virginia Macoubrie dizer: 'Fico com uma pastilha Juicy Fruit.' E de eu lhe responder: 'Não abrimos pacotes de pastilhas' - ou seja, tenho os meus princípios. Ainda me lembro, como se fosse hoje, da senhora Macoubrie a dizer que só queria uma pastilha. Não, só vendia pacotes de cinco pastilhas. Custavam cinco cêntimos e ela só queria gastar um cêntimo comigo."
Conseguir vender era tentador mas não era o suficiente para o fazer mudar de ideias. Se vendesse uma pastilha a Virginia Macoubrie, ficava com outras quatro para vender a outra pessoa, o que não valia a pena o trabalho ou o risco. Por cada pacote completo, lucrava dois cêntimos. Podia sentir esses cêntimos, pesados e sólidos, na palma da sua mão. Tornaram-se os primeiros flocos da bola de neve de dinheiro que estava para vir.
A única coisa que Warren estava disposto a dividir em unidades eram as caixas vermelhas de Coca-Cola, que vendia de porta em porta nas noites de Verão. Continuou a vendê-las durante as férias da família, abordando os banhistas nas margens do Lago Okoboji, no Estado do Iowa. Os refrigerantes davam mais lucro do que as pastilhas elásticas: ganhava cinco cêntimos por cada seis garrafas, e guardava orgulhosamente as moedas na caixa de trocos metalizada que usava no cinto, ao melhor estilo de um vendedor de estádio. Também a usava quando ia de porta em porta vender exemplares das revistas Saturday Evening.
Fascínio pelo negócio
Sentia-se um profissional com a caixa de trocos. Simbolizava o que Warren mais gostava nas vendas: coleccionar. Embora coleccionasse caricas, moedas e selos, o que coleccionava mesmo era dinheiro. Guardava as moedas em casa, numa gaveta, juntando-as aos 20 dólares que o pai lhe dera quando fez seis anos, tudo registado numa pequena caderneta castanha - a sua primeira conta bancária.
Quando tinha nove ou dez anos, ele e Stu Erickson chegaram a vender bolasde golfe usadas no campo de golfe de Elmwood Park - até alguém os denunciar e serem expulsos pela polícia. Os agentes falaram com os pais de Warren, mas Howard e Leila não ficaram preocupados. Apenas consideraram o filho ambicioso.
Sendo o único - e precoce - filho varão dos Buffett, Warren possuía, de acordo com as suas irmãs, uma espécie de auréola e, na maior parte das vezes, conseguia o que queria. Aos dez anos, arranjou um emprego a vender amendoins e pipocas nos jogos de futebol americano da Universidade de Omaha.
Atravessava as bancadas gritando "Amendoins, pipocas, cinco cêntimos, um níquel, meio dime, compre aqui os seus amendoins e as suas pipocas!" A campanha presidencial de 1940 já tinha começado e ele juntara dúzias de crachás de Wilkie-McNary, que usava na camisa. O seu favorito dizia: "Washington não o faria, Cleveland não podia, Roosevelt não devia", uma alusão à decisão - ultrajante para os Buffett - de Franklin Delano Roosevelt (FDR) concorrer a um terceiro mandato. Mesmo tendo em conta que, nessa altura, os EUA não limitavam constitucionalmente os mandatos presidenciais, o país tinha - até então - recusado a ideia de um "Presidente imperial". Howard considerava FDR um déspota que utilizara a demagogia para se tornar popular. A ideia de mais quatro anos de FDR deixava-o indisposto.
Embora considerasse Wendell Wilkie demasiado liberal para o seu gosto, Howard achava que qualquer um servia para se ver livre de Roosevelt. Warren, que seguia a visão politica do pai, gostava de exibir os crachás Wilkie-McNary no estádio. Até que o seu chefe o chamou ao escritório e lhe disse: "Tira isso. Os apoiantes de Roosevelt vão reagir mal". Warren colocou os crachás no bolso do avental, onde algumas das moedas ficaram presas na parte de trás dos mesmos. Ao prestar contas depois do jogo, o chefe mandou-o esvaziar o bolso, crachás incluídos. Tirou-os do balcão e levou-os.
"Foi a minha introdução ao manual de negócios para principiantes. Fiquei muito triste", recorda Buffett. E quando Roosevelt conquistou o inédito terceiro mandato, os Buffett ficaram ainda mais tristes.
Influência familiar
Se para Howard a política era o principal interesse e o dinheiro apenas secundário, o seu filho pensava exactamente o oposto. Sempre que podia, Warren ia até ao escritório do pai no velho edifício do Omaha National Bank, onde lia a coluna "O Comerciante" da revista Barron's e os livros na estante do pai. Também ia até à sala de clientes da Harris Upham & Co. Nesta empresa regional de corretagem, dois lanços de escadas abaixo do escritório de Howard, Warren sentia-se importante quando o deixavam "marcar o quadro", escrevendo a giz os preços das acções nas lentas manhãs de sábado na altura da Depressão. O mercado ainda negociava ao fim-de-semana em sessões de duas horas. Homens corpulentos, sem nada melhor para fazer, enchiam o semicírculo de cadeiras da sala de clientes, observando com indiferença os números a passar no Trans-Lux, uma tela electrónica com os preços das acções mais importantes. Ocasionalmente, alguém saltava e arrancava uma mão-cheia de fita da máquina de cliques preguiçosos. Warren chegava com o seu tio-avô paterno, Frank Buffett - o misantropo da família que ficara de coração partido ao perder Henrietta, há muito falecida, para o seu irmão Ernest - e com o tio-avô materno John Barber.5 Qualquer um deles escravo do velho hábito de pensar num único sentido.
"O tio Frank era um urso em relação ao mundo e o tio John um touro. Sentava\u2011me no meio dos dois que competiam pela minha atenção, tentando convencer-me de que tinham razão. Não gostavam um do outro, por isso não falavam entre eles, falavam só comigo. Para o meu tio-avô Frank, o mundo inteiro estava a caminho da bancarrota.
E quando alguém ia até ao balcão por detrás das cadeiras e dizia 'quero comprar cem acções da U.S. Steel a vinte e três', o tio Frank explodia sempre e dizia 'U.S STEEL? HÁ-DE CHEGAR A ZERO!'" Aquilo não era bom para os negócios.
"Não o podiam expulsar, mas odiavam-no. Não era um escritório de pessimistas". Aconchegado entre os dois tios-avôs, Warren fixava os números, que lhe pareciam desfocados.
A dificuldade em ler o Trans-Lux levou a família a descobrir a sua miopia. Após experimentar os óculos, Warren reparou que os números pareciam mudar de acordo com uma espécie de lei imutável própria. Embora os tios-avôs estivessem ambos desejosos de o cativar para os seus respectivos - e extremistas - pontos de vista, Warren reparou que as suas opiniões pareciam não ter qualquer tipo de ligação com os números que passavam no Trans-Lux. Estava determinado a descobrir o padrão, nessa altura ainda não sabia como fazer.
"O meu tio Frank e o meu tio John competiam para me levar a almoçar, porque isso significava uma vitória sobre o outro. Com o tio Frank, íamos até ao velho Hotel Paxton, onde comprávamos comida do dia anterior por 25 cêntimos."
A Nova Iorque dos anos 40
Warren, que gostava de conviver com adultos, sentia-se radiante por ver os tios rivalizarem pela sua atenção. Na verdade, apreciava ser o centro das atenções. Desejava a atenção dos familiares e dos amigos dos pais, mas especialmente do pai. Howard ofereceu a cada um dos seus filhos uma viagem à Costa Leste pelo seu décimo aniversário, um acontecimento importante nas suas vidas. Warren sabia exactamente o que queria fazer: "Disse ao meu pai que queria ver três coisas. Queria ver a Scott Stamp and Coin Company. Queria ver a Lionel Train Company. Queria ver a Bolsa de Valores de Nova de Iorque. A Scott Stamp and Coin ficava na Rua 47, a Lionel era mais abaixo, aí para a Rua 27, e a Bolsa ficava mesmo no centro de Nova Iorque."
Em 1940, Wall Street começara a recuperar do crash, embora ainda mantivesse um ambiente de restabelecimento depois da queda. Os homens de Wall Street pareciam bandos de mercenários audazes que continuavam a lutar depois da maioria do seus camaradas terem sido abatidos na guerra. O seu modo de vida parecia vagamente ofensivo perante as memórias ainda frescas do crash de 1929.
Mesmo que não se vangloriassem publicamente, a vida corria muito bem a alguns destes mercenários. Howard Buffett levou o filho à zona sul de Manhattan, onde tinha um encontro com o responsável máximo de uma das maiores empresas de corretagem. O pequeno Warren Buffett espreitou pela primeira vez para dentro das portas douradas de Wall Street.
"Foi aí que conheci Sidney Weinberg, o homem mais famoso de Wall Street. O meu pai também não o conhecia, era apenas o proprietário de uma pequena empresa de Omaha. Mas o senhor Weinberg convidou-nos a entrar, talvez porque estava ali um miúdo pequeno. Falámos durante cerca de 30 minutos."
Como sócio maioritário do banco de investimentos Goldman Sachs, Weinberg passara uma década a recuperar cuidadosamente a reputação da instituição após ter caído em desgraça por iludir os investidores com um famoso esquema de pirâmide no crash da bolsa de 1929. Warren nada sabia sobre isso, nem sequer que Weinberg era filho de imigrantes e que começara como assistente de porteiro no Goldman, esvaziando escarradeiras e puxando o lustro aos chapéus de seda dos sócios. Mas percebeu logo que estava na presença de uma pessoa importante assim que entrou no escritório de painéis de nogueira de Sidney Weinberg, com as suas paredes forradas com originais de cartas, documentos e retratos de Abraham Lincoln. E o que Weinberg fez no fim da visita deixou-o francamente impressionado.
Um marco na vida
"Quando estava a sair, pôs um braço à minha volta e perguntou: 'Quais são as acções de que tu gostas, Warren?'Ele esqueceu-se logo no dia seguinte, mas eu vou recordá-lo para sempre."
Buffett nunca esqueceria que Weinberg, uma pessoa importante de Wall Street, lhe dera tanta atenção e parecia importar-se com a sua opinião.
Do Goldman Sachs, Howard levou Warren à Broad Street e, passando por um enorme conjunto de colunas coríntias, até à Bolsa de Valores de Nova Iorque. Aqui, no templo do dinheiro, homens com casacos de cores claras gritavam e "escrevinhavam" de pé em postos de negociação, enquanto estafetas corriam de um lado para o outro, espalhando pedaços de papel pelo chão. No entanto, seria uma cena no restaurante da Bolsa de Valores que cativaria a imaginação de Warren."Almoçámos na Bolsa com um sujeito chamado At Mol, um holandês, membro da Bolsa de Valores e homem de aspecto impressionante. Depois do almoço, apareceu um sujeito com um tabuleiro repleto com as mais diversas qualidades de folhas de tabaco.
Enrolou um charuto para o senhor Mol com as folhas que este tinha escolhido. E pensei: É isto mesmo. Melhor é impossível. Um charuto feito à medida." Um charuto feito à medida. As visões que aquele charuto trouxe à mente matemática de Warren! Ele não tinha qualquer interesse em fumar charuto. Só que, raciocinando, imaginou o que significava contratar um homem para um objectivo tão frívolo. A despesa só se justificava se, enquanto a maior parte do país ainda estava atolada na Depressão, o patrão do homem dos charutos estivesse a ganhar muito dinheiro. Entendeu logo. Da Bolsa de Valores devia jorrar dinheiro: rios, fontes, cascatas, torrentes de dinheiro suficientes para contratar um homem pela pura ostentação de enrolar charutos - feitos à mão e à medida - para satisfazer o prazer pessoal dos membros da Bolsa de Valores.
Naquele dia, enquanto contemplava o homem dos charutos, uma visão do seu futuro ficou registada na sua mente. Manteve aquela visão depois do regresso a Omaha, já com idade suficiente para organizar a sua busca e persegui-la de forma mais sistemática.
"Os padrões gráficos relevantes são como o surf. Não é preciso saber muito sobre física das marés, ressonância e dinâmica de fluidos; há apenas que ver o que se está a passar". Ed Seykota.
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