Nacionalização da banca portuguesa? Não obrigado!
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Nacionalização da banca portuguesa? Não obrigado!
Jornal de Negócios Online
Nacionalização da banca portuguesa? Não obrigado!
negocios@negocios.pt
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Assistimos a uma vaga de fundo proveniente dos EUA que advoga a necessidade da nacionalização dos bancos para fazer face ao descalabro do sistema bancário norte-americano e às suas ramificações globais.
Assistimos a uma vaga de fundo proveniente dos EUA que advoga a necessidade da nacionalização dos bancos para fazer face ao descalabro do sistema bancário norte-americano e às suas ramificações globais.
Esta onda chegou à Europa e naturalmente a Portugal. Muitos dos que assim pensam sempre preferiram um Estado "pesado e activo", a um Estado estratégico, outros porque assustados com a situação, e não encontrando saída, não vislumbram alternativas. Pensamos que devemos evitar a nacionalização dos bancos pelas razões erradas, ainda que possamos encontrar justificações e apoiar nacionalizações para protecção do funcionamento do sistema ou, tendo em vista o arranque da economia.
Tentemos um exercício que tenha em conta as análises feitas à crise de 1929, ao papel da banca no funcionamento economia, à iniciativa privada na banca e aos termos de comparação entre EUA e Portugal. Comecemos por este último, sem cair no erro das "comparações selectivas", isto é, equiparando a crise bancária americana à portuguesa escamoteando alguns factos importantes: o sistema financeiro americano, onde tudo nasceu, foi o grande responsável pela crise e pela depressão com que todo o Mundo se debate; os EUA representam mais de 20% do PIB mundial e nós não ultrapassamos os 0,4%; esquecemos (?) a desproporção entre os EUA e Portugal no que se refere à recolha das poupanças mundiais e à distribuição de capital no Mundo. O colapso do sistema bancário e financeiro americano está a ser uma tragédia para a formação do rendimento mundial.
Usar o argumento de que se o país da iniciativa privada pode vir a ter que nacionalizar os bancos, porque não fazê-lo em Portugal, no quadro do conhecimento que actualmente se tem da situação bancária portuguesa, é um argumento absurdo.
A discussão que ocorreu em 1929 e durante a depressão mundial dos anos seguintes (que também essa teve início nos EUA), sobre os sinais e efeitos da crise, centrava-se em alguns temas: contracção da bolsa; redução abrupta do crédito; poupança bancária transferida para entesouramento em ouro; instabilidade e derrocada de algumas moedas nacionais; cessação de pagamentos de bancos e de alguns Estados; retirada maciça de depósitos; liquidação precipitada de activos; reduções maciças das taxas de desconto; vagas sucessivas de falências bancárias. Nesse tempo, também se discutia a política de crédito aventureira que provocou, precisamente, a falência do sistema bancário! Se compararmos os EUA desse tempo com a realidade actual, as similitudes são pois enormes. Mas, felizmente hoje podemos contar, à partida, com uma enorme experiência no combate aos mais diferentes tipos de crise; com o progresso da tecnologia; com o correspondente aumento da produtividade na economia, que tornou o Mundo globalmente mais rico.
Sendo estas as questões que se colocavam, que tipo de remédios foram encarados? A manipulação das taxas de desconto, as vantagens e desvantagens do proteccionismo de base nacional, o controlo dos câmbios e da fuga de capitais, a aceitação de elevados défices orçamentais e a tributação das grandes fortunas. A verdade é que, em geral, as políticas deflacionistas fracassaram, pelo número de desempregados que geraram. Os gestores e empresários, à época, também foram acusados de plutocratas sem consciência. A História tende a repetir-se ou pelo menos a assumir semelhanças preocupantes. Nos EUA, até 10 de Março de 1933 tinham falido mais de 10.700 bancos, e com o Banking Act foi então realizada a reorganização do sistema bancário privado e, ironicamente, introduziu-se a separação dos bancos de investimento dos bancos de depósitos.
Num contexto em que o bilateralismo imperava e todos se queriam salvar a qualquer preço, a grande novidade parece ter sido o aparecimento em força da macroeconomia keynesiana que conseguiu o milagre de meter a realidade na teoria, afrontando o establishment e toda a ortodoxia que, aliás, o atacou violentamente. Contudo, do seu ponto de vista, poucas circunstâncias implicavam o alargamento do sector público; Keynes acreditava sobretudo na acção estratégica do Estado e demonstrou a necessidade de políticas públicas de relançamento. Por outro lado compreendeu que a essência do sistema residia na confiança de todos em todos - o multilateralismo que ainda hoje vigora - e que esse era o pilar destroçado pela crise. As cartas que trocou com o Presidente Roosevelt mostram a força e a importância das suas ideias.
Por isso toda a política se centrou no restabelecimento da confiança dos circuitos normais de crédito e na atribuição de um novo alento à iniciativa privada. Em todo o caso, o estatuto de iniciativa e de propriedade privada ficou, praticamente, intacto. Percebe-se assim que qualquer macroeconomista exija hoje, se for caso disso, a nacionalização de toda a banca nos EUA, porque reconhece a necessidade de obrigar o motor a arrancar de novo, com algumas novas regras no que respeita à regulação e à supervisão, por forma a evitar os excessos que os actuais reguladores se viram impotentes para fazer frente.
Se a crise é global é altura de entrarem em acção as grandes instituições globais. O Estado estratégico poderá proporcionar as condições para que os mercados retomem a actividade e será um bom veículo para apoiar o sector privado na aplicação dos remédios que surjam, a partir dessas instituições, depois de convenientemente adequadas às exigências contemporâneas. Será já em Londres na Cimeira de Abril que se vai começar a trabalhar neste cenário? É que a crise financeira que já está a entrar violentamente pela economia pode, de um momento para o outro, transformar-se numa grande crise social: o desemprego, à escala dos milhões, não pára de subir; do descontentamento à revolta vai um pequeno passo. Já tivemos alguns exemplos premonitórios.
Só neste contexto se podem compreender as palavras de Alan Greenspan. Mas à cautela devemos desconfiar da sedução que subitamente se apoderou de alguns sectores no sentido da nacionalização generalizada da banca, sem separar o trigo do joio, confundindo os meios com os fins.
Os remédios da solução americana não devem ser utilizados em Portugal, sem uma significativa adaptação: há coisas que não se podem comparar. Seriam um erro e, para nós, um claríssimo retrocesso. Outra coisa será responsabilizar quem actuou fraudulentamente ou, por incompetência, assumiu riscos excessivos e se deixou cair em situações insustentáveis. Mas seria tremendamente injusto pôr cidadãos/contribuintes a pagar por erros que não cometeram. Neste caso a nacionalização dos bancos seria uma forma de premiar a arrogância, de desresponsabilizar os prevaricadores, de quem abusivamente se aproveitou das vulnerabilidades do mercado e penalizar aqueles que confiadamente lhes entregaram os seus activos ou recorreram aos seus serviços.
Por
Jorge Marrão, Partner da Deloitte
E J.M. brandão de Brito, Professor do ISEG/UTL
Nacionalização da banca portuguesa? Não obrigado!
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Assistimos a uma vaga de fundo proveniente dos EUA que advoga a necessidade da nacionalização dos bancos para fazer face ao descalabro do sistema bancário norte-americano e às suas ramificações globais.
Assistimos a uma vaga de fundo proveniente dos EUA que advoga a necessidade da nacionalização dos bancos para fazer face ao descalabro do sistema bancário norte-americano e às suas ramificações globais.
Esta onda chegou à Europa e naturalmente a Portugal. Muitos dos que assim pensam sempre preferiram um Estado "pesado e activo", a um Estado estratégico, outros porque assustados com a situação, e não encontrando saída, não vislumbram alternativas. Pensamos que devemos evitar a nacionalização dos bancos pelas razões erradas, ainda que possamos encontrar justificações e apoiar nacionalizações para protecção do funcionamento do sistema ou, tendo em vista o arranque da economia.
Tentemos um exercício que tenha em conta as análises feitas à crise de 1929, ao papel da banca no funcionamento economia, à iniciativa privada na banca e aos termos de comparação entre EUA e Portugal. Comecemos por este último, sem cair no erro das "comparações selectivas", isto é, equiparando a crise bancária americana à portuguesa escamoteando alguns factos importantes: o sistema financeiro americano, onde tudo nasceu, foi o grande responsável pela crise e pela depressão com que todo o Mundo se debate; os EUA representam mais de 20% do PIB mundial e nós não ultrapassamos os 0,4%; esquecemos (?) a desproporção entre os EUA e Portugal no que se refere à recolha das poupanças mundiais e à distribuição de capital no Mundo. O colapso do sistema bancário e financeiro americano está a ser uma tragédia para a formação do rendimento mundial.
Usar o argumento de que se o país da iniciativa privada pode vir a ter que nacionalizar os bancos, porque não fazê-lo em Portugal, no quadro do conhecimento que actualmente se tem da situação bancária portuguesa, é um argumento absurdo.
A discussão que ocorreu em 1929 e durante a depressão mundial dos anos seguintes (que também essa teve início nos EUA), sobre os sinais e efeitos da crise, centrava-se em alguns temas: contracção da bolsa; redução abrupta do crédito; poupança bancária transferida para entesouramento em ouro; instabilidade e derrocada de algumas moedas nacionais; cessação de pagamentos de bancos e de alguns Estados; retirada maciça de depósitos; liquidação precipitada de activos; reduções maciças das taxas de desconto; vagas sucessivas de falências bancárias. Nesse tempo, também se discutia a política de crédito aventureira que provocou, precisamente, a falência do sistema bancário! Se compararmos os EUA desse tempo com a realidade actual, as similitudes são pois enormes. Mas, felizmente hoje podemos contar, à partida, com uma enorme experiência no combate aos mais diferentes tipos de crise; com o progresso da tecnologia; com o correspondente aumento da produtividade na economia, que tornou o Mundo globalmente mais rico.
Sendo estas as questões que se colocavam, que tipo de remédios foram encarados? A manipulação das taxas de desconto, as vantagens e desvantagens do proteccionismo de base nacional, o controlo dos câmbios e da fuga de capitais, a aceitação de elevados défices orçamentais e a tributação das grandes fortunas. A verdade é que, em geral, as políticas deflacionistas fracassaram, pelo número de desempregados que geraram. Os gestores e empresários, à época, também foram acusados de plutocratas sem consciência. A História tende a repetir-se ou pelo menos a assumir semelhanças preocupantes. Nos EUA, até 10 de Março de 1933 tinham falido mais de 10.700 bancos, e com o Banking Act foi então realizada a reorganização do sistema bancário privado e, ironicamente, introduziu-se a separação dos bancos de investimento dos bancos de depósitos.
Num contexto em que o bilateralismo imperava e todos se queriam salvar a qualquer preço, a grande novidade parece ter sido o aparecimento em força da macroeconomia keynesiana que conseguiu o milagre de meter a realidade na teoria, afrontando o establishment e toda a ortodoxia que, aliás, o atacou violentamente. Contudo, do seu ponto de vista, poucas circunstâncias implicavam o alargamento do sector público; Keynes acreditava sobretudo na acção estratégica do Estado e demonstrou a necessidade de políticas públicas de relançamento. Por outro lado compreendeu que a essência do sistema residia na confiança de todos em todos - o multilateralismo que ainda hoje vigora - e que esse era o pilar destroçado pela crise. As cartas que trocou com o Presidente Roosevelt mostram a força e a importância das suas ideias.
Por isso toda a política se centrou no restabelecimento da confiança dos circuitos normais de crédito e na atribuição de um novo alento à iniciativa privada. Em todo o caso, o estatuto de iniciativa e de propriedade privada ficou, praticamente, intacto. Percebe-se assim que qualquer macroeconomista exija hoje, se for caso disso, a nacionalização de toda a banca nos EUA, porque reconhece a necessidade de obrigar o motor a arrancar de novo, com algumas novas regras no que respeita à regulação e à supervisão, por forma a evitar os excessos que os actuais reguladores se viram impotentes para fazer frente.
Se a crise é global é altura de entrarem em acção as grandes instituições globais. O Estado estratégico poderá proporcionar as condições para que os mercados retomem a actividade e será um bom veículo para apoiar o sector privado na aplicação dos remédios que surjam, a partir dessas instituições, depois de convenientemente adequadas às exigências contemporâneas. Será já em Londres na Cimeira de Abril que se vai começar a trabalhar neste cenário? É que a crise financeira que já está a entrar violentamente pela economia pode, de um momento para o outro, transformar-se numa grande crise social: o desemprego, à escala dos milhões, não pára de subir; do descontentamento à revolta vai um pequeno passo. Já tivemos alguns exemplos premonitórios.
Só neste contexto se podem compreender as palavras de Alan Greenspan. Mas à cautela devemos desconfiar da sedução que subitamente se apoderou de alguns sectores no sentido da nacionalização generalizada da banca, sem separar o trigo do joio, confundindo os meios com os fins.
Os remédios da solução americana não devem ser utilizados em Portugal, sem uma significativa adaptação: há coisas que não se podem comparar. Seriam um erro e, para nós, um claríssimo retrocesso. Outra coisa será responsabilizar quem actuou fraudulentamente ou, por incompetência, assumiu riscos excessivos e se deixou cair em situações insustentáveis. Mas seria tremendamente injusto pôr cidadãos/contribuintes a pagar por erros que não cometeram. Neste caso a nacionalização dos bancos seria uma forma de premiar a arrogância, de desresponsabilizar os prevaricadores, de quem abusivamente se aproveitou das vulnerabilidades do mercado e penalizar aqueles que confiadamente lhes entregaram os seus activos ou recorreram aos seus serviços.
Por
Jorge Marrão, Partner da Deloitte
E J.M. brandão de Brito, Professor do ISEG/UTL
Na bolsa só se perde dinheiro.Na realidade só certos Iluminados com acesso a informação privilegiada aproveitam-se dos pequenos investidores para lhes sugarem o dinheiro.
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