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Caldeirão da Bolsa

Vamos todos pagar

Espaço dedicado a todo o tipo de troca de impressões sobre os mercados financeiros e ao que possa condicionar o desempenho dos mesmos.

Vamos todos pagar

por luiz22 » 21/9/2008 19:18

Publicação: 19-09-2008 11:54
actualização: 19-09-2008 14:51

Vamos todos pagar

Na hora da verdade, os contribuintes americanos e praticamente todos os agentes económicos do mundo são chamados a pagar pelos erros de alguns gestores de Wall Street. Estavam em causa as reformas e as poupanças de demasiadas pessoas. O Estado vai assumir as dívidas. O mesmo Estado que para os teóricos do neo-liberalismo deve privatizar quase tudo e regular quase nada. A conclusão aí está, a pesar nos bolsos de milhões de pessoas.

José Gomes Ferreira
Director Executivo Multimédia-Online
opiniao@sic.pt


A Reserva Federal norte-americana foi obrigada (sim, obrigada) a comprar o AIG – American International Group. Se o não fizesse, ficavam em risco as poupanças e as reformas de muitos americanos. A contestação social seria inevitável. O risco para todo o sistema financeiro seria enorme.

Vários bancos americanos de dimensão mundial foram comprados por outros bancos que viram nisso uma oportunidade de crescer a preço de saldo. Não houve dinheiro para comprar todos e o Lehman Brothers faliu. Mas como o risco de ainda mais falências é bem real, a Administração norte-americana acaba de anunciar um mega-plano para salvar o sistema bancário da grande nação capitalista, fervorosa pregadora das virtudes do mercado sem barreiras.

Na hora da verdade, o Estado, os contribuintes americanos, são chamados a pagar pelos erros graves, gravíssimos, de um punhado de gestores. Os mesmos gestores que arrecadaram prémios de gestão milionários, durante anos a fio e voltaram a arrecadar indemnizações milionárias na hora da saída (os que saíram a tempo porque sabiam da iminência da catástrofe).

O mega-plano de salvação da banca americana passa pela constituição de um fundo com 800 mil milhões de dólares – cinco anos de PIB de Portugal, dos quais metade será para injectar imediatamente nas seguradoras e bancos aflitos.

Na hora da verdade para o contribuinte americano e para o mundo em geral, que também pagará a factura, não podemos deixar de perguntar:

- Que credibilidade tem um sistema financeiro capaz de se auto-destruir desta maneira?

- Que credibilidade têm os políticos que o teorizaram e o legislaram, desmantelando sucessivamente todos os mecanismos de controlo e deixando-o em roda-livre?

A constatação de que só com este sistema foram asseguradas décadas de crescimento económico americano e mundial é uma evidência histórica. A constatação de que este sistema só tem longa vida assegurada se o primado do controlo superior, da política responsável, estiver assegurado, é agora uma evidência que vai ser paga do bolso de milhões de pessoas afectadas.

A discussão teórica tem aplicação prática, nacional.

Apesar da tentação dos gestores de fazerem muito produto bancário com os olhos postos nos prémios da gestão por objectivos, o sistema bancário e de supervisão português (europeu) soube evitar a loucura do sub-prime.

O mesmo sistema não evitou o recurso a compra de capital próprio por interpostas sociedades off-shore em duvidosos aumentos de capital, mas os danos parecem controlados.

E a orientação política, apesar dos recorrentes apetites vorazes, soube evitar a privatização da Caixa Geral de Depósitos. Como bem lembra o Secretário de Estado do Tesouro, Costa Pina, ainda bem que é do Estado.

Na hora da verdade, os teóricos da privatização integral e do desmantelamento das regulações aplicam o seu próprio dinheiro em produtos directa ou indirectamente geridos pelo Estado, como bem mostrou um estudo sobre aplicações financeiras dos deputados e titulares de cargos políticos de todos os quadrantes, incluindo os mais liberais.

Aqui chegados convém lembrar que há bem pouco tempo, quando se discutiu a reforma da Segurança Social em Portugal, muitos políticos e empresários propuseram a sua privatização completa.

Mais, foi sugerido que o Estado devia contrair dívida pública no valor das responsabilidades das próximas décadas, mais de 100 mil milhões de euros, para financiar a passagem de todo o sistema para a gestão privada.

Foi proposta a passagem do sub-sistema de protecção na doença, as baixas médicas, para as mãos das seguradoras.

Os autores das propostas aí continuam, no topo de grandes grupos privados e em cargos públicos de relevo.

Pergunto-me, se aprenderam alguma coisa com as lições do último ano, começado em Agosto passado, ou em especial dos últimos dias.

Como lembra Josef Stiglizt, que foi economista-chefe do FMI e sabe do que fala, o sistema capitalista de mercado, com instrumentos financeiros fortes e apoiado na globalização, provou ser o melhor para criar riqueza no mundo. Mas não pode dominar todo o funcionamento da sociedade e precisa de ser regulado para evitar os excessos. O mesmo que diz, por outras palavras, George Soros, o financeiro que ganhou muitos milhões a especular contra a libra esterlina.
As decisões fáceis podem fazer-nos parecer bons,mas tomar decisões difíceis e assumi-las faz-nos melhores.
 
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